Numa era em que a tecnologia potenciou a globalização, assistimos preocupados a crescentes tendências de recursos à tirania e à opressão. Ideias mais efetivas que nos façam compreender os direitos, deveres, liberdades e garantias, são cada vez mais essenciais. A Declaração Universal dos Direitos Humanos é bastante reconhecida, mas efetivamente pouco aplicada na sociedade de hoje. Há ainda muito por desenvolver nas mentalidades.
Num recente artigo de opinião Jan Zielonka afirmou – “Na Rússia, segundo as redes sociais, o Brexit acaba de assumir um novo significado: como dizer adeus, mas nunca ir embora.” Num artigo focado no momento sensível que vive a Europa, não deixei de ler e refletir “O Significado Português do racismo”. Ou seja, algo como “em Portugal, segundo as redes sociais, o Racismo acaba de assumir um novo significado: como dizer adeus, mas nunca ir embora.”
Em Portugal, a ligação mais afetiva e real é com a cultura afro. As novas gerações, a minha, independentemente da sua condição social ou partida cultural, vivem e convivem com o kuduro progressivo e a quizomba. Temos também uma vivência com a presença oriental, a arte urbana, a cultura hip-hop, entre outras trocas que fizemos e que se tornaram legados culturais. Ao longo de anos, de séculos até, desenvolvemos patrimónios comuns, sendo uma delas, e a mais importante, a língua.
Quando era adolescente, vivia no bairro do Pombal, em Oeiras, um dos designados “bairros sociais”. Um dia levei ao bairro um amigo (branco) da escola. Ele achou que iria ser assaltado, repudiado, injuriado. Sei lá quantos mais sentimentos recriminatórios envolviam o pensamento do meu amigo, que nunca havia entrado num bairro social. Entendi que este medo era causado pelo que lhe foi incutido e não por ter vivido alguma situação em concreto. O que me levou a concluir que quem lhe colocou essas ideias, também desconhecia o bairro.
Esse desconhecimento ainda continua a criar preconceitos idiotas que, sejamos sinceros e porque a história o comprova, nunca deixarão de existir. Mas se somos nós quem fazemos a história, então está na hora de não vergar e de tomar uma atitude. De fazer prevalecer os valores liberais. Nem que seja a de, sobrepondo o espírito de tolerância, aceitar a existência de preconceituosos e intolerantes, tendo em conta que a sua liberdade não inclui os outros, mas também não se sobrepõe à dos outros.
Acredito que muita da intolerância tem por base o desconhecimento. Pelo que a primeira arma no combate aos intolerantes é a informação e a formação. Na segunda vez que o meu amigo foi ao bairro ainda o fui buscar “à porta do bairro”, mas daí em diante esperei sempre que a campainha da minha casa tocasse.
Antes de culpar os avôs, os pais ou até o Estado, entendamos que os maiores culpados somos nós mesmos. Quando não mudamos o comportamento, nem com coisas mais pequenas como ceder lugar a um idoso ou gestante. Ou nos enredamos na necessidade de um sentimento de superioridade que tentamos exercer uns sobre os outros, criando desentendimentos e revoltas como a do bairro da Jamaica.
Sem querer ferir as suscetibilidades de ninguém, a realidade fere muito mais.
Na Europa os chamados “Guetos” (espaço de movimentação das minorias e habitação das classes baixas e precárias) são por sua ordem, os locais onde as pessoas com essas dificuldades tentam procurar outras formas de sobrevivência. Fazem-no para se manterem e serem aceites por uma sociedade que continua a alimentar a existência destes mesmos locais. E, por consequência, a alimentar preconceitos e intolerâncias.
Se 500 anos de trocas e influências não chegam para mudar algo, pergunto-me quantos mais precisamos para dizer adeus a algo que não nasceu connosco? No mundo atual o próprio conceito de estrangeiro soa a bafio.
Precisaremos de quantos mais anos para podermos ver cada cidadão como pessoa íntegra de obter o reconhecimento da sua personalidade, capacidade jurídica e dos seus direitos como tal, independente da sua origem, da religião, da opção sexual ou condição social? E quanto mais tempo para percebermos que a nossa evolução humana se deve a estas trocas e que agora podemos gritar juntos a máxima europeia “A União Faz a Força!”?
Contem comigo para combater a intolerância, mas para isso não podemos escamotear a realidade, independentemente da sua dimensão. Se existe algo mal, urge atuar.
Existe racismo, existe xenofobia e elitismo, mas isso não deve servir como desculpa para deixar de lutar para chegar mais longe. É preciso que os discriminados não esmoreçam, não se deixam levar pelo desânimo e não usem a discriminação como desculpa interior para deixar de lutar. Lutar é difícil, lamentar-se é mais fácil, mas acabará por ter consequências mais graves. É preciso transformar um sentimento de revolta em energia positiva para vencer.
O economista Gary Becker dizia que a discriminação saía cara, que num mercado competitivo, os empregadores que discriminam, acabariam por sair vergados aos custos adicionais da sua atitude. Nada melhor para combater a discriminação do que a concorrência e o mercado livre. Isso aliás já acontece no desporto e nas artes. Não é difícil imaginar o que aconteceria a um clube de futebol que se recusasse contratar negros. Para acabar de vez com a discriminação, precisamos que estas consequências se alarguem a todos os sectores. Precisamos de uma economia mais dinâmica e concorrencial. Precisamos que o poder empresarial deixe de estar concentrado em meia dúzia de empresas agarradas ao estado.
No meu percurso de vida tenho sido um lutador pela Liberdade e pela Tolerância. Por tudo isto, decidi agora juntar-me a um partido pela primeira vez: a Iniciativa Liberal. Não porque deseje políticas de discriminação positiva ou o habitual aproveitamento político do racismo que fazem outros partidos. Mas porque quero, mais que tudo, que o país se livre da discriminação pela via da criação de mais oportunidades. Para que todos, à sua medida, no seu bairro ou no Mundo, ajudem a termos uma sociedade mais liberal.
Ator e Cantor, membro da Iniciativa Liberal