A proposta orçamental para 2024 previa, antes da sua aprovação, um excedente orçamental de 0.2%. Esta proposta, o debate parlamentar que lhe esteve associado, e a campanha eleitoral que já está em curso são fonte de alguma perplexidade.
Desde logo, o excedente previsto era a combinação de um grande défice da administração central com um grande excedente da segurança social. Ou seja, era um excedente não sustentável, na medida em que se espera que o excedente da segurança social desapareça e se transforme num défice estrutural. Não é para já, é só para daqui a uns bons anos, segundo as previsões do governo e, se for assim, ainda bem. Mas então é de aproveitar o tempo para salvaguardar tanto quanto possível a segurança social e corrigir o défice da administração central – que não vai desaparecer por magia. Ora, do que vai por aí deduz-se que é melhor fazer o contrário: não parece ser grande problema agravar o défice da administração central e estamos prontos para reduzir ou eliminar o excedente da segurança social.
De facto, pelo que têm prometido, muitos esperam gastar bem mais do que o pequeno excedente de 0.2% do PIB que estava previsto, apesar de, aparentemente, aceitarem que nesta altura ter equilíbrio orçamental não é má política! Era melhor que não fosse assim e se estivesse a falar de, por exemplo, só gastar mais, ou receber menos em impostos, um valor correspondente a 0.2% do PIB. Lá se ia o excedente, mas, pelo menos, a dívida não aumentava. No entanto, pensando bem, este excedente existe? Com as incertezas inerentes à previsão da receita, da despesa e do PIB, 0,2% pode bem ser um erro estatístico. Então, na hipótese politicamente mais responsável, temos andado a discutir como se gasta um erro estatístico.
Nas eleições há sempre promessas que devem ser encaradas com muito sal, mas nestas eleições é de esperar o exagero. Desde há uns tempos, sempre que um partido se propõe aumentar a despesa, a reação de quase todos os outros, direita ou esquerda, tem sido dizer que vão aumentar mais. De forma cada vez mais específica, vão-se criando expetativas junto dos grupos de eleitores interessados. Quem não fizer promessas irrealistas perde eleitores?
Como é que o futuro governo vai gerir as promessas feitas? Uma hipótese é dilatar no tempo o seu cumprimento. Se isto não for suficiente, há alternativas. Sendo do PSD, ou de “direita”, o governo pode usar variantes do argumento da “pesada herança” – que começou a ser usado aqui pela esquerda em meados dos anos 1970. O PS, ou a “esquerda”, no governo nos últimos anos, não podem usar este argumento! Ou podem?! Entretanto, os eleitores até sabem que se entrou numa realidade alternativa, de faz-de-conta, mas ninguém vai abdicar de exigir o cumprimento das promessas que acha que lhe dizem diretamente respeito. Em alternativa, o governo pode decidir, prudentemente, não fazer nada do que prometeu. Ou, em desespero, fazer o contrário. Não seria uma novidade, tendo em conta os últimos 15 anos. Enfim, nada disto fica bem, muito menos quando se comemoram os 50 anos do 25 de abril.