Uma vez percebido que o “Estado social local” está principalmente nos Transportes e na Habitação, trataremos de apurar como se concretiza em Lisboa e a medida da sua importância no país. Lisboa, com 550 mil habitantes, é o maior concelho português. Com 1.300 milhões de euros, tem de longe o orçamento mais alto, em valores absolutos e relativos (a câmara do Porto, que vem logo a seguir, governa 230 mil habitantes com um orçamento de 400 milhões). Mas a questão ultrapassa os limites do concelho e passa para a Área Metropolitana, na qual Lisboa exerce uma fortíssima centralidade. Lembremos que dois em cada três empregos dentro da cidade são ocupados por pessoas que vivem fora, noutros concelhos da Área Metropolitana. Todos os dias da semana (de segunda a sexta-feira) o número de carros na cidade triplica, porque as pessoas entram em Lisboa de manhã, para trabalhar, e saem ao final do dia, para dormir; estas pessoas não conseguem encontrar um emprego e uma casa para viver no mesmo concelho. Na Área Metropolitana de Lisboa vivem quase três milhões de habitantes. Quer isto dizer que perto de 30% da população nacional é afectada directa ou indirectamente pelas políticas de Transportes e de Habitação decididas pelo município de Lisboa. Não farei a descrição exaustiva destas políticas; tentarei explicá-las através dos traços mais definidores. Há motivos fortes para causarem à esquerda tanto desconforto.

Em matéria de Transportes, já se disse que a Câmara de Lisboa paga o passe aos maiores de 65 anos e aos menores de 23. Supõe-se que os mais velhos, se vão de Metro ou de autocarro, é porque não podem ir de outra maneira; e um passe “gratuito” talvez os faça sair de casa, em vez de ficar, tentados pela inércia e pela solidão. Quanto à miudagem, a ideia é tentar criar neles o hábito de usar transportes públicos. Mas há mais a dizer sobre a actual política de Transportes em Lisboa. Acabou a guerra aberta contra os carros particulares. Um aspecto importantíssimo, já que as pessoas têm carro e andam de carro, e a guerra que durava não combatia obviamente “os carros”; combatia estas pessoas. Mas entremos na matéria e vejamos de que tratam afinal as novas políticas. Tratam de concluir os “parques Navegante”, alguns já inaugurados; irão somar quase dois mil lugares de estacionamento, incluídos no passe Navegante e “gratuitos” durante um certo período, para que as pessoas possam ali deixar o carro enquanto se movimentam usando a rede pública de transportes dentro da cidade. São sete parques: Pontinha (387 lugares), Azinhaga da Cidade (165), Ameixoeira (489), Telheiras Poente (155), Telheiras Nascente (106), Avenida de Pádua (248), e Colégio Militar (415). Tratam de aumentar, tanto em número como em área, o estacionamento exclusivo para residentes. Tratam de contrariar a indecorosa cultura de “caça à multa” da EMEL, regressando à ideia civilizada de que as multas não são nem podem ser vistas como uma fonte de rendimento. Os “bloqueadores” (jargão técnico para as geringonças amarelas que eles amarram às rodas dos carros) em zonas tarifadas já reduziram quase 90%; e as reclamações contra a EMEL reduziram 30%. Mas a ideia principal que orienta a política do vereador é, como ele próprio diz, “desafiar dogmas”. Que dogmas são esses? Um exemplo: “É preciso construir sempre cada vez mais ciclovias”; não, responde Filipe Anacoreta Correia, às vezes é preciso remover, como ele fez na Avenida de Berna. Outro exemplo: “É preciso baixar a velocidade 10 km/h na cidade inteira”; não, às vezes é preciso aumentar, como ele está a tentar fazer na Avenida Lusíada e na Avenida Padre Cruz, e pretende fazer noutras avenidas. Só ainda não aumentou porque o processo não depende inteiramente da Câmara, precisa da concordância da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária.

Em matéria de Habitação: quando os nossos queridos socialistas perderam as eleições em Lisboa deixaram duas mil casas vazias ou devolutas: 1.600 casas da Gebalis, mais cerca de 400 em património disperso pertencente ao município. Esta foi a sintomática herança de 14 anos seguidos de governação do PS aliado à extrema-esquerda. Suspeito que, ainda assim, o país da “inteligência” e do alegado “debate” não terá conseguido meter na cabeça que a esquerda não vai resolver nunca o problema da Habitação, em parte porque não lhe interessa, e em parte também porque o fanatismo em que vive enredada não lhe permite compreender coisa alguma. Facto é que, desde que tomou posse, a nova governação de Lisboa já reabilitou 1.000 dessas casas; e entregou as chaves delas a mais de 200 famílias. Além disso, o orçamento da Câmara destinou 250 milhões de euros para a melhoria e aumento do número de casas, com a intenção de destinar património municipal para ser usado ou convertido em habitação. No capítulo das ajudas à classe média, Lisboa tem os programas de “renda acessível” e “subsídio às rendas”. No primeiro caso, as casas são atribuídas por sorteio; no segundo caso, o programa é universal. O critério estabelece limites de rendimento: as pessoas têm de ganhar pelo menos o ordenado mínimo; e no máximo 35 mil euros por ano (se for uma família mono-parental), ou 45 mil (no caso de um casal); mais cinco mil euros por cada criança ou dependente. Cumprindo estas regras, a Câmara paga 1/3 do valor da renda a quem tenha despesas com a renda superiores a 1/3 do rendimento. Ao dia de hoje, a Câmara ajuda com este programa mais de 800 famílias. Também na Habitação, a ideia da vereadora Filipa Roseta é ter políticas diversificadas, com a vantagem de as ir ajustando e corrigindo erros. O contrário do fanatismo, que aplica obsessivamente a força toda numa única política.

Margaret Thatcher reconhecia, desesperada, que os políticos de esquerda são todos fanáticos. Também nisso ela tinha razão. E como acabamos de ver, em matéria de Transportes e de Habitação, que é o “Estado social local” em Lisboa, a orientação mais distintiva é rejeitar o fanatismo. Foi disso que o presidente Carlos Moedas, com os vereadores Filipe Anacoreta Correia e Filipa Roseta, nos livraram.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR