Em Portugal, muitos avôs e muitas avós, em situações de privação injustificada do convívio com os seus netos e as suas netas, solicitam através de ações judiciais, aos tribunais portugueses, pedidos de regulação de convívios dos avós com netos. Isto acontece especialmente em casos de alienação parental, em que um dos pais (mãe ou pai alienador) reiteradamente impossibilita o convívio entre os filhos e o pai ou mãe alienada, sendo os avós desta parte, por extensão, impedidos das relações e do convívio com seus netos sem qualquer fundamento, rompendo-se esta importante relação de parentesco e afetiva.

Em seguida, damos dois exemplos da jurisprudência portuguesa que permitiram contrariar aquela situação, através de Acórdãos que concederam aos netos e netas o direito de conviver com os seus avós e avôs.

Um primeiro é exemplo o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 07 de abril de 2022, onde se refere que: “Os avós maternos dos menores L. N., nascida a -/-/2014 e A. N., nascido a -/-/2018, vieram pedir a fixação de um regime de convívios com os netos, com os quais foram privados de conviver, desde fevereiro de 2019, pelos progenitores.
A argumentação dos progenitores para tal proibição é pouco plausível. Não foram apresentados motivos válidos ou que encontrem sustentação probatória nos autos a não ser o facto de se terem desentendido e cortado relações. Certo é que os avós das crianças conviveram de forma muito próxima com os netos, designadamente com a L. N., que residiu com os pais na mesma casa dos avós até 2016. A partir daí, quer ela, quer o irmão, conviveram amiúde com os avós até fevereiro de 2019, altura em que os pais cortaram qualquer tipo de contato entre os avós e os netos devido a um acontecimento (queda ocorrida enquanto estava ao cuidado dos avós) que, quanto a nós, não exibe relevância que justifique cercear a convivência entre os menores e os seus avós, presença até aí constante na sua vida. Nessa conformidade, uma vez que o estabelecimento de ensino frequentado pelos menores tem prolongamento de horário e funcionário responsável pelas entregas das crianças, promovo que se fixe, provisoriamente, a possibilidade dos avós maternos dos menores poderem conviver com os netos uma vez por semana, podendo ir buscá-los ao equipamento educativo no fim do período letivo para um lanche, entregando-os até às 19 horas com vista a ali serem recolhidos pelos progenitores” (cit.). Nesta situação os avós, de uma dedicação extrema aos netos, foram injustificadamente privados do contato com os mesmos, como revanche dos pais, aqui os alienadores, em reação a um desentendimento. A justiça, através do tribunal, foi reposta.

Outro segundo exemplo refere-se à jurisprudência do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 30 de maio de 2018, onde se refere que: “Sumário: I – Criados os laços e o convívio, é da normalidade concluir que o afastamento que os requerentes promoveram entre os avós e a neta causa grande perturbação (…) II – O carinho, a segurança, a estabilidade dados por estes avós e a alegria das brincadeiras com os primos desaparecem sem que a menor entenda porquê. Tal situação é até susceptível de suscitar na criança traumas e um sentimento de rejeição (..) IV – As medidas, fixadas na sentença, vieram reestabelecer, na medida do possível, o convívio indispensável à continuidade dos laços afectivos estabelecidos entre a menor e os avós, ora requerentes (…) ” Em face de todo o exposto, ponderado o superior interesse da menor F… decido julgar procedente a pretensão dos Requerentes e, em consequência, determino que: “1) A menor F… poderá estar com os avós maternos pelo menos uma vez por semana, podendo os avós ir busca-la ao Colégio, e permanecer com a mesma por período não inferior a uma hora e meia, podendo lanchar com ela, e entregando-a na casa dos progenitores até 19H00; 2) A menor F… poderá estar com os avós maternos ao sábado, ou ao domingo, devendo o dia concreto ser comunicado aos progenitores por sms, de quinze em quinze dias, em período compreendido entre as 10H00 e as 19H00, devendo os avós maternos ir buscar a menor a casa dos progenitores e entregando – a, no mesmo local no horário referido; 3) A menor F… poderá estar com os avós maternos pelo menos um dia das férias de Natal e um dia das férias da Páscoa, entre as 10H00 e as 19H00, devendo os avós maternos ir buscá-la e entregá-la na casa dos progenitores, avisando-os do dia em causa, com a antecedência mínima de 72 horas. 4) A menor F… poderá estar com os avós maternos pelo menos uma semana das férias de Verão, não necessariamente seguida, mas podendo pernoitar com os avós, devendo os avós maternos ir buscá-la e entrega-la na casa dos progenitores, avisando-os do(s) dia(s) em causa, com a antecedência mínima de 1 mês. 5) A menor F… poderá estar com os avós maternos no dia do seu aniversário, em horário a combinar com os progenitores, com a antecedência de 48 horas, desde que respeitados os seus horários escolares e de repouso. 6) A menor F… poderá estar com os avós maternos no dia do aniversário destes, pelo menos pelo período de três horas, desde que respeitados os seus horários escolares e de repouso. 7) Caso se tenha verificado algum afastamento afectivo da menor decorrente da interrupção das visitas em Julho de 2017, poderão os avós maternos diligenciar junto do colégio – o que expressamente se autoriza – pelo encaminhamento da menor para apoio psicológico, podendo os convívios ser transitoriamente mediados por pessoa a indicar pelos avós maternos. 8) Fixa-se aos progenitores, solidariamente, a sanção pecuniária compulsória de €200,00 (duzentos euros) a favor do Estado por cada vez que se verifique incumprimento do regime de visitas agora fixado” (cit.).

