Imaginem que estão numa associação, organização, clube, coletividade. Estão até na direção dessa organização. Querem o melhor para a vossa organização, e como tal, procuram obter financiamento para responder às necessidades da associação. Sendo que parte, ou uma fatia grande, desse financiamento é obtido pelos fundos camarários. Tudo certo.

Suponham agora que estão num partido político, que não é da cor do partido camarário e que pretendem conhecer melhor os problemas das associações e das organizações. Isto para apresentar um programa político autárquico que responda aos munícipes. Como vão fazer? Provavelmente tentar reunir com essas organizações… Parece simples, mas não é.

Meu caro leitor, se não for do partido certo, a reunião não chega a acontecer. Ou é eternamente adiada, “não tem agenda” ou simplesmente recusam reunir com o partido. Porquê? O simples receio de existirem “retaliações” pelo executivo chega para a reunião não existir – chamemos-lhe censura camuflada. E entende-se, em parte, as organizações. Muitas vezes aquele financiamento é alicerce para a gestão da organização. Quem quer correr riscos de perder a bênção do executivo por falar com um outro partido?

Todos sabemos como funciona o esquema destas organizações que recebem fundos da câmara. Alguém da direção, normalmente o tesoureiro, vai todos os anos preencher a burocracia para garantir mais um ano de sobrevivência daquela coletividade. Não terá problemas em referir que tudo está bem desde que isso mantenha os fundos na sua associação. O beija-mão. A câmara não terá nenhuma hesitação em entregar esse dinheiro desde que a coletividade não confronte o trabalho do executivo. Infelizmente é assim que as coisas estão.

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O absurdo disto não são as coletividades, mas sim os poderes autárquicos. O simples receio de retaliação é só por si assustador, mais ainda se ela existir. Quem nunca ouviu falar de uma organização que tem receio de falar com a comunicação social por causa das consequências que isso poderá ter? E eu pergunto: as autarquias estão satisfeitas com esta visão que se criou do exercício do seu poder? É assim que se presta serviço público ao país?

Digam-me se isto faz sentido: idealizem que sou do executivo camarário. Quero o melhor para os da minha terra. E vou vingar uma coletividade porque partilhou as suas preocupações à comunicação social ou a um partido político? Que anuência é esta? Quero ou não quero o melhor para o meu município? Quero ou não quero ajudar as pessoas e associações que precisam de uma resposta da minha parte? É medonho pensar que a lógica não é esta.

Que liberdade é esta? Num país onde existe receio de uma coletividade apresentar os seus problemas a um partido político ainda é uma democracia? Quando é que deixamos de chamar democracia a isto? Ou fingimos que são “situações pontuais”? Isto não é pontual. É a atualidade.

Um país amordaçado, que finge não estar. Sim existem formas de dar a volta e conhecer os problemas dessas coletividades, mas é alarmante que se tenha de escavar fundo, quando uma reunião com a direção bastava.

Enquanto não for claro que os partidos políticos têm todos o mesmo objetivo – melhorar a vida de todas as pessoas – vai ser difícil acreditar neste sistema.

Lei da rolha é um eufemismo. Censura.