Uma nova legislação aprovada em Novembro na Rússia coloca este país num novo nível de preparação para um dos dois novos cenários onde se realizarão as guerras do futuro: o Espaço e a Internet. Se no campo da guerra espacial a Rússia já tem um sofisticado e bem testado sistema de destruição de satélites agora no campo do ciberespaço prepara-se para assumir uma posição de vantagem sobre os países ocidentais.
Com efeito é de vantagem e não de paridade de que falamos quando sabemos que a Rússia tem a capacidade para se desconectar da Internet e que deve testar em Novembro essa capacidade. A ser bem sucedido este teste significará que este grande país euro-asiático será capaz de cortar a ligação do país com o resto do mundo sem que exista uma interrupção dos serviços normais que dependam de servidores instalados desse perímetro.
Esta iniciativa resulta de um Projecto de Lei apresentado ao Parlamento russo (Duma) e que determina o que é tecnicamente necessário para conseguir uma autonomia total da Internet russa em caso de uma emergência. O projecto tem a designação eufemística de “Programa Nacional de Economia Digital” e exige que as empresas que fornecem serviços de Internet na Federação Russa estejam preparadas para funcionarem de forma independente em caso de crise ou emergência internacional e “potencias estrangeiras” operem de forma a prejudicar o funcionamento da Internet na Rússia.
O principal ponto de falha que é visado nesta iniciativa russa é a dependência global do sistema raiz de resolução de nomes de endereços UP mais conhecido por “DNS”: sem este sistema não há Internet e, de facto, das 12 organizações que garantem o funcionamento destes servidores de raiz (root servers) nenhuma está sediada na Rússia assim, sendo a autonomia russa desta rede poderia passar pela sua substituição, a partir de uma cópia em constante atualização, para uma rede própria que fosse capaz de continuar a funcionar mesmo se e quando os acessos vindos da Rússia fossem eventualmente desligados. Paralelamente, os russos teriam que redireccionar nos seus routers algum tráfego por forma a que este conseguisse fluir unicamente dentro do seu território sem ter que sair e tornar a entrar do mesmo como acontece actualmente e de forma corrente. Algo de semelhante já existe hoje em funcionamento, embora se acredite que não tem este nível de autonomia mas de controlo e vigilância: a Internet chinesa: com efeito ao direccionar todo o tráfego para routers dentro do país que estão sob o seu controlo directo ou indirecto Moscovo garante a condição essencial para passar a vigiar todas as comunicações que entram, saem e fluem dentro do seu país.
Não há dúvidas de que a iniciativa russa se enquadra num panorama mais amplo de limitação e de vigilâncias às actividades “subversivas” dos seus cidadãos mas há também um componente — essencial — de preparação das fronteiras virtuais do país para um contexto de guerra cibernética, mais ou menos total, mais ou menos letal que a Rússia reconhece no processo como um dos principais campos de batalha dos conflitos militares do futuro a par do Mar, Ar, Terra, Espaço e, agora, Ciberespaço. Com a criação (e teste) desta grande firewall as autoridades russas poderão fechar os acessos a plataformas e redes sociais aos seus cidadãos mais críticas assim como o tráfego que sai e entra na Federação Russa permitindo ao país barrar de forma eficaz qualquer ameaça ou resposta cibernética a um ataque russo no exterior.
A questão fundamental que aqui se apresenta é a seguinte: se a Rússia — o país que está tão activo neste sector como a China — revela no campo das actividades cibernéticas uma capacidade difícil de igualar, a questão está em saber se não terá chegado também o tempo de os países da NATO e, em particular, Portugal começar também a preparar e a testar o perímetro das redes cibernéticas dos domínios .pt e a replicar o projecto russo — sem a componente da repressão às liberdades e direitos cívicos dos cidadãos.