Há três anos, recebi um email com o seguinte assunto: O papel da escola! Solicitava-se, num teste de português, que os alunos respondessem ao seguinte: Num texto bem estruturado e linguisticamente cuidado, com um mínimo de 10 linhas, exprime a tua opinião sobre o papel da escola na formação de um cidadão. Eis a resposta: “O papel da escola eu axo que é igual a um papel qualquer de imprensa A4. E de certeza que é. Tem a mesma grossura e tudo. Agora se estão a falar, por exemplo, das folhas de teste que é uma folha A3 duberada ao meio fazendo duas folhas A4, axo melhor que as folhas sejam assim do que só uma folha A4, nossas fichas que a professoras dão são sempre folhas de formato A4 ou de formato A5. Os testes as professoras metam sempre folhas de formato A4 mas quando são mais as professoras agrafam sempre as folhas e nunca faze teste com folhas de formato A5. Por isso eu axo que as folhas desta escola são iguais às das outras escolas ou de outras empresas”.

Desconheço qual a cotação da resposta nem a nota atribuída à totalidade do teste, mas espero que o aluno tenha chumbado. Porém, não creio em tal desfecho. Em Portugal, a educação, pedra angular para o desenvolvimento de qualquer país, anda pela rua da amargura sujeita à melhoria de dados estatísticos em vez do possibilitar e consolidar de conhecimento. Numa época em que caminhamos para um tempo em que o conhecimento será, e fará, a riqueza nacional e o pilar de diferenciação entre os países, Portugal continua a implementar regras que permitem o transitar dos alunos de nível para nível até atingirem o ensino superior. É de espantar que, em provas orais universitárias, alguns alunos não saibam que a NATO e a OTAN são a mesma organização e que para um deles, quiçá para mais, um genocídio seja a morte dos genes?

Felizmente, nasci noutra era. Num período em que a escola exigia de mim. Como tal, consigo evocar, entre outros, Aristóteles “todos aqueles que já meditaram sobre a arte de governar, ficaram convencidos que o destino dos impérios depende da educação da juventude”, Epiteto “Apenas os que possuem instrução são livres”, Ariel e William James Durant “A transmissão dos valores civilizacionais faz-se pela educação” e John Dewey “A educação não é a preparação para a vida; é a própria vida”.

Em 1996, Lester C. Thurow, professor de economia e ex-reitor da Sloan School of Management do MIT, afirmou que “no séc. XXI, as capacidades intelectuais e a imaginação, a invenção e a organização de novas tecnologias serão os ingredientes estratégicos cruciais” para qualquer país. Em 2019, o Ministério da Educação persiste não apenas no amputar das bases fundamentais para o desenvolvimento das capacidades intelectuais como também na aplicação de metodologias e formações desadequadas ao mercado de trabalho.

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Porque é que tal é um risco para o futuro? Primeiro, alunos que não compreendem as perguntas não darão respostas. Alunos que não pensam também não aplicarão soluções nem serão originais. Limitar-se-ão, quiçá, a repetir o que lhes disserem. Mas nem isso está garantido. Segundo, sabendo-se que muitos jovens irão trabalhar em profissões que ainda não foram inventadas, manter formações que foram pensadas o mercado de trabalho que existia há cinquenta anos é incompreensível.

Em  10 Ideias para a Educação, José António Salcedo defende que “o conhecimento é o que as pessoas criam dentro da sua cabeça quando compreendem uma situação, resolvem um problema ou adquirem uma nova competência segundo um processo pedagógico que exige três passos: criação de conhecimento, criação de valor e amplificação de valor”. É isto que se verifica em Portugal? A educação, que já foi uma paixão, deixou de ter valor estratégico. Está confinada a uma visão de curto prazo e desligada das exigências da sociedade.

Como os dividendos das sucessivas reformas educativas são negativos é urgente travar o desinvestimento na educação e a imposição de praticas que fomentam o facilitismo. Só assim a educação se traduzirá em capital para o futuro.

Professor convidado EEG/UMinho