Ao longo destes lentos meses “pandémicos” vim a observar com muita atenção o tema do ensino e, especificamente, o que se passou no ensino obrigatório, público, obteve a minha particular atenção. Foi com bastante perplexidade, irritação e tristeza que identifiquei um método de trabalho por parte de alguns docentes que pode muito bem não ser chamado de ensino. Não obstante, vale a pena salvaguardar que a imagem que vou descrever nas próximas linhas não corresponde a uma imagem panorâmica do ensino à distância. É a imagem, no entanto, de uma parte muito significativa.

Cada professor, de acordo com o seu estilo, fez as suas solicitações e os alunos tentaram não se perder – ao estilo de uma espécie de caça ao tesouro, os alunos precisaram mesmo de um mapa.

A um ritmo alucinante, “não recomendado a adultos”.

Os meios de contacto com cada docente foram diversos, as plataformas de entrega de trabalhos também variaram de disciplina para disciplina e os alunos navegavam num mar de especificidades que confundia qualquer adulto (muito) organizado. E vale a pena mencionar que estamos a falar de cerca de 12 disciplinas, no caso do 3º ciclo.

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Alguns professores comunicaram através de e-mail (uns para o e-mail da turma, outros para o e-mail de cada aluno). Outros professores estiveram também disponíveis através de uma plataforma como a Classroom, da Google, sem aulas síncronas e, outros houve, ainda, que fizeram uma menção muito generosa à sua disponibilidade para responderem a dúvidas, uma vez por semana, através do Hangouts, plataforma de chat, também da Google. Houve também reuniões através da aplicação Zoom, uma vez por semana, mas só em algumas disciplinas.

Quanto a esta reunião não a poderei chamar de aula, porque o conceito de aula pressupõe uma lição – um ensinamento veiculado por um professor – o que não acontece. Estas reuniões servem, mais uma vez, para perguntar aos alunos se têm dúvidas – de matérias que não foram, no verdadeiro sentido da palavra, leccionadas pelos professores.

O conceito de escola não costumava envolver os docentes no processo de aprendizagem?

Como apoio ao estudo, é sugerido que vejam a Telescola da RTP Memória e são enviadas sugestões de vídeos do Youtube (que tão-pouco são da autoria dos próprios professores) e nesta fase, então, já se perdeu completamente de vista a noção de segurança online.

Toda a gente sabe que incentivar crianças e jovens a utilizar a internet, muitos deles sem supervisão e com uma capacidade de (des)concentração tão peculiar, é uma ideia brilhante! Não é?

O que está a acontecer, enquanto estes alunos estão em casa, uns com o apoio dos pais, outros a estudar completamente sozinhos, é de uma negligência absurda. São milhares de crianças e jovens em estudo completamente autónomo. Alguns professores atribuem notas a trabalhos ou questionários online e, se disponibilizam a correcção, não trabalham com os alunos os tópicos que suscitam mais dificuldades.

Então é agora o momento de perguntar se isto que descrevo é o ensino à distância ou, a bem da verdade, é a distância do ensino. E, neste último caso, os professores tornaram-se excluíveis da equação da escola.

Se pusermos de lado o facto de que os docentes do ensino privado podem, ou não, ter plataformas exclusivas ou, pelo menos, configuradas a cada estabelecimento de ensino, e os docentes do ensino público não têm uma plataforma com essas especificidades, ambos os grupos de docentes estão perante igualdade de recursos: tanto os docentes do ensino privado como do público são obrigados a estar fisicamente separados dos seus alunos e têm, à partida, internet à disposição para disponibilizarem aos seus alunos recursos digitais e agendarem aulas síncronas (e, se necessário, procurar forma de fazer chegar materiais de apoio aos alunos que não têm acesso aos recursos multimédia). Então, estão todos, sem excepção, perante o dever de ensinar os seus alunos, já que ,de resto, foi a profissão que escolheram.