A gestão de resíduos em Portugal enfrenta atualmente desafios técnicos, especialmente no que diz respeito aos fluxos específicos de biorresíduos e resíduos têxteis. As obrigações impostas pela Diretiva 2018/851 da União Europeia requerem não apenas o cumprimento de metas ambiciosas, mas também a implementação de sistemas técnicos eficazes que garantam a separação, recolha seletiva e tratamento adequado destes resíduos.
Das obrigações decorrentes da Diretiva 2018, relativamente aos objetivos, foram estabelecidos os seguintes prazos, para aumentar a taxa de preparação para a reutilização e reciclagem de Resíduos Urbanos (RU): Até 2025 para 55%, até 2030 para 60% e até 2035 para 65%. Esta, estabelece ainda como meta, até 2035, a redução da deposição em aterro para um máximo de 10 % de todos os resíduos. Esta meta visa reforçar a necessidade de recolher seletivamente os biorresíduos, que representam uma fração significativa dos resíduos urbanos em Portugal, concretamente 37%.
Biorresíduos
No caso do fluxo específico dos biorresíduos, existe um dever alternativo, relativamente aos quais os Estados-Membros podem optar, pela separação e reciclagem na origem ou pela recolha seletiva. Os Estados-Membros foram obrigados a apresentar à Comissão Europeia um relatório sobre a recolha seletiva de biorresíduos até 31 de dezembro de 2021, incluindo o âmbito material e geográfico abrangidos pela recolha seletiva e sobre as eventuais aplicações das derrogações previstas na Diretiva 2018.
A separação e reciclagem na origem ou a recolha seletiva de biorresíduos até 31 de dezembro de 2023 é uma das exigências. No entanto, Portugal enfrenta dificuldades técnicas nesta implementação. Salientando que apenas entre 20% a 27% dos biorresíduos poderão ser abrangidos por derrogações permitidas pela diretiva, que consideram inviabilidades técnicas, económicas ou ambientais. Isto indica que a maioria dos biorresíduos necessita de soluções técnicas viáveis para cumprir as obrigações legais.
A infraestrutura existente para a gestão de biorresíduos é insuficiente. A falta de unidades de tratamento apropriadas, como instalações de compostagem, limita a capacidade de processar os biorresíduos recolhidos. Além disso, a contaminação cruzada devido à recolha inadequada compromete a qualidade dos materiais recicláveis, afetando a eficiência dos processos de valorização orgânica e energética dos mesmos.
A compostagem descentralizada pode ser uma solução técnica eficaz, particularmente em áreas rurais ou com densidade populacional baixa. A promoção de unidades domésticas ou comunitárias de compostagem reduz a necessidade de transporte e tratamento centralizado, diminuindo também as emissões associadas. Contudo, isto exige formação e sensibilização das comunidades para garantir a correta separação e processamento dos resíduos orgânicos.
Resíduos têxteis
No que concerne aos resíduos têxteis, a meta europeia estabelece uma redução de 30% da produção existente em 2000 até 2030. A partir de janeiro de 2025, com um período de adaptação de 18 meses, entrará em vigor a Responsabilidade Alargada do Produtor (RAP) para os têxteis. Esta medida exige que os fabricantes e importadores assumam a responsabilidade pelo fim de vida dos produtos, incluindo a recolha, triagem e reciclagem.
No entanto, existem desafios técnicos significativos neste setor. Atualmente, os resíduos têxteis são muitas vezes recolhidos em contentores urbanos, geridos por organizações não governamentais ou empresas privadas. A falta de rastreabilidade destes materiais levanta questões sobre o seu destino final. Sem sistemas eficazes de Medição, Registo e Verificação (MRV), torna-se difícil assegurar que os resíduos têxteis não estão a ser desviados para aterros de forma ilegal ou exportados sob falsos pretextos.
A implementação de sistemas MRV robustos é essencial. Isto envolve a adoção de tecnologias avançadas, como identificação por radiofrequência (RFID), ou etiquetas inteligentes (II) para rastrear materiais, e plataformas digitais para monitorizar os fluxos de resíduos em tempo real. Além disso, a certificação dos processos por entidades independentes pode garantir a conformidade com as normas ambientais e prevenir práticas ilegais.
Outro desafio técnico é o desenvolvimento de tecnologias de reciclagem adequadas para os têxteis. A reciclagem mecânica tradicional tem limitações, especialmente com materiais mistos ou sintéticos. A reciclagem química surge como uma solução promissora, mas requer investimento em pesquisa e desenvolvimento, além da construção de novas instalações industriais.
A colaboração interdisciplinar entre entidades governamentais, universidades, centros de pesquisa e o setor privado é fundamental para superar estes desafios técnicos. É necessário incentivar a inovação através de programas de financiamento dedicados, como fundos europeus direcionados para a economia circular e gestão de resíduos.
Além disso, a uniformização normativa nacional com a europeia é crucial. As discrepâncias entre as regulamentações e os modelos de gestão municipais podem criar barreiras técnicas à implementação de sistemas de gestão de resíduos eficientes. A criação de guias técnicos nacionais e a promoção de boas práticas podem facilitar a adoção de soluções consistentes em todo o país.
A vontade política e o compromisso das autoridades desempenham um papel determinante. A prioridade de investimentos em infraestruturas de gestão de resíduos, o reforço da fiscalização ambiental e a aplicação de sanções efetivas em casos de incumprimento são medidas necessárias para garantir o cumprimento das metas estabelecidas.
Portugal enfrenta desafios técnicos significativos na implementação das metas de redução e mitigação de resíduos estabelecidas pela União Europeia. A solução passa por um esforço conjunto que envolve a melhoria das infraestruturas, a adoção de novas tecnologias, a capacitação técnica e a implementação de sistemas de monitorização eficazes. Apenas através de uma abordagem técnica robusta e integrada será possível alcançar os objetivos propostos, contribuindo para a sustentabilidade ambiental e o bem-estar das gerações futuras.
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