A chegada da pandemia provocada pelo SARS-CoV-2 é o acontecimento de uma geração. Perante a magnitude, a rapidez e a incerteza com que tudo está a acontecer, é normal sentir impotência ou a necessidade de se preparar o melhor possível.

No meio de todos estes acontecimentos, têm surgido várias recomendações para o “reforço do sistema imunitário”, no sentido de prepararmos o nosso organismo para combater o vírus, caso sejamos um dos infetados. A maioria dessas recomendações é inútil. É isso que venho esclarecer.

As medidas mais eficazes para reforçar o sistema imunitário são medidas baratas e ao alcance de todos.

Deixar de fumar

O mais importante a fazer é deixar de fumar. O tabaco aumenta enormemente a probabilidade de infeções respiratórias, tanto nos adultos (1,2,3, 4) como nas crianças (1, 2, 3, 4, 5). Não só têm maior probabilidade de infeção, como o prognóstico é pior para quem é fumador (1, 2, 3, 4).

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A chegada da SARS-CoV2 é mais uma, entre centenas de razões, para deixar de fumar.

Fazer exercício físico

A prática de atividade física regular parece ajudar a diminuir a probabilidade de infeções e a melhorar o prognóstico quando temos infeções respiratórias (1, 2). No entanto, não é possível tirar conclusões mais assertivas porque a evidência existente é de fraca qualidade (1, 2)

Existe a dúvida na comunidade científica se a atividade física intensa não levará ao aumento do risco de infeções. Apesar de a dúvida persistir, os últimos dados apontam para que, mesmo as pessoas que exercem atividade física de alta intensidade, o risco de terem infeções é menor que na população sedentária.

Perder peso

A obesidade parece ser fator de risco importante para o aumento do risco de infeções, tanto nas crianças (1) como nos adultos (1,2,3,4). Manter um bom peso não é apenas uma questão de estética, é uma questão de saúde.

Ter hábitos de sono saudáveis

A falta de sono parece aumentar a suscetibilidade a doenças infeciosas (1, 2), assim como o trabalho por turnos (eventualmente associado à dirupção dos hábitos de sono). É preciso mais investigação antes de conseguirmos ter conclusões mais definitivas, mas melhorar os hábitos de sono é uma medida barata e que tem outras vantagens a curto e longo prazo.

E o que NÃO fazer para reforçar o sistema imunitário?

A maioria das publicações nas redes sociais que promovem falsidades tendem a aconselhar a ingestão de uma série de produtos para “reforço do sistema imunitário”. Não existe, até à data, qualquer suplemento que melhore o funcionamento do sistema imunitário.

Vitamina C.  O mito da Vitamina C e os seus efeitos no tratamento da gripe e constipação já é perpetuado desde o tempo de Linus Pauling. Não há qualquer evidência que a Vitamina C previna a constipação comum a não ser, eventualmente, em pessoas que fazem muita atividade física. Existe a possibilidade que a Vitamina C consiga reduzir o tempo de uma constipação em 8-14%. Ou seja, numa constipação que dura 7 dias, passaria a durar 6.3 dias. Não há evidência que a Vitamina C previna a pneumonia, a gripe e muito menos o Covid-19. Aliás, a toma de antioxidantes no geral, como Vitamina C, E, A, Beta-Caroteno e Selénio) parecem estar associadas a maior mortalidade geral (1, 2), sem qualquer benefício comprovado, exceto em circunstâncias muito específicas.

Vitamina D. Devido a uma meta-análise publicada em 2017, a Vitamina D saltou para a ribalta no que diz respeito à diminuição do risco de infeções respiratórias com a toma desta vitamina. O problema é que esta meta-análise, que supostamente era de alta qualidade, tem imensos problemas metodológicos. Supondo que a meta-análise era boa, verificou-se apenas uma redução mínima no número absoluto de doenças infeciosas e essa vantagem só estava presente em pessoas com menos de 10 ng/mL de vitamina D no sangue. Ou seja, com níveis muito baixos de vitamina D. Mas a meta-análise não era boa, com métodos de inclusão e exclusão de estudos para análise pouco claros e com inclusão de estudos duvidosos realizados no Irão. Quando a meta-análise era limitada a estudos com amostras de grande dimensão e de melhor qualidade, não foi encontrado qualquer efeito positivo da suplementação com vitamina D. Portanto, a suplementação com Vitamina D dificilmente irá ajudar.

Ervas Chinesas. O Governo Chinês tem aproveitado a pandemia para, de forma incompreensiva, continuar a fazer propaganda à inutilidade que representa a Medicina Tradicional Chinesa. Fez o mesmo em 2003, manifestando a eficácia da Medicina Tradicional Chinesa no tratamento da SARS. Concluiu-se, dez anos depois, que as ervas promovidas eram inúteis. Atualmente, assistimos inclusive à publicação de estudos fraudulentos na tentativa de validar a utilidade das ervas no tratamento desta infeção. A prova que a China continua a colocar os seus interesses económicos à frente da verdade científica. E foi também graças à ganância Chinesa que surgiu o SARS-CoV2.

Conclusão

Durante os próximos tempos assistiremos a muito ruído e desinformação sobre o SARS-CoV2 e a doença causada por este vírus, o Covid-19. Evitar a partilha de informação falsa e procurar informação fidedigna em sites institucionais é também uma medida de higiene básica e salva vidas.

Se alguém disser que consegue “reforçar o sistema imune” recorrendo a suplementos ou outras medidas pouco ortodoxas, verifique se tais afirmações têm alguma base factual. Assuma que não tem até provas em contrário.