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

O direito dos avós tem sido legalmente reconhecido. O art.º 1887.º-A do Código Civil, decreta que: “…os pais não podem injustificadamente privar os filhos do convívio com os irmãos e ascendentes…” (cit.), o seu art.º 1589.º determina que: “…o direito de visita estende-se a qualquer dos avós, a critério do juiz, observados os interesses da criança ou do adolescente…” (cit.), e o art.º 888.º/VII faz constar que: “…a guarda e a educação dos filhos, regulado o direito de visita que, no interesse da criança ou do adolescente, pode, a critério do juiz, ser extensivo a cada um dos avós…” (cit.).

De seguida, partilhamos o testemunho real de um avô, João (nome fictício), sobre a angústia, a dor e o desespero de ser impedido há 4 anos do regular convívio com os seus netos: “sinto mágoa e tristeza por não estar com os meus netos”. Este avô luta na justiça pelo direito de conviver com os netos. Enquanto espera pelo apoio da Justiça, este avô angústia por ter medo de morrer sem voltar a ver os seus netos: “Sinto medo do tempo que passa e por estar a envelhecer sem que se aproxime uma resolução para esta situação”.  É tempo que sente a passar e lhe reforça o receio de ser esquecido pelos netos: “O tempo está a passar e os laços familiares estão a ser fortemente perturbados”. E a mágoa cresce por ver que a resposta do tribunal o seu pedido é tão demorada e diferente entre regiões: “O funcionamento da Justiça é muito lento, e desigual ao longo do país: alguns casos de pessoas conhecidas lá no Norte, já estão resolvidos há muito tempo”. A demora leva-o a questionar todo o sistema que o deveria apoiar, questionando-se mesmo se os profissionais que acompanham o seu processo, se estão a criar as condições para que devolvam aos netos o direito a voltar a ter os avós presentes no seu dia a dia: “Às vezes interrogo-me se os técnicos que acompanham estes casos estão empenhados no bem-estar das crianças, ou, um pouco à semelhança do que alguns advogados fazem, “empurram/alimentam” o conflito entre os pais destas crianças…”.

Noutro testemunho real, uma avó, Ana (nome fictício), partilha os momentos em que conviveu com a neta: “convivi com a minha neta de forma assídua, permanente, desde que ela nasceu”. Até que, devido a um processo de alienação promovido pelo pai, a avó esteve cinco anos sem ver a neta: “Deixei de a ver quando tinha quase 8 anos, após a separação dos pais. A menina ficou, provisoriamente, entregue ao progenitor”. Relembra como as saudades da neta eram dolorosas, sabendo que este pai tentava apagar a sua imagem: “Numa altura em que ele não tinha com quem a deixar, a menina pediu “então posso ficar com a avó?” De imediato, ouviu o progenitor aos gritos, enfurecido “não tens avó”, contado pela própria empregada dele”. Esta avó sente uma enorme angústia e sofrimento pela neta: “Deixei de dormir, aflita, porque a minha neta ia sofrer represálias por ter dito que ficava com a avó”. Esta é uma avó que gostaria que a justiça corrigisse o comportamento deste pai, castigando-o pelo mal que fez à sua neta: “O que estes progenitores fazem às crianças em função das suas raivas, dos seus ódios, deveria sim ser punido, com penas pesadas”. Um sentimento que nutre pela injustiça de viver na mesma cidade da sua neta e não poder conviver com ela, vê-la e ouvi-la ao vivo e abraçá-la: “Os avós, mesmo vivendo perto dos netos não têm direito a nada: visitas, telefonemas. Nada”.  Tem uma tristeza ainda maior por constar que existe uma justiça que não ouve os seus pedidos:  “Os tribunais não dão importância aos pedidos dos avós”. Ana é uma avó atormentada, desamparada, que sente que não consegue proteger o sofrimento da sua neta: “Mais do que o meu sofrimento, doía-me o sofrimento da minha menina, eu não conseguia aliviar, parar”.

Outra avó, Maria, testemunha que luta na justiça pelo direito de conviver com os netos, após muitos anos de ter sido impedida do regular convívio com os seus netos: “Sinto uma imensa tristeza e angústia pela impossibilidade de estar com os meus netos regularmente”, nomeadamente, em momentos especiais: “Sinto a falta deles, particularmente em momentos como o Natal e Páscoa, Aniversários, Férias, etc.”. Maria lamenta que incompreensivelmente o conflito entre os pais se tenha estendido à família alargada: “É muito triste que os meus netos não possam conviver com os avós, tios e primos, por culpa de um problema entre a mãe e o pai deles” e a injustiça de, em virtude disso nem a realização de um telefonema lhe ser permitido, para ouvir os seus netos:  “e que nem sequer possam fazer um telefonema ou videochamada uma vez por semana”. Maria teme que a resolução desta situação seja mais difícil do que o era há uns anos. Recorda que também ela viveu o divórcio dos seus pais, mas que nunca foi afastada da sua família alargada, paterna e materna: “Há 40 anos os pais separaram-se e não houve qualquer dificuldade de entendimento no que diz respeito a preservar os laços familiares entre irmãos, com a mãe e o pai, e com os demais familiares. Estaremos perante uma sociedade mais egoísta?”.

É preciso proteger as crianças e os jovens dos conflitos parentais no processo de divórcio ou separação, porque entre outras consequências pode conduzir a um afastamento ou corte emocional e físico com a família alargada. A relação entre os netos e os avós é essencial para harmonia da família e do desenvolvimento dos filhos. Por isso, é fundamental fomentar a saudável relação dos filhos com a família extensa, particularmente com os avós, ao longo de toda a vida, sem interregnos.