Em 2015, o mundo assinou o Acordo de Paris, com o objetivo de tentar limitar o aumento da temperatura média do planeta a 1,5ºC. Passada quase uma década, estamos longe de uma trajetória que nos leve lá. De facto, atualmente, o cenário mais provável é o de um aumento da temperatura entre 2,5ºC e 3ºC (ver, por exemplo, o Global Carbon Tracker), com o Sul da Europa potencialmente a ultrapassar esses valores. Se for este o caso, teremos de adaptar a nossa sociedade para estas mudanças climáticas severas. Estamos a fazê-lo? Não! E quanto mais tarde começarmos essa adaptação, mais difícil ela será.

Ao longo dos últimos anos tem-se registado um aumento significativo do número e volume de investimentos com o intuito de minorar os impactos das mudanças climáticas. Segundo a Climate Policy Initiative, foram gastos em média cerca de 1,3 mil milhões de dólares durante 2021/2022, isto é, aproximadamente 1,5% do PIB mundial. Estes valores quase que duplicaram em dois anos, o que é bastante relevante e positivo, já que se estima que serão necessários cerca de 5% do PIB mundial em investimentos verdes em 2030 para atingirmos a neutralidade carbónica em 2050. Do investimento acima referido, 95% foi canalizado para investimentos de mitigação (redução de emissões de dióxido de carbono, por exemplo, nos transportes ou sistemas energéticos) e somente 5% foi destinado à adaptação (minoração dos potenciais efeitos negativos das mudanças climáticas, por exemplo através do uso mais eficiente de água). Esta distribuição do investimento compreende-se, mas consequentemente classifica a adaptação como o primo pobre dos investimentos climáticos. Com a perspetiva de alterações climáticas significativamente acima de 1,5ºC, é tempo de dedicar mais atenção à adaptação.

Os custos financeiros da adaptação às mudanças climáticas são diversos e fazem-se já sentir em várias frentes. É necessário adaptar as infraestruturas – existentes ou a construir – para que sejam mais resilientes a temperaturas altas, eventos meteorológicos mais extremos e frequentes ou ao aumento do nível médio das águas do mar. É necessário adaptar as práticas e tecnologias agrícolas para que tenhamos produções que usem significativamente menos água e suportem melhor períodos de extrema seca e calor. É necessário reforçar a capacidade dos sistemas de distribuição e uso de água e de defesa contra as inundações. É necessário reforçar a capacidade de resposta dos sistemas de saúde, sobretudo quando às alterações climáticas se junta o envelhecimento da população. Finalmente, é necessário proteger os ecossistemas e a biodiversidade, que garantem os serviços da natureza de que precisamos e que são a primeira linha de proteção contra as mudanças climáticas.

O título do último relatório da ONU nesta área – Adaptation Gap Report 2023 – é bastante claro acerca do ponto em que nos situamos: “Subfinanciado. Mal preparado”. Neste relatório é referida uma lacuna de cerca de 200 mil milhões de dólares de investimento em adaptação por ano, uma necessidade de investimento de cerca de pelo menos 10 vezes mais do que o esforço corrente. Um exemplo mais pontual pode ser dado pelo plano de adaptação para a cidade de Nova Iorque, orçamentado em 20 mil milhões de dólares!

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Como sabemos, as consequências das alterações climáticas fazem-se sentir de forma significativamente desigual em termos globais, com o Sul do planeta a ser significativamente mais penalizado do que o Norte. Os custos com a adaptação sofrem do mesmo problema – estima-se que estes poderão representar aproximadamente 3% do PIB para os países africanos, exacerbando os problemas económicos do continente. Para os estados espalhados pelas muitas ilhas oceânicas, os custos poderão ser significativamente maiores ou mesmo existenciais. Ainda assim, o financiamento internacional corrente é praticamente inexistente, algo que as Nações Unidas estão a tentar corrigir, por exemplo através de programas como o Adapt Now.

O investimento na adaptação tem duas grandes vantagens: primeiro, estima-se que haja pelo menos um rácio de um para cinco entre o custo de investimento na adaptação e os seus retornos, tanto em custos evitados. Adicionalmente, existem também externalidades positivas decorrentes deste tipo de investimentos, que aumentam significativamente a resiliência dos nossos sistemas naturais e sociais. Exemplos disso são a proteção da biodiversidade (a qual permite, entre outros afins, a regeneração dos ecossistemas nos quais a vida humana se enraíza), a melhoria na qualidade do ar e acesso a água limpa (beneficiando diretamente saúde pública), ou a criação de empregos nos setores de atividade mais afetos à adaptação (os chamados empregos verdes). Por todos estes motivos prevenir através da adaptação compensa!

Estudos publicados muito recentes sobre as mudanças climáticas e as necessidades de adaptação em Portugal (Ver Roteiro Nacional para a Adaptação 2100) são muito importantes para motivar uma discussão saudável sobre mudanças climáticas e adaptação no nosso país. Um dos resultados desse estudo, de acordo com cenários bastante plausíveis, aponta para aumentos de Temperatura Máxima em todo o interior de Portugal por volta dos 3,5ºC no último terço deste século. Estes aumentos são muito significativos e vão implicar alterações importantes na nossa sociedade e economia. Estamos prontos para Évora 3,5ºC?