Tudo se resume a uma palavra: sonho. Muitos não entenderão esta persistência, por vezes também não a entendo, mas o sonho, tal como escreveu um dia António Gedeão, é um bichinho álacre e sedento e como tal não nos deixa desistir.

Isto para falar da manifestação de professores do dia 11 de fevereiro, muito se disse, muito se comentou, mas como vejo sempre o lado mais poético da vida, o que vi foi uma união que há muito não se via. No entanto, não sou ingénua, certamente cada um dos milhares de professores que se juntaram do Marquês ao Terreiro do Paço estava ali por motivos individuais; uns pelos 6 anos, 6 meses e 23 dias, outros pelo fim das quotas, outros porque querem estabilidade e a tão ambicionada vinculação. Mas, algo mais forte nos uniu também.

Terá sido o sonho? Creio que cada um de nós, em algum momento, pelo menos, sonhou que teria uma profissão digna. Por isso, no passado sábado, gritámos tanto a palavra respeito. E o ato de respeitar quem incentiva a sonhar tem ficado cada vez mais esquecido ao longo do tempo, quer pelos sucessivos governos, quer por alguns alunos e encarregados de educação. A partir de que momento é que ser professor passou a ser motivo de vergonha? Antigamente, quando os adultos faziam às crianças a típica pergunta “O que queres ser quando fores grande?”, ninguém ficava espantado se a resposta fosse “professor”. Hoje em dia, ouve-se frequentemente a frase: “tudo menos professor!”.

Por isso, foi surpreendente para mim ver que no passado dia 11 muitas pessoas nos apoiavam nos passeios e nos aplaudiam enquanto exigíamos respeito. Afinal nós também nos unimos em defesa da escola pública, e lutar pelo ensino é também lutar pelo futuro de um país. E aqui volto ao sonho, o sonho que me levou a escolher esta profissão tão cedo. O que sempre me moveu foi o sonho de contribuir para um mundo melhor. Não podemos salvar vidas como um médico, um bombeiro, um polícia ou até mesmo um cientista, mas podemos dar a nossa pequena contribuição através da educação. Creio que os 150 000 que marcharam até ao Terreiro do Paço já sentiram isso pelo menos uma vez.

É por isso que não consigo dizer ao António, aluno do nosso agrupamento, para não seguir o seu sonho. O António, que esteve sempre presente nos nossos protestos à porta da escola, surpreendeu-nos quando nos disse que queria ser professor de Português e Espanhol. Instintivamente dissemos que devia repensar a sua escolha. Mas será? Quis saber mais sobre o motivo da sua escolha, ele respondeu-me: “O que me fascina mais são os valores e os ensinamentos que os professores passam para os alunos, abrem a nossa mente para o mundo sobre muitos assuntos que em casa, muitas vezes, não são abordados.”.

Na terra dos sonhos (citando agora Jorge Palma), ninguém se espantaria com a escolha do António, nem seriam necessárias greves, e manifestações para existir algo tão fundamental como o respeito. Não seria normal canalizar milhares de milhões de euros para bancos, TAP, entre outras coisas, nem gastar cinco milhões num palco, enquanto ali mesmo ao lado há uma escola completamente degradada. Na terra dos sonhos, os governantes ouvem o seu povo, respeitam-no e não o ignoram, nem se limitam ao silêncio, uma lição que António Costa parece ainda não ter aprendido. Após ter lido as propostas do governo que serão levadas para a mesa de negociações chego à conclusão que eles até agora não entenderam nada do que dissemos, talvez precisem de voltar as bancos da escola, isto se ainda existir.

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