Quando o Principezinho conheceu o homem vaidoso, talvez lhe tenha dito que o essencial da melhor maquilhagem é invisível aos olhos.

E também o é, no geral, o essencial da propriedade intelectual. Por onde quer que andemos, física ou virtualmente, somos acompanhados por ela, ainda que não esteja sempre visível, nem se manifeste.

É que a propriedade intelectual quer-se, tipicamente, recatada: as empresas devem garantir que a têm e em boas condições e uma gestão preventiva da propriedade intelectual é essencial ao sucesso dos negócios, mas o ideal é não precisarem de se valer dela. Puxar o trunfo do direito da propriedade intelectual significa, não raras vezes, que alguém a quer copiar.

Mas os galardões conferidos por estes direitos não são apenas reativos ou litigiosos, e há uma indústria que lhe tem dado vários usos: a cosmética. Os desafios que o ramo tem enfrentado e a que tem dado resposta com a propriedade intelectual podem ser arrumados em 3 prateleiras: na inovação científica, na sustentabilidade ecológica e na sustentabilidade financeira.

Os produtos ditos de beleza são apetecíveis por vários motivos. Se nos ficarmos pelos números, o mercado da cosmética tem um valor mundial estimado de centenas de milhares de milhões de dólares e tem conhecido um crescimento ininterrupto e considerável nos últimos anos. O comércio eletrónico é, de longe, o que mais cresce.

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Quando a experiência direta do consumidor é valorizada no ato de compra, em particular quanto à qualidade do produto, a venda online tenderia a ser mais difícil. Uma forma de contornar a impossibilidade de testar presencialmente o produto foi encontrada na promoção, junto do consumidor, da inovação científica através da propriedade intelectual.

Ainda que as patentes cosméticas estejam longe de ser novidade (uma das primeiras que se conhece data de 1888, para um desodorizante), olhando para a primeira prateleira, o que vemos é que os artigos cosméticos têm procurado resultar de um interessante processo de investigação e desenvolvimento científicos, que leva ao melhoramento das fórmulas usadas (no produto final ou nos métodos de aplicação) e até mesmo à invenção de novas substâncias. Este laborioso e custoso trabalho procura ser recompensado com patentes, que permitem que o produto seja vendido sob essa chancela. Expressões como “FÓRMULA PATENTEADA” são cada vez mais visíveis nas embalagens cosméticas, o que conforta o consumidor final quanto às exclusividade e qualidade do produto.

Por outro lado, a indústria da cosmética tem estado na linha da frente da sustentabilidade ecológica das suas embalagens. É no ramo dos detergentes e da cosmética que mais se têm invocado as tecnologias dos bioplásticos (com a Europa e os Estados Unidos na linha da frente), demonstrando ao público uma atenção especial às preocupações de sustentabilidade ecológica. Assim, as empresas têm conseguido apresentar-se com marcas “verdes”, que incluem expressões como “orgânica”, “natural” ou “sustentável.

O programa de sustentabilidade da gigante L’Oréal, por exemplo, revela que, em 2022, 92% dos seus ingredientes de base biológica eram rastreáveis e provinham de fontes sustentáveis. É interessante ver também que uma larga porção das patentes pedidas anualmente por estas grandes empresas se dirige à sustentabilidade das suas embalagens.

As chamadas patentes verdes, no epicentro da investigação tecnológica enquadrada pelos objetivos de desenvolvimento sustentável da ONU, são um relevante acelerador empresarial, a muitos níveis.

Da última prateleira tiramos um desafio transversal a várias indústrias: o da sustentabilidade financeira. Inovar sai caro e proteger a inovação também. É absolutamente fundamental à indústria da beleza garantir que as suas patentes estão devidamente redigidas, traduzidas e validadas nos vários países em que o produto é vendido – e essa proteção é cara. Como forma de fomentar a investigação no espectro do tecido empresarial, o Estado criou incentivos como o Patent Box. Através deste sistema, é possível isentar de tributação uma parte muito relevante do rendimento auferido por via de contratos que tenham por objeto a cessão ou a utilização temporária de certos direitos de propriedade industrial.

Se não queremos ficar cativos da falta de estratégia, devemos ser responsáveis quanto à proteção da propriedade intelectual. Afinal, não é por acaso que tantas marcas foram registadas com base em desenhos do Saint Exupery…