Nos últimos dias, a proposta do IRS jovem tem sido criticada por vários analistas, que a consideram uma medida sem sentido e muito injusta. Mesmo sem considerar o efeito que esta medida poderá ter na retenção dos jovens, acredito que ela, apesar de mal calibrada, é muito mais justa do que a situação atual. Para mostrar isso, vou recorrer a uma expressão financeira conhecida: um euro hoje vale mais do que um euro amanhã.

Esta expressão significa que, se o leitor me desse um euro hoje e eu devolvesse esse euro amanhã, o leitor estaria a perder dinheiro. Para além de fatores como a inflação ou a incerteza do futuro, esta perda também acontece por outra razão: o juro. Se eu receber o seu euro hoje, posso investi-lo e ganhar juros. Quando chegar a hora de devolver o seu euro, eu terei ganho algum dinheiro extra com esses juros. Assim, com esta troca o leitor perderia a oportunidade de ganhar esses juros. Ou seja, uma troca mais justa implicaria eu devolver amanhã o euro com os juros associados. O juro ajuda-nos então a perceber quanto é que um euro hoje pode valer no futuro: simplesmente o euro mais os juros associados. Quanto mais tempo passa, mais o dinheiro se multiplica com os juros, de tal forma que um euro hoje pode valer quatro euros daqui a 40 anos. Esta é uma das primeiras lições de qualquer curso de literacia financeira.

O que é que isto tem a ver com o IRS jovem? Imaginemos duas pessoas solteiras que recebem 1000€ de salário mensal bruto, mas com idades diferentes: uma tem 20 anos e a outra tem 60 anos. Ambas vão pagar cerca de 1500€ de IRS durante o ano. Mas, como vimos anteriormente, a pessoa de 20 anos tem a oportunidade de ter mais 40 anos para transformar estes 1500€ em algo quatro vezes mais valioso do que a pessoa de 60 anos. Ou seja, os 1500€ valem quatro vezes mais nas mãos da pessoa de 20 anos do que nas da pessoa de 60 anos. Portanto, o Estado está a pedir à pessoa de 20 anos que abdique de quatro vezes mais dinheiro do que a pessoa de 60 anos, apesar de ambas receberem o mesmo rendimento. Com um pouco de literacia financeira, percebemos que o atual sistema, que taxa o mesmo montante a pessoas de idades diferentes, é injusto. Como se tratam de pessoas em situações diferentes, devemos aplicar o princípio da equidade vertical: taxar de forma diferente de acordo com as diferenças, ou seja, a solução equitativa implica equilibrar o valor intertemporal dos sacrifícios. Neste caso, o jovem deveria pagar quatro vezes menos IRS do que a pessoa com 60 anos, de forma a que o que o jovem entrega ao Estado, com juros ao longo de 40 anos, seja equivalente ao que a pessoa de 60 anos paga de IRS. É por isso que faz sentido os jovens pagarem menos IRS.

Assim, a solução mais justa seria aplicar taxas de desconto no IRS que diminuem com a idade, para que o valor intertemporal de um euro de imposto seja igual entre contribuintes de diferentes idades. Sabendo que este princípio tornaria o sistema fiscal mais complexo, e que a simplicidade é um princípio fiscal crucial, aplicar uma taxa de desconto única no IRS aos jovens parece-me um bom equilíbrio entre justiça e simplicidade. No entanto, tenho uma crítica à proposta atual. Usando uma taxa de juro anual de 3,5% (equivalente à média das taxas de juro da dívida pública portuguesa nos últimos 20 anos), o sistema de IRS jovem deveria dar um desconto de apenas 56% (em vez dos 67%). Ou seja, a proposta está descalibrada em favor dos jovens. Ainda assim, está muito mais perto da solução mais justa do que a atual, que é dar um desconto de 0%.

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