O sistema de ensino superior e investigação científica é um pilar fundamental para o sucesso de um país. Em Portugal, onde o tecido empresarial é pouco intensivo em tecnologia, a necessidade de impulsionar a inovação e promover a competitividade torna este sistema ainda mais relevante. Este artigo apresenta doze medidas estratégicas para transformar o ensino superior e a investigação no país, promovendo autonomia, eficiência, inclusão e impacto.

Autonomia, Financiamento e Avaliação

  • 1 | Para que as universidades se adaptem rapidamente às mudanças e inovem continuamente, é essencial estabelecer real autonomia de gestão. Assim, a gestão orçamental e de recursos humanos, incluindo o estabelecimento de vagas para contratações e promoções, bem como os níveis salariais, devem ser determinados exclusivamente pelas universidades, garantindo que estas podem definir e trilhar os seus próprios percursos estratégicos e assegurando uma melhor capacidade para atrair e reter talento. Um caminho possível para as instituições públicas é a adoção de um regime fundacional completo, com as universidades a responder a um regulador ativo que estabelece parâmetros de funcionamento e níveis de serviço, e não ao ministério, que define a política e mecanismos de apoio e regulação. Nesse sentido, o regime deve incluir um modelo de intervenção ou resolução em caso de problemas de gestão, garantindo continuidade, qualidade do ensino, e proteção dos colaboradores.
  • 2 | O financiamento público às universidades, que é fundamental dada a natureza da sua atividade, deve ser diferente para a educação e investigação. A educação deverá ser financiada por aluno, área de conhecimento e qualidade do ensino, enquanto a investigação é financiada em função do número de investigadores e área de conhecimento, bem como pela qualidade e impacto do trabalho científico, promovendo assim excelência académica e inovação.
  • 3 | Os números clausus para as licenciaturas devem ser flexibilizados, sendo substituídos por bandas de financiamento em função do número de alunos. O financiamento base apoia a frequência até um determinado número de alunos nacionais (e da UE), existindo uma zona neutra sem financiamento adicional, e possivelmente penalidades para instituições que ultrapassem determinados limites or parâmetros. Universidades capazes de atraírem alunos de famílias com baixos rendimentos devem ter majorações no financiamento, promovendo inclusão social.
  • 4 | Para complementar uma fórmula base de financiamento, são estabelecidos contratos programa para apoiar universidades em determinadas regiões ou para desenvolver áreas e temas específicos de ensino, investigação e valorização do conhecimento relevantes para o país ou região. Esta medida é importante para garantir o desenvolvimento regional equilibrado e responder às necessidades do mercado.
  • 5 | As universidades devem ser avaliadas periodicamente e de forma integrada ao nível da qualidade do ensino, investigação e transferência de conhecimento. Estas avaliações deveriam ocorrer a cada quatro ou cinco anos e os resultados determinariam parâmetros de qualidade e majorações nos financiamentos, incentivando melhoria contínua e excelência.

Acesso e Apoio ao Estudante

  • 6 | Ao nível do estudante, o concurso nacional é substituído por candidaturas avaliadas diretamente pelas universidades, com base em critérios públicos, o que promoverá escolhas mais personalizadas, quer das universidades quer dos candidatos. Cada aluno poderia apresentar até três ou quatro candidaturas. Como referido acima no ponto 3, as universidades teriam ainda incentivos ou requisitos de financiamento no sentido de atrair estudantes de famílias mais desfavorecidas, promovendo diversidade e inclusão.
  • 7 | As universidades cobram propinas substantivas aos estudantes nacionais e da UE, indexadas ao custo mediano por aluno do sistema nacional (o nível de indexação poder ser definido pelo governo em função da sua perspetiva sobre o equilíbrio entre benefício privado e público do grau). Este valor tem como complemento o financiamento direto à universidade referido em 2. Para compensar a existência de propinas, é estabelecido um sistema nacional de bolsas para os alunos aceites nas universidades, variando entre zero e um múltiplo da propina, conforme o rendimento familiar, procurando garantir equidade no acesso e frequência do ensino superior. As universidades devem poder aceitar alunos de fora da UE que verifiquem as condições de acesso para as licenciaturas, ajustando as propinas conforme desejem. O acesso, propinas e bolsas para programas de pós-graduação devem ser definidos pelas universidades.

Promoção da Qualidade, Mobilidade e Transferência de Conhecimento

  • 8 | Para combater a endogamia e promover mobilidade académica, são definidas quotas máximas para o recrutamento interno dos doutorados na própria universidade, com níveis até 30%. O não cumprimento destas quotas resulta em penalizações no regime de financiamento.
  • 9 | No início da carreira, são oferecidos contratos de professor auxiliar a termo certo, com seis anos. No final desse período, haverá promoção para professor associado e vínculo permanente, ou a finalização do contrato, dependendo do resultado de uma rigorosa avaliação. Esta avaliação é conduzida por um painel maioritariamente externo, com cartas de recomendação de instituições de referência internacionais, assegurando imparcialidade e qualidade no processo de promoção.
  • 10 | Criar um programa nacional de cátedras públicas para atrair talentos internacionais e nacionais de excelência, incluindo financiamento de salário e atividades complementares de investigação (eg. alunos de doutoramento), promovendo um ambiente de elevada qualidade académica.
  • 11 | Estabelecer um incentivo à participação em candidaturas europeias de ciência e inovação, com apoio automático a finalistas de programas europeus. Por exemplo, candidatos selecionados para a segunda fase das bolsas do European Research Council devem receber financiamento nacional, mesmo que não ganhem a bolsa europeia.
  • 12 | Por fim, seria estabelecido um programa de financiamento específico para apoiar a comercialização de tecnologias desenvolvidas nas universidades. Este programa focará na progressão do nível de comercialização (TRL: Technology Readiness Level) das tecnologias, incluindo a compra de tempo do professor à universidade para exploração da tecnologia (uma sabática de empreendedorismo), promovendo inovação e transferência de conhecimento para o mercado.

Conclusão

Estas doze medidas propõem um modelo mais autónomo, eficiente e inclusivo para o ensino superior e a investigação em Portugal. A sua implementação permitiria às universidades portuguesas competir globalmente, estabelecendo um caminho para a excelência e a inovação, e simultaneamente respondendo às necessidades dos alunos, das regiões e da sociedade. Ao adotar estas reformas, Portugal estará mais bem preparado para enfrentar os desafios futuros e aproveitar as oportunidades de um mundo em constante mudança.

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