O atual Governo e o seu Ministro da Educação não se aperceberam, a tempo, da dimensão da insatisfação acumulada dos educadores e professores portugueses, para que, a tempo, estabelecessem as políticas que fossem percebidas como valorizadoras e dignificadoras destes profissionais.

Mas, porque é que os professores portugueses estão hoje tão descontentes?

Porque é que os educadores e professores portugueses, embora continuem a afirmar que gostam da profissão que escolheram, são os primeiros, e numa grande maioria, a desaconselharem os mais jovens de serem professores?

Ninguém esquece o extraordinário esforço de adaptação que este corpo de profissionais desenvolveu para responder aos desafios que se levantaram com o encerramento das escolas por causa da pandemia.

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Essa foi a oportunidade para que se confirmasse que o papel do professor, em presença dos seus alunos, é essencial para a qualidade das aprendizagens. Sabemos como, apesar desse esforço, o impacto foi altamente negativo, e muito deveria estar a ser feito ainda hoje para limitar esses efeitos.

A verdade é que, nessa oportunidade, os educadores e professores desdobraram-se a procurar soluções e a manter uma relação próxima com os seus alunos. Este foi um sinal extraordinário do empenho que estes profissionais colocam naquilo que é a essência do trabalho a que são chamados. Mas esse empenho não tem tradução num nível de satisfação que lhe corresponda. Há um enorme mal-estar, há uma insatisfação que tem de ter respostas.

Identifico várias razões para esta situação, mas assinalo apenas três linhas das mais relevantes: os salários, a carreira e o modelo de avaliação de desempenho.

Na primeira linha do seu profundo desgosto está a sensação de que a sua situação salarial nos tempos atuais não corresponde, nem aos níveis de formação inicial e contínua a que estão obrigados, nem às elevadas e exigentes responsabilidades que a sociedade lhes impõe.

Depois, tem vindo a aumentar a perceção de deceção em relação às expetativas de desenvolvimento da carreira. E não é de estranhar que assim seja quando se sabe que um número elevado de professores tem bem mais de 50 anos de idade, mas que uma percentagem bem significativa se encontra posicionada até ao 4º escalão em termos de remuneração – dos 10 escalões que compõem a carreira. Isto corresponde a um desfasamento incompreensível e inaceitável que só acrescenta insatisfação àquela que resulta do facto de o tempo de trabalho ser não só interminável, como é ainda composto de uma série de exigências administrativas e burocráticas que nada têm a ver com a qualidade do trabalho pedagógico que é o nuclear da sua profissão.

Finalmente, a sensação de injustiça que se associa a um modelo de avaliação de desempenho definido para abrandar a progressão em carreira, em vez de servir para que se melhorem as práticas pedagógicas. Esse objetivo de impedir que todos progridam apenas pela soma do tempo de serviço prestado traduz-se na determinação de vagas para aceder aos 5º e 7º escalões e no estabelecimento de quotas para atribuir as menções de Muito Bom e Excelente. Deste modo, muitos docentes classificados de Excelente pelo trabalho que desenvolvem veem a sua classificação reduzida para Bom, devido à aplicação daquelas quotas.

Tudo isto contribuiu para o crescimento da insatisfação, a que se junta a ausência de medidas que combatam ou que mitiguem o especial desgaste de uma profissão de relação diária com dezenas de crianças, jovens e adolescentes; ou ainda a precariedade e a instabilidade que marcam os primeiros 15 a 20 anos de atividade.

Estas situações não nasceram no último mês, nem neste ano letivo; têm vindo a aumentar a insatisfação que já resultava do facto de, ao contrário do que aconteceu à generalidade dos trabalhadores da Administração Pública, os educadores e professores não terem visto reconhecido para o desenvolvimento da carreira uma parte significativa do tempo de serviço que esteve congelado entre 2009 e 2018.

Os governantes não enfrentaram os problemas e ficaram de costas voltadas para estes profissionais, sem lhes darem a atenção que deveriam ter merecido.

Estamos assim perante uma acumulação de insatisfações antigas que deviam ter sido percebidas a tempo e que têm de ter respostas urgentes, as quais, nas atuais circunstâncias, padecerão de todos os defeitos das decisões que são tomadas em situação de emergência, com o grau de precipitação que obviamente lhes estão associadas.

Secretário-Geral da FNE – Federação Nacional da Educação

‘Caderno de Apontamentos’ é uma coluna que discute temas relacionados com a Educação, através de um autor convidado.