Estamos a menos de um ano das novas eleições autárquicas em Portugal e perto de celebrar 50 anos das primeiras eleições autárquicas democráticas, realizadas a 12 de dezembro de 1976. Este marco histórico não é apenas um motivo de comemoração, mas também um momento de reflexão sobre os desafios que enfrentamos no poder local e as oportunidades que as eleições autárquicas de 2025 trazem para o futuro.

Em 1976, Portugal contava com 304 municípios e mais de 4.000 freguesias. Hoje, temos 308 municípios e, após a reorganização administrativa conhecida como “Lei Relvas”, implementada em 2013, o número de freguesias foi reduzido para 3.091. No entanto, prevê-se uma reversão parcial desta reorganização em breve. As freguesias, criadas pela reforma de Mouzinho da Silveira em 1836, que transformou as antigas paróquias em freguesias, continuam a ser uma singularidade europeia, refletindo o poder político mais próximo dos cidadãos.

Apesar do seu potencial, o poder local nem sempre cumpriu o papel de motor de desenvolvimento e redução das assimetrias regionais. Um centralismo persistente, aliado a tentativas falhadas de descentralização e regionalização, como a rejeição da regionalização em 1998, levou a um modelo onde as responsabilidades foram transferidas para os municípios sem o devido apoio financeiro. Muitas câmaras municipais, que reivindicam mais autonomia, também falham em descentralizar competências para as juntas de freguesia, que muitas vezes são reduzidas a funções administrativas limitadas.

As disparidades são particularmente evidentes fora dos grandes centros urbanos, onde a distância das sedes de concelho e a falta de serviços e transportes públicos agravam as desigualdades regionais. Além disso, o êxodo rural e a migração para o litoral ou o estrangeiro têm esvaziado o interior do país, intensificando os desafios para o poder local.

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É essencial que a política local adote uma abordagem mais inovadora e próxima, com foco na melhoria da qualidade de vida das populações. Os representantes locais não podem limitar-se a atuar apenas em períodos eleitorais, sendo necessário um compromisso contínuo e concreto com as comunidades que representam.

Boas práticas já existem e devem ser promovidas. Em Santa Maria da Feira, por exemplo, desde 2022, várias forças políticas realizam debates interpartidários a cada quatro meses em diferentes freguesias do concelho, abordando temáticas relevantes e aproximando os cidadãos da política. Este modelo de participação ativa deve ser replicado noutros concelhos e freguesias pelo país fora.

Reforçar o papel das autarquias como o nível mais próximo da governação exige a valorização da participação cidadã e a colaboração com associações empresariais, culturais e estudantis. Estas parcerias são cruciais para transformar as autarquias em motores de desenvolvimento local, promovendo soluções inovadoras que não dependam exclusivamente de diretrizes superiores do governo central.

A educação para a cidadania também desempenha um papel vital. Programas que envolvam crianças e jovens em projetos comunitários podem incentivar a responsabilidade social e a participação ativa. Iniciativas como melhorias das práticas ambientais, aproximação as escolas às empresas, convivência intergeracional e combate à solidão são fundamentais para construir uma sociedade mais coesa e solidária.

Em 2026, ao celebrarmos os 50 anos das primeiras eleições autárquicas democráticas, devemos ter avançado significativamente rumo a um poder local mais eficaz, inclusivo e próximo dos cidadãos. As eleições de 2025 podem e devem marcar o início deste novo ciclo, com políticas locais verdadeiramente centradas nas necessidades das populações e onde os cidadãos e forças vivas de cada terra, seja ela município ou freguesia tenham uma voz mais ativa. Melhor poder local significa um melhor Portugal. Que este seja o compromisso de todos os agentes políticos e da sociedade civil nos próximos anos.