A Sra. Deputada Municipal eleita pela coligação Novos Tempos e cronista do Observador, Arq.ª Margarida Penedo, entende que as questões de segurança, ou falta dela, não podem ser equacionadas por ninguém de Esquerda. É um tema proibido.

Pelo que escreve, e me invetiva, só mesmo os “predestinados” de direita terão autoridade moral para falar deste assunto, do qual, aliás, já sabem tudo: essencialmente a culpa é dos imigrantes. Sobretudo, os de pele escura, asiáticos e de uma outra religião que não a predominante no nosso país. É um argumento pobre e já demonstrado como falso pelas autoridades. Não há correlação entre o aumento da criminalidade ou da violência e o crescimento da imigração. É um argumento “pobre de espírito”.

Esclareço: Não sou crente. Não tenho religião. Porém não conheço nenhuma religião monoteísta que reconheça às mulheres um estatuto de igualdade perante os homens. Conotar este argumento com uma outra religião é algo de anti-ecuménico e revela um profundo “esquecimento” do injusto papel desempenhado pelas igrejas em relação às mulheres – também aqui em Portugal. Esta atribuição de uma culpa coletiva às religiões dos imigrantes quase que merecia uma contrarresposta igualmente demagógica: desconfio que a maioria dos atos violentos e assassinato de mulheres no nosso país, recentemente noticiados, são cometidas por cidadãos não-migrantes e porventura fiéis da religião predominante. É melhor não irmos por aí.

Sou de Esquerda e sou Presidente de uma Junta de Freguesia. Tenho o dever de representar e procurar proteger o direito à qualidade de vida e ao exercício das liberdades cívicas das pessoas que aqui vivem. Ao Presidente de Junta chegam todas as queixas, lamentações e angústias de problemas sociais. Não é por acaso que as freguesias são o poder político democraticamente eleito de maior proximidade.

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Sim, de uma situação apesar de tudo controlada passámos nos dois últimos anos para um estado de grande dificuldade. Há pessoas assaltadas frequentemente, muita droga na rua, muito álcool durante a noite, grupos ou gangues que se apropriam do espaço público e aterrorizam os residentes com ameaças e invasões dos prédios onde moram, há facadas, seringas espalhadas em todo o lado – mesmo nos parques infantis e bancos de jardim – e sim, houve uma tentativa de violação perpetuada por um cidadão de pele clara (podia ser escura) e impedida por residentes. Sim, a situação não está fácil e sim, é um problema de toda a comunidade.

Perante estas dificuldades, ou nos entrincheiramos nas nossas convicções ideológicas e não resolvemos nada, ou procuramos enfrentar, sem demagogia, estes factos. Como Presidente da Junta só vejo um caminho a seguir. É preciso combatermos os atos criminosos, proteger o espaço público de maus usos, levar à justiça quem tiver de ser – mas nunca atirar culpas para um determinado grupo, até porque será injusto e não verdadeiro. Repito: há criminosos de todos os quadrantes sociais, grupos étnicos, religiões, raças e sim, também, de orientações sexuais.

Porque fizemos uma iniciativa pública? Precisamente porque as pessoas deixaram de fazer queixa. Demos voz a cerca de quarenta cidadãos, entre os quais também se encontravam vítimas asiáticas e africanas, que foram vítimas dessa violência. E para grande “azar” de alguns defensores da sua tese “racial/religiosa até ouvimos uma cidadã “branca” dizer que lhe estavam a assaltar a casa “duas pessoas de pele clara” e que foram uns vizinhos paquistaneses que a avisaram de tal facto. As pessoas estão cansadas do estafado argumento estatístico (experimente fazer uma queixa durante a noite!).

Precisamos de reforço policial, sobretudo patrulhamento apeado, de proximidade com reforço no período noturno. Aparentemente estará a haver uma reação tendencialmente positiva por parte das autoridades – vamos ver se é para durar, ou apenas para “encher o olho”… Contudo, nem tudo depende da resposta

policial.

A Câmara Municipal também pode ter um papel muito importante, implementando medidas que desencorajem o mau uso do espaço público. Talvez por dever de ofício político a Sra. Deputada Municipal, no artigo em que me invetiva, passou ao lado das mesmas. Importa relembrar: mais e melhor iluminação pública; rede de videovigilância, de acordo com as normas legais; controlo de vendas de bebida para a rua a partir das 21h; redução dos horários de funcionamento e proibição de ruído até às 23h nos dias de semana e 24h à sexta-feira, sábado e vésperas de feriados, com sanções acessórias para quem reiteradamente incumprir; alocação de espaços municipais para abertura de esquadras de proximidade – a Junta de Freguesia disponibilizou dois espaços para esse fim; proibição de montagem de tendas na via pública; criação de uma rede descentralizada por todas as freguesias de salas de consumo assistido e, por fim, um empenho sincero do Sr. Presidente da Câmara junto do Governo e do Parlamento para acabarmos com o Licenciamento Zero.

Sim, Sra. Arq.ª Margarida Penedo, sou de Esquerda e defendo tudo isto, porque só posso partir do conceito de combater maus comportamentos e não grupos sociais/étnicos específicos. Precisamente porque quero contribuir para atenuar a ansiedade e preocupações diárias das pessoas. Gente com direito à paz, à qualidade de vida, ao livre usufruto do espaço público e, muitas vezes, da sua própria habitação, sem receio de serem agredidas, enxovalhadas e colocadas em perigo na sua saúde física e mental. A cidade tem de ser para todos.

Vamo-nos dividir naquilo que merece divisão. A Sra. é uma defensora à outrance do Alojamento Local, que eu entendo que afasta compulsivamente residentes permanentes, tornando o território mais inseguro; a Sra. não se incomoda que se possa beber na via pública pela noite fora, eu considero que potencia a desordem, os desacatos e atrai muita marginalidade, não permitindo que as famílias residentes tenham direito ao descanso; a Sra. parece apreciar esta turistificação massiva, eu entendo que a médio prazo estamos a dar cabo da indústria do turismo; a Sra. incomoda-se com as diferentes culturas, diversidades, etnias e religiões, eu (que repito, não sou religioso) revejo-me integralmente nas palavras do Papa Francisco: a cidade é para todos! Todos.

Termino com uma lembrança que nem os seus líderes ou companheiros de partido mais atentos se atrevem a fazer-me: é que só faço isto porque “é o Moedas e não o Medina”. Se não sabem, devia saber, que sempre, mas sempre, que entendi que os legítimos interesses das pessoas que represento estariam prejudicados face a decisões da Câmara, mesmo quando gerida pelo PS, assumi, sem tibiezas, a sua defesa. Foi assim com o AL, os tuk-tuk, o Martim Moniz, o ruído na rua ou a mobilidade. Sabe porquê? Porque sou um homem livre.