Em ano de jogos olímpicos e de diversos sucessos de atletas nacionais, partilho a minha convicção na importância de otimizar o investimento que, mesmo que modesto, temos feito enquanto país no desporto. Como praticante de desporto escolar, numa vertente embora lúdica e um pouco mais a sério na vela, em que cheguei a estar federado alguns anos mas longe da alta competição, vivi os benefícios da entreajuda, sacrifício e superação. Considero essencial garantir o retorno do investimento feito no ecossistema desportivo e, sobretudo, contribuir para a dignidade vitalícia dos atletas de elite que nos inspiram!

A alta competição desportiva move-se num ambiente altamente meritocrático. Sucesso e progressão na carreira dependem intimamente de resultados desportivos, mensuráveis e altamente escrutinados por público e media. Contudo, é marcado por elevadas disparidades de oportunidade, nomeadamente ao nível do apoio aos atletas, em função do respetivo contexto socioeconómico. Desde a segurança financeira familiar requerida para apostar numa carreira altamente exigente e arriscada, atreita a insucessos tardios decorrentes da limitação do corpo humano (lesões, não ser suficientemente bom para atingir segurança financeira) até à disparidade de capacidade de investimento em treinadores, médicos, fisiaterapeutas, psicólogos e coaching particular, que transcende a oferta dos clubes e federações e que tende a promover melhores resultados relativamente àqueles que não têm a oportunidade de fazer este investimento financeiro pessoal.

No contexto de desportos coletivos é possível constatar, aquém e além fronteiras, enormes diferenças salariais entre jogadores da mesma equipa (podemos encontrar situações de 1/20 no mesmo coletivo) que são colmatadas pela perspetiva de o sucesso permitir a progressão salarial dentro da equipa, embora nem sempre (vide Michael Jordan e Scott Pippen no documentário Netflix Save the Last Dance).

Inúmeros são os exemplos desportivos em que o sucesso decorre da habilidade na gestão do ego dos diferentes atletas da equipa, altamente competitivos e motivados pela perspetiva de glória pessoal, para que impere o primado do coletivo em detrimento do individualismo. Assim como são inúmeros os exemplos em que o seu contrário levou a resultados desastrosos ou, no mínimo, inesperados.

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Lições úteis, amplamente conhecidas, mas infelizmente não tão extrapoladas para outros contextos quanto gostaria. Inclusive, os peritos constatam que nas últimas décadas o desporto coletivo tem-se tornado cada vez mais individualista, com os seus melhores atletas a beneficiar de entourage de apoio particular. Em contraponto com os desportos individuais, em que se assiste à coletivização dos seus atletas que apresentam melhores performances quando integrados em clubes ou seleções, onde beneficiam de uma estrutura coletiva de apoio. Infelizmente, no desporto em geral, sobretudo nas modalidades mais populares que consequentemente movem maiores interesses económicos, é relatada uma enorme falta de partilha de dados e informação, percebidos como a alma do negócio, que tem limitado abordagens holísticas e simbióticas que certamente trariam benefícios significativos a todos os profissionais envolvidos.

A elite do desporto promove e implica a obtenção de elevada maturidade e resiliência física e psicológica que constituem indubitáveis vantagens competitivas muito significativas quando postas ao serviço de outros contextos. Uma das estratégias de sucesso, em voga entre atletas, consiste em ter uma carreira dual para induzir e manter resultados de excelência. Ter mais que uma atividade profissional permite, entre outros benefícios, um provável desfasamento de sucessos e insucessos das diferentes atividades e assim mecanismos de retroalimentação que potenciam o sucesso e a criatividade.

Ao nível económico, recorde-se que o desporto de alta competição, qualquer que seja, gera dinheiro, em maior ou menor dimensão, desde as receitas decorrentes do espetáculo, passando pelos patrocínios de marcas desportivas, direitos televisivos, transferências e empregabilidade de profissionais especializados desta área. Inspira, emociona e cria ídolos, energias que podem ser positivamente canalizadas de diferentes formas para contribuir para a resolução de problemas políticos e sociais. Recorde-se Jesse Owens nos Jogos Olímpicos de Berlim em 1936, Bobby Fischer em contexto de guerra fria e mais recentemente a campanha arrojada da Nike em apoio ao movimento Black Lives Matter após a morte de George Floyd.

Um dos desafios que se coloca aos atletas é a sua integração profissional pós alta competição. Nem todos, provavelmente apenas uma minoria, são absorvidos satisfatoriamente pelo ecossistema. Este problema poderá ser solucionado das mais variadas formas: programas de incentivo ao empreendedorismo, sensibilização do mundo empresarial para as competências humanas dos atletas, agências de recrutamento especializadas, transição de carreira gradual e antecipada, entre outros. Considero um imperativo de gratidão e inteligência financeira garantir oportunidades profissionais também fora do desporto, com condições dignas para ex-atletas em idade ativa, que lhes permitam obter segurança financeira pessoal e ao país otimizar o retorno do investimento financeiro que, direta ou indiretamente, todos fizemos para o desenvolvimento da sua carreira desportiva.

Perante todos os elementos que lhe trago hoje termino com um apelo sobretudo à sua simpatia para esta causa e a uma abordagem multidisciplinar, simbiótica, coletivamente inteligente, que una eficientemente stakeholders e materialize uma cultura desportiva nacional que constitua mais uma força motriz virtuosa para o país.

Rui Esteves, tem 33 anos, apaixonado por sustentabilidade, mar e liderança juntou-se ao Global Shapers Lisbon Hub em 2014.

O Observador associa-se aos Global Shapers Lisbon, comunidade do Fórum Económico Mundial para, semanalmente, discutir um tópico relevante da política nacional visto pelos olhos de um destes jovens líderes da sociedade portuguesa. O artigo representa a opinião pessoal do autor, enquadrada nos valores da Comunidade dos Global Shapers, ainda que de forma não vinculativa.