Os hospitais geridos sob o regime de Parceria Público Privado são em média mais eficientes, mais eficazes e têm melhor qualidade clínica. Este é o resumo das conclusões da avaliação da Entidade Reguladora da Saúde que respondia à pergunta formulada pelo Governo quanto “aos aspectos positivos que as PPP´s trouxeram ao SNS e que desvantagens comparativas poderiam encerrar”.
O Governo encomendou um estudo de avaliação das Parcerias Público Privadas (PPP) na Saúde à Entidade Reguladora (ERS) da Saúde, tendo como objectivo identificar “o que de positivo trouxeram ao SNS, mas também que desvantagens comparativas encerram”. A ERS focou a sua avaliação em quatro vertentes: eficiência relativa, eficácia, qualidade clínica e custos de regulação.
As conclusões do estudo para cada um dos items referidos, são em síntese as seguintes:
- Eficiência relativa: a comparação dos hospitais em regime de gestão PPP face a um grupo homogéneo de hospitais comparáveis, de entre os hospitais gerais do SNS, revelam que “os hospitais PPP foram globalmente eficientes, com destaque para os resultados positivos, indicativos de eficiência relativa, dos hospitais de Braga e Cascais”.
- Eficácia: a análise da eficácia repartiu-se por quatro grupos de indicadores: internamento, cirurgias, primeira consulta hospitalar e cumprimento dos tempos máximos de resposta garantidos no acesso a primeiras consultas e cirurgias programadas. Os resultados são os seguintes: “da análise da eficácia em cirurgias resulta que a maioria dos hospitais em PPP tem uma taxa de resolutividade superior à média das taxas dos restantes hospitais públicos comparáveis”. Também resulta que “todos os hospitais PPP apresentam uma maior percentagem de cirurgias em ambulatório no total de cirurgias programadas”. Quanto à eficácia no internamento, apesar de de mais baixa, a percentagem com demora superior a 90 dias e a percentagem de reinternamento a 30 dias não varia significativamente face à média. No que se refere ao cumprimento dos tempos médios para cirurgia os hospitais PPP têm uma média globalmente superior à média dos restantes hospitais.
- Qualidade Clínica: Existe uma maior adesão dos hospitais PPP ao sistema de registo de qualidade (SINAS) com resultados “em média, favoráveis, quando comparados com os restantes hospitais públicos”. A excelência clinica foi registada com uma “estrela” em 100 % dos Hospitais PPP e em 75% dos restantes hospitais. Em outro indicador de grande importância, como a percentagem de cesarianas face ao numero de partos normais, distinguiu os Hospitais PPP de Vila Franca de Xira e de Loures, liderando o respectivo grupo de comparação.
- Custos de Regulação: a conclusão é de que a “a indisponibilidade de indicadores de outros hospitais públicos, impossibilitam a comparabilidade dos hospitais PPP, e em alguns casos impede a avaliação do desempenho”. Refira-se que o rigor contratual a que estão sujeitos os hospitais PPP, através da apresentação mensal de uma enorme bateria de indicadores de desempenho, não é seguida pelos restantes hospitais do universo público, o que dificulta a comparação.
O que se pretende com esta avaliação?
A avaliação pedida tem como propósito dotar o Governo de informação suficiente para tomar decisões quanto à renovação dos contratos das PPP’s existentes, uma vez que se encontra contratualmente disposto que a não renovação dos contratos deve ser precedida de aviso prévio de 2 anos. Até final de 2016 será por isso necessário decidir se se mantém ou não o regime PPP para o primeiro contrato celebrado, o Hospital de Cascais, que completa 10 anos em 2018. Os hospitais de Loures (2012) e Vila Franca de Xira (2013) não tendo ainda suficiente curva de experiência face aos restantes, responderam bem à avaliação produzida.
O tema das PPP’s tem estado sobre grande observação, nos últimos anos, face ao peso que as PPP’s representam no Orçamento do Estado e na dívida pública portuguesa. Curiosamente, tendo sido o Partido Socialista o maior mentor quanto às PPP’s das estradas e pontes, o modelo seguido no sector da saúde, tendo em vista a substituição de unidades antigas e a modernização do parque público hospitalar, não tem reunido a mesma simpatia ideológica por parte da esquerda portuguesa, embora tenha sido um ministro da Saúde de um governo socialista a lançar a iniciativa, mais tarde definida na sua arquitectura concreta pelo Governo do PSD/CDS presidido por Durão Barroso. Coube, de novo, a um governo socialista a implementação concreta dos 4 hospitais existentes em regime PPP.
O primeiro projecto da nova vaga de PPP’s, lançado e executado num contrato de sete anos, não foi, contudo, um Hospital, mas a gestão contratualizada de um equipamento especializado, que estava encerrado há vários anos (Centro de Medicina Física e de Reabilitação do Sul, São Braz de Alportel, Algarve). Foi uma experiência de sucesso que mereceu uma avaliação muito positiva pelo Tribunal de Contas e pela Entidade Reguladora da Saúde.
A arquitectura das PPP’s na saúde beneficiaram de uma visão de longo prazo em que o value for money, critério que procura demonstrar a vantagem em valor para o Estado de uma infraestrutura gerida por privados, se revela extremamente positivo. A experiência anterior de construção dos últimos 10 hospitais públicos portugueses, em que os orçamentos iniciais de obra resvalaram muitas vezes para valores muito mais elevados (em alguns casos mais do dobro) e o tempo de execução também multiplicou por dois, justificou essa nova abordagem ao desenvolvimