Sabemos que o ecossistema empreendedor português é bastante jovem, principalmente quando o comparamos com outros ecossistemas como Londres, Nova Iorque ou até Silicon Valley – que já existem há muito mais tempo e, por consequência, estão mais desenvolvidos. O facto de o ecossistema nacional ser recente faz com que não tenha produzido muitos serial entrepreneurs (fundadores que já tiveram sucesso pelo menos uma vez e lançaram já a segunda, terceira ou quarta startup), não tendo chegado a uma fase em que estes fundadores de sucesso fazem o que chamamos de “give back”, ou seja, ajudarem eles próprios o ecossistema a crescer.

Em Portugal, não existe ainda, em larga escala, um mindset ligado ao empreendedorismo e à inovação. Aliás, é isso que explica, por exemplo, que, para além da Web Summit, não existam muitos eventos do género no país. Embora existam unicórnios e fundadores de sucesso, a verdade é que esta questão não é  assim tão transversal na nossa cultura – até comparativamente com o que acontece noutros ecossistemas.

Podemos considerar que o ecossistema português tem sido uma prioridade governamental e isso é, sem dúvida, positivo. A questão é que boa parte das aceleradoras, incubadoras e VCs (venture capital) estão muito dependentes do poder público, o que significa que, se este apoio deixar de existir, o ecossistema poderá perder igualmente força.

Dos mais diversos desafios enfrentados pelos empreendedores no nosso país, o primeiro de todos passa pela burocracia associada ao processo de criar uma empresa. Caso já exista um negócio consistente, a falta de investimento e de recursos disponíveis em Portugal passa a ser o grande obstáculo, fazendo com que muitas startups “morram” demasiado cedo. Outros desafios passam pela ilusão da existência desses mesmos recursos, pelos atrasos brutais na atribuição de apoios e pela falta de incentivos relevantes (como incentivo à internacionalização ou à pesquisa & desenvolvimento). Por fim, é relativamente fácil entrar num programa de aceleração, por exemplo, mas, numa fase posterior, obter apoio no dia a dia e perceber como desbloquear o próximo estágio de crescimento constitui-se como um desafio.

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Existem também, claro, oportunidades que se apresentam aos empreendedores em Portugal. A principal, na minha perspetiva, pode parecer contraditória porque se trata, ao mesmo tempo, de um desafio: o facto de se tratar de um ecossistema muito pequeno. Isto faz, na verdade, com que seja relativamente fácil chegar a outras empresas ou ao Governo. É por isso que Portugal é um excelente país para fazer proof of concepts, MVPs (versões de teste), e criar os primeiros modelos de negócio, para depois escalar.

No nosso país, também é relativamente fácil encontrar o talento certo, considerando a quantidade e variedade de talento tecnológico. Para além disso, somos muito fortes em setores como Web3, indústrias do mar e sustentabilidade, que se apresentam como grandes oportunidades estratégicas.

Para que todas estas oportunidades possam ser aproveitadas, e para que os desafios possam ser mitigados, existem vários caminhos a seguir. Em primeiro lugar, seria importante que o Governo conseguisse operacionalizar devidamente todos os programas, para garantir que os incentivos sejam realmente aplicados. Promover o acesso dos fundadores a VCs a nível global (ao invés de os tentar trazer para cá) também poderia ser uma forma de aumentar o investimento em Portugal. Garantir a existência de uma estratégia de empreendedorismo, de fundadores para fundadores, poderia ser o caminho para assegurar alinhamento. Num mundo ideal, cada player entenderia o seu papel dentro de uma estratégia nacional, com a criação de uma comunidade forte – quase imune às alterações políticas -, e os role models começariam a surgir cada vez mais, fomentando a cultura de “give back”.

Não há dúvidas de que o ecossistema português tem evoluído imenso nos últimos tempos e eu tenho ótimas perspetivas em relação ao seu futuro. Sendo um ecossistema muito recente, há muito que ainda pode ser feito, existindo efetivamente essa vontade de fazer acontecer. É possível observar que tanto o Governo como as próprias cidades, através do poder local, estão a desenvolver estratégias e hubs de inovação, já havendo grandes casos de sucesso. Mas ainda temos um longo caminho a percorrer, para que o nosso boom de inovação não se resuma ao período da Web Summit.