[A propósito das eleições na Ordem dos Advogados, marcadas para os próximos dias 27, 28 e 29 de novembro, o Observador convidou os seis candidatos ao cargo de bastonário a escreverem textos de opinião, que publicamos esta semana. A cada um deles foi feito o mesmo desafio: destacar o tema/prioridade que cada um considera mais relevante no contexto atual da justiça e da advocacia.]
Em 2020, terá lugar a última das quatro atualizações das taxas contributivas previstas no Regulamento da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores, alterado em 2015: 17% em 2016; 19% em 2017; 21% em 2018; 23% em 2019; e 24% para o próximo ano.
A penúltima reunião do Conselho Geral da CPAS, a qual teve lugar no passado dia 26 de julho, presidida pelo Bastonário da Ordem dos Advogados, teve como ordem de trabalhos apreciar a proposta da Direção da CPAS para fixar o fator de correção das contribuições para o ano de 2020, o qual tem que ser proposto ao Governo pela Direção – desde que obtenha o parecer favorável do Conselho Geral da CPAS – em tempo útil de fixar as contribuições para o próximo ano. A aprovação do fator de correção tem como objetivo mitigar o efeito do aumento das mesmas em 2020, tendo por base a evolução da situação financeira da CPAS.
A Direção da CPAS propôs na referida reunião de 26 de julho ao Conselho Geral da CPAS que aprovasse um fator de correção de -8% que podia ser de -10% na condição de ser concretizada a isenção em sede de IRC para os rendimentos financeiros da CPAS.
O Conselho Geral da CPAS, com os votos do Bastonário e dos membros do Conselho Geral da Ordem dos Advogados, rejeitou, então, a proposta da Direção da CPAS para a introdução daqueles fatores de correção
alternativos. Em consequência, a reunião terminou sem a aprovação de qualquer fator de correção, tendo como resultado, se nada mais fosse feito, que as contribuições em 2020 subiriam 1% (de 23% para 24%), sem qualquer correção, o que faria com que as mesmas passassem dos atuais € 230,20 em 2019 para € 279,31 em 2020 no 5.º escalão.
Perante a posição assumida na reunião do Conselho Geral da CPAS pelo Bastonário e pelos membros do Conselho Geral da Ordem dos Advogados com assento no Conselho Geral da Caixa, seria de esperar que solicitassem, entretanto, um ou dois estudos alternativos ao da AON, a qual tinha inicialmente proposto um fator de correção para 2020 de -6%, tendo acabado por admitir ser possível um fator de correção -10% no último estudo, desde que conseguida a isenção de IRC prevista no OE.
Convém aqui não olvidar que a AON é a entidade à qual a Ordem dos Advogados contratou o seguro de responsabilidade civil profissional para 2020 por um milhão cento e noventa e cinco mil euros. Entendo, por esse motivo, que a AON, tendo concorrido no procedimento para contratação do serviço inerente ao seguro de responsabilidade civil profissional, o qual lhe foi adjudicado em 17 de outubro último, não devia ter emitido o estudo atuarial que esteve na base do fator de correção proposto pela Direção da CPAS para 2020.
Com efeito, entendo que o estudo atuarial independente que deveria ter servido de base ao fator de correção a propor pela Direção da CPAS ao Conselho Geral da CPAS e ao Governo não deveria ter sido proveniente de um fornecedor da Ordem dos Advogados de outros serviços, por tal ser suscetível de potencialmente poder levantar dúvidas sobre independência e isenção na emissão do mesmo.
Em face da reprovação do fator de correção apresentado pela Direção da CPAS na reunião de 26 de julho, a Direção da CPAS solicitou em outubro último ao Bastonário da Ordem dos Advogados, na qualidade de Presidente do Conselho Geral da Caixa, a realização de nova reunião do mesmo Conselho, com vista a discutir, votar a apreciar o fator de correção de -10%, atenta, entretanto, a aprovação da isenção de IRC para a CPAS, tendo por base o já aludido estudo da AON.
Tal reunião realizou-se no passado dia 23 de outubro, tendo sido presidida pelo Bastonário da Ordem dos Advogados, que preside ao Conselho Geral da Caixa de Previdência. Nessa reunião, fui impedido pelo Bastonário de
representar o Conselho Regional de Lisboa, a que presido, em substituição do representante indicado no início do triénio em curso para representar o Conselho Regional no Conselho Geral da Caixa de Previdência. E não fui admitido a substituir o representante do Conselho Regional de Lisboa, a que presido, com base numa interpretação do regulamento incompreensível do Bastonário, que, assim, visou impedir-me de exercer o direito de voto em nome do Conselho Regional de Lisboa e, sobretudo, que ficasse exarado na ata da reunião quaisquer declarações que ali proferisse.
Foi, assim, como beneficiário da CPAS que intervim na referida reunião do Conselho Geral da CPAS, tendo transmitido ao Bastonário e Presidente do Conselho Geral da CPAS a minha estupefação por o mesmo não ter solicitado quaisquer estudos alternativos ao da AON que permitissem adotar um fator de correção superior ao proposto pela AON, de -10%, quando tinha tido tempo para o fazer.
Ainda assim, sugeri ao Bastonário e Presidente do Conselho Geral da CPAS que solicitasse tal estudo até ao final do ano, de forma a estudar a possibilidade da aplicação de um fator de correção superior que permitisse suavizar ou mesmo anular o aumento que resultará para as contribuições em 2020, com a aplicação de um fator de correção de apenas -10%.
Ignorando a recomendação que lhe foi feita, e enjeitando responsabilidades na situação a que se chegara ao fim de três reuniões em torno de um único estudo sem alternativa, o Bastonário e Presidente do Conselho Geral da CPAS aprovou o fator de correção de -10%, o qual não impedirá o aumento das contribuições em 2020 ao nível do 5.º escalão de € 230,20 para € 251,38 (€ 279,31 – 10%), tendo-se limitado a recomendar à Direção da CPAS que estudasse a possibilidade de aplicar um fator de -12%, mas sem que tivesse promovido qualquer iniciativa
nesse sentido.
Na altura, estranhei profundamente a conduta do Bastonário e Presidente do Conselho Geral da CPAS, que ora rejeitou para depois aprovar o fator de correção de -10%, o qual não impede o aumento das contribuições para 2020, sem que tenha promovido de forma séria e construtiva qualquer alternativa.
Fiquei, na altura, com a impressão de que a rejeição do fator de correção na reunião de 26 de julho se teria ficado a dever à necessidade de o Bastonário ganhar tempo para fazer o trabalho de casa que não tinha feito antes, ou seja, conseguir junto do Governo a concretização da isenção de IRC para a CPAS, como estava previsto no art.º 266.º do OE para 2019.
Mas, em face do facto recentemente conhecido e que foi pelo Bastonário ocultado desde julho de 2019, a explicação adicional reside igualmente no facto de o Bastonário se ter aposentado, o que poderá ser suscetível de gerar um conflito de interesses entre a sua situação pessoal enquanto reformado e a sua competência para presidir aos destinos do Conselho Geral da CPAS.
Na verdade, entendo que o Bastonário da Ordem dos Advogados deveria ter revelado nas duas últimas reuniões do Conselho Geral da CPAS que se havia aposentado, às quais, salvo melhor opinião, já não deveria ter
presidido.
Enquanto isso, aprovou o fator de correção de -10% que não impedirá o aumento das contribuições em 2020 de € 230,20 para € 251,38 (€ 279,31 – 10%) ao nível do 5.º escalão.
António Jaime Martins é candidato a bastonário da Ordem dos Advogados