Bastaram 6 dias para que uma das maiores empresas do mundo, a FTX, uma corretora de criptoativos, passasse de uma avaliação de 32 bilhões de dólares americanos para declarar bancarrota.

Uma pesquisa muito rápida no nosso amigo Google mostra que grande parte dos artigos, sejam estes de opinião ou de investigação, apenas relatam os maus momentos da indústria dos ativos presentes na blockchain.

Por que é que, 14 anos após a implementação e lançamento do whitepaper, que deu origem a este fenómeno, continuamos a mandar abaixo todos os que decidem começar a construir dentro desta nova tecnologia?

Como um participante de longa data do mundo da tecnologia e um adepto relativamente recente de tecnologias baseadas em blockchain, ainda olho para esta tecnologia como algo promissor se lhe for permitido inovar sob as condições certas. Sob a orientação de uma instituição financeira regulamentada como a Goldman Sachs, por exemplo, as inovações de blockchain podem florescer.

Ao contrário de outras ondas de inovação, a tecnologia blockchain entrou e interrompeu setores altamente regulamentados. A invenção do e-mail não tornou nenhuma empresa de entrega de correio obsoleta, mas as tecnologias blockchain, como pagamentos peer-to-peer e a transformação de ativos “comuns” em ativos digitais, estão a mudar as grandes empresas, desde a forma como levantamos dinheiro até à forma como os investidores negociam ações. Obviamente que estas alterações têm implicações de longo alcance para a economia global.

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Os desenvolvedores de Blockchain que entendem essas implicações têm uma vantagem. Se alguém tentar derrubar a indústria que movimenta todo o capital no mundo e enfrentar o escrutínio de dezenas de reguladores, não basta inventar uma aplicação que eventualmente se torne popular ou levantar toneladas de dinheiro de capital de risco. É necessário saber como mitigar riscos e criar controlos adequados. É necessário criar relacionamentos fortes com o governo e partes interessadas nas políticas.

Agora, quando ouvimos falar de Blockchain, existe sempre uma palavra que a acompanha. Uma das blockchains que conhecemos, apesar de não ser uma ideia original, foi criada por uma pessoa (ou um grupo de pessoas), utilizando o nome (ou pseudónimo) Satoshi Nakamoto, em 2008, para servir como um livro-razão distribuído e público, para transações de Bitcoin (bitcoin, woohoo!). A bitcoin é um ativo, e isto é claramente do nosso interesse, se nos encontrarmos do lado especulativo ou do lado de investidor. Não deve nunca ser confundido como “blockchain”.  A implementação da bitcoin, como protocolo, dentro de uma blockchain, tornou-a a primeira moeda digital a resolver o double spending problem, sem a necessidade de uma autoridade confiável ou servidor central. O design do bitcoin inspirou outros aplicativos e blockchains que são legíveis pelo público e são amplamente utilizados por criptomoedas.

A blockchain também pode tornar o sistema financeiro mais acessível. Grandes intermediários, como bancos, governos, grandes empresas de social media, empresas de cartões de crédito, excluem milhares de milhões de pessoas da economia global, por exemplo, pessoas que não têm dinheiro suficiente para ter uma conta bancária. Estas instituições tornam as coisas mais lentas. Um e-mail pode levar um segundo para circular pelo mundo, mas dinheiro pode levar dias ou semanas para circular pelo sistema bancário de uma cidade. Estas instituições guardam os nossos dados e isso significa que não podemos monetizá-los ou usá-los para gerir melhor as nossas vidas. A nossa privacidade só sai prejudicada com estes atos. E o maior problema é que, no geral, eles apropriaram-se da generosidade da era digital de forma assimétrica: temos criação de riqueza, mas temos crescente desigualdade social. Com a tokenização podemos comprar frações de edifícios individuais e vendê-los sempre que quisermos, sem pedir permissões a qualquer tipo de intermediários. Os investimentos imobiliários não seriam reservados aos ricos.

A blockchain também consegue dar asas a projetos incríveis. Em 2013, um miúdo absolutamente brilhante, chamado Vitalik Buterin, teve uma ideia genial. Utilizando artigos escritos por um criptógrafo chamado Nick Szabo, ele pegou na ideia da Bitcoin e escreveu um artigo no qual explica como conseguiria utilizar a ideia inicial da Bitcoin e modificá-la de maneira a utilizar algo chamado “contratos inteligentes”. É aqui que a magia realmente acontece. Então, um contrato é basicamente um acordo com um objeto legal celebrado voluntariamente por duas ou mais partes, onde cada uma pretende criar uma ou mais obrigações legais entre elas. Um contrato inteligente diz que é isso é ótimo, mas que ainda é necessário ter terceiros envolvidos no processo de verificação, no processo de facilitação e no processo de aplicação. E se pudéssemos fazer isso algoritmicamente? E se pudéssemos pegar num contrato e escrever word-for-word num tipo de linguagem de programação especializada? É verdade que os contratos inteligentes são uma faca de dois gumes: como são automáticos, não podem ser alterados facilmente. Mas, se usados com responsabilidade, eles podem reduzir o risco de qualquer uma das partes não cumprir a sua parte do acordo e aumentar ainda mais a confiança no sistema financeiro.

De maneira a conseguir concretizar essa tal ideia, decidiu fazer uma angariação de fundos. Então, ele e a equipa publicaram um pequeno endereço de bitcoin, pediram para enviar transações e, ao longo de 42 dias, receberam 9011 transações. Conseguiram 18 milhões de dólares e o custo para arrecadar esse dinheiro foi de apenas 350 dólares em taxas de transação, uma taxa de 0,002%. Esta é a magia. Um “puto” que abandonou a faculdade e vive no Canadá teve a oportunidade de escrever um whitepaper que reuniu uma equipa em quatro continentes diferentes. Em poucos meses, arrecadou mais de 18 milhões de dólares para obter os recursos de que precisava para fazer algo e isto, hoje, está acessível a todos. Ninguém tem o poder de controlar.

A vaga de “bad press” das últimas semanas não nos deve vir distrair da oportunidade que temos em mãos. Investidores, grandes e pequenos, só têm a ganhar com as inovações da blockchain, que cada vez mais são guiadas por instituições estabelecidas e experientes.