Há uns vinte anos, um banqueiro português costumava dizer que uma diferença entre a banca e algumas outras atividades económicas era que a banca era um negócio de gente séria. Com isto, parecia sugerir que o Estado devia afastar-se dos bancos. Intervir não adiantava nada, seria no mínimo inútil, porque o Estado dificilmente saberia mais e faria melhor do que a gente séria e competente que predominava na atividade bancária.

A crise financeira que começou em 2008 é um daqueles episódios de dimensão histórica que não parece ser inteiramente compatível com estas ideias simpáticas. Só com gente séria, mesmo sem ou um outro nem tanto assim, pode haver crises bancárias, que normalmente têm consequências desastrosas. Se o Estado não fizer nada, muita gente fica sem as poupanças de uma vida e as empresas ficam sem dinheiro para pagar salários e a fornecedores. Se, dada a desgraça, o Estado quiser fazer alguma coisa, é bem capaz de comprometer quantias astronómicas dos contribuintes.

É por isso que a regulação dos bancos é tão importante. É provável que, com um quadro legal diferente, com uma definição mais precisa dos poderes e atribuições dos reguladores, talvez com uma cultura regulativa mais independente, tivessem sido evitadas pelo menos algumas das piores desgraças da crise financeira que começou há 15 anos.

Sem surpresa, uma das grandes linhas de resposta à crise na União Europeia foi o reforço da regulação bancária. Por causa disso, os custos dos bancos aumentaram e a sua atividade, e até a dos seus clientes, sofreu limitações. Os bancos ficaram com um negócio menos arriscado, menos inovador e menos lucrativo. Foi, em princípio, uma opção tomada para proteger as pessoas dos piores riscos da atividade bancária. Esta opção envolve um processo regulativo, não só um conjunto de decisões delimitadas no tempo.

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Nos últimos tempos, os lucros dos bancos portugueses aumentaram. Desde logo porque têm tido algum sucesso a controlar os seus custos. Mérito seu, embora por vezes isso signifique transferir os custos dos bancos para os clientes. Que o digam os reformados com alguma dificuldade em lidar só com o lado telefónico do telemóvel e que estavam a começar a ficar familiarizados com todas as vantagens do multibanco, logo antes de estes terem começado a desaparecer, e que agora são empurrados gentilmente para contas on-line.

Mas os lucros dos bancos também têm sido muito influenciados pelas decisões do BCE para combater a inflação. Por um lado, os bancos beneficiaram com o aumento das taxas de juro. Pelo menos no curto prazo, aumentou a diferença entre as taxas de juro ativas e passivas. Em sentido oposto os bancos podem ter sido prejudicados pelo efeito negativo do aumento das taxas de juros no valor das carteiras de obrigações de rendimento fixo e na atividade económica. Por agora, o efeito do aumento das taxas de juro tem prevalecido sobre os outros e deu origem aos lucros de que se tem falado, “record”, para alguns, “imorais” para outros.

Antes de qualificar a coisa, vamos ver o que acontece a seguir. É importante que os lucros sirvam para aumentar a solidez dos bancos, e não só para distribuir dividendos, ou para devolver ajudas de Estado. E é também importante que tudo isso se verifique em condições de concorrência saudável. Isto exige atenção e trabalho dos reguladores. A boa notícia sobre os lucros dos bancos é que, por agora, há menos drama nas preocupações que, dada a experiência recente, devemos ter sobre os mercados bancários.