Entramos no novo ano sem que o Governo tenha demonstrado capacidade para resolver um litígio com a generalidade dos professores portugueses que se arrasta desnecessariamente há demasiado tempo.

A verdade é que, em finais de 2017, o Governo assumiu um compromisso para a realização de negociações que definissem o prazo e o modo em que deveria ser garantida a recuperação do tempo de serviço dos docentes portugueses, congelado por 9 anos 4 meses e 2 dias entre 2005 e 2017. Aliás, a Lei do Orçamento do Estado para 2018 viria a definir idêntica orientação. Deste modo, o Governo não só não cumpriu os seus compromissos, desrespeitando expetativas criadas, como não deu execução ao que definia a Lei do Orçamento de Estado.

Sobre esta matéria, muito se tem escrito, e nem sempre com razão. A verdade é que se não se considerasse este tempo, se estaria a cometer uma grave injustiça e se estaria a admitir uma inaceitável desigualdade. É que, aos Trabalhadores das carreiras gerais da administração pública, foi considerada a totalidade do tempo de serviço que esteve congelado e estes foram reposicionados no ponto de carreira em que estariam se não tivesse havido congelamento. O Governo não pode ter dois pesos e duas medidas.

Alguns argumentam que a recuperação do tempo de serviço congelado constituiria um privilégio. Ora, não se pode esquecer que os professores, tal como a generalidade dos trabalhadores portugueses, no setor público ou no setor privado, sofreram os efeitos da crise, em múltiplas dimensões, desde o desemprego, a redução de salários, o agravamento dos impostos. Não é nada disso que se pretende que seja ressarcido ou que seja recebido em retroativo. O que é de elementar justiça e sinal do reconhecimento do trabalho desenvolvido, é que o tempo prestado seja considerado, para efeitos de desenvolvimento da carreira de cada um. É o exercício profissional, nas suas dimensões mais profundas, que tem de ser reconhecido, em nome da dignidade profissional.

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Argumenta o Governo com um alegado excessivo peso orçamental, apontando para um crescimento da despesa que seria incomportável. Em primeiro lugar, importa dizer que até hoje não foram divulgadas as contas que suportam essas projeções. Em segundo lugar, e embora não dispondo da totalidade dos dados, quem já tentou fazer algumas projeções dessa natureza, com base em informação pública existente, chegou sempre a números muito inferiores àqueles que o Governo tem apresentado.

O Governo não pode hoje ignorar que, sobre a mesma matéria, os Governos regionais e as assembleias regionais dos Açores e da Madeira adotaram o princípio de que o desenvolvimento da carreira dos docentes tem de considerar o tempo de serviço que esteve congelado. Como não pode ignorar que, à exceção do Partido Socialista, todos os Partidos na Assembleia da República têm idêntico entendimento.

O Governo não pode ignorar o tempo de serviço prestado, passando uma esponja sobre ele. Pelo contrário, é de elementar justiça que os professores retomem o desenvolvimento das suas carreiras.

Não é bom para os alunos, não é bom para as Famílias que persista esta tensão relativamente a um problema que já deveria estar ultrapassado.

Importa, assim, encontrar rapidamente uma fórmula que resolva este problema. O que tem de estar em discussão é determinar o prazo e o modo como a consideração do tempo de serviço congelado vai ter impacto no desenvolvimento da carreira dos professores. E aqui, como os professores e as suas principais organizações sindicais têm afirmado, há elasticidade para acomodar dimensões que podem ser convocadas.

Desde logo, o prazo. Não existe a exigência de que a contagem desse tempo seja feita por uma só vez e de imediato. Pelo contrário, há disponibilidade para fazer deslizar esse prazo, o que pode acontecer ao longo de três legislaturas.

Depois, há a dimensão do acesso à aposentação, que pode constituir uma oportunidade para ajudar a resolver o problema do envelhecimento excessivo do corpo docente que tem de ter como contraponto o seu necessário rejuvenescimento.

Depois ainda, há outras dimensões que podem ser consideradas no quadro da apreciação das condições de desenvolvimento da carreira dos professores.

O respeito que é devido aos professores portugueses exige uma solução rápida que os respeite e valorize.

Secretário-Geral da FNE (Federação Nacional de Educação)
‘Caderno de Apontamentos’ é uma coluna que discute temas relacionados com a Educação, através de um autor convidado.