A história da Espada de Dâmocles é uma das mais poderosas alegorias da Antiguidade. Conta a lenda que Dâmocles, um cortesão na corte de Dionísio II, tirano de Siracusa, invejava o poder e a riqueza do seu soberano.

Dionísio, ao perceber o desejo de Dâmocles, concedeu-lhe a oportunidade de experimentar por um dia o que era ser rei. Sentado no trono, com uma coroa de ouro na cabeça e cercado por luxo e adulação, Dâmocles inicialmente sentiu-se exultante.

No entanto, ao olhar para cima, Dâmocles percebeu que uma espada afiada pendia sobre sua cabeça, presa por um único fio de crina de cavalo. Era essa espada pendente que Dionísio via todos os dias, na ameaça constante de algo ou alguém cortar o fio que a segurava. Assim, o que parecia ser um sonho dourado transformou-se, rapidamente, num pesadelo de ansiedade e medo.

Ora, num contexto de grande incerteza no mundo, na Europa e, consequentemente, em Portugal, não é sob a espada de Dâmocles que nos encontramos todos? Neste período de negociação do Orçamento do Estado para 2025, com a atual composição parlamentar e a instabilidade a ela associada, como poderemos evitar que a espada ceife, uma vez mais, o futuro do país?

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Acredito que a resposta a esta complexa situação em que nos encontramos é a moderação. Só com responsabilidade, seriedade e verdadeiro sentido de Estado – da parte do governo e da oposição –  é que conseguiremos fazer Portugal avançar e não condenar o país a um estado de letargia permanente.

Não quero com isto dizer que o governo terá de deixar de executar o programa que foi sufragado maioritariamente pelos eleitores portugueses, nem que a oposição deva ter um papel de mero figurante parlamentar, sem nada contribuir para a governabilidade do país. É precisamente o contrário aquilo que aqui se pretende.

A aprovação do Orçamento do Estado é um pilar fundamental, não só para assegurar o funcionamento normal das instituições públicas, mas também para implementar políticas que possam responder eficazmente aos desafios que o país enfrenta.

Quando um governo, ainda que minoritário, apresenta um orçamento que inclui medidas essenciais para a continuidade e melhoria dos serviços públicos, para a promoção do crescimento económico e para o reforço da proteção social, tem a oposição o dever de considerar seriamente o impacto de uma eventual rejeição.

Rejeitar um orçamento por motivos puramente eleitoralistas ou de chicana política pode representar uma enorme irresponsabilidade, especialmente num período onde se exige que a tolerância, a convergência e a cooperação prevaleçam face à intransigência, ao divisionismo e ao populismo.

A instabilidade política pode levar à paralisia governativa, afetando negativamente a confiança dos investidores e das instituições, a execução de programas económicos e sociais e a própria imagem de Portugal no exterior.

Por outro lado, aqueles que procurarem pontos de convergência no apoio ao orçamento, ainda que afirmando as insuficiências do mesmo, demonstram responsabilidade política, maturidade democrática e compromisso com os interesses do país.

Reforço a ideia de que um orçamento aprovado com o apoio da oposição não significa, de forma alguma, que esta terá de abdicar dos seus valores ou aceitar cegamente as políticas do governo em exercício.  Pelo contrário, reflete a capacidade de priorizar o bem comum sobre os interesses partidários.

A oposição tem, naturalmente, o direito e o dever de continuar a fiscalizar o governo, propor alternativas e lutar por políticas públicas diferentes, mas deve fazê-lo no quadro de um orçamento aprovado, que assegure a continuidade governativa e a estabilidade de que hoje o país precisa.

Assim como Dâmocles aprendeu que a posição de poder está sempre sob a ameaça de forças destrutivas, os partidos moderados da oposição devem reconhecer que o seu papel na aprovação do orçamento é crucial para evitar que a “espada” da instabilidade caia sobre o país. Apoiar o orçamento, portanto, não é um sinal de fraqueza, mas uma demonstração de maturidade e de compromisso com os portugueses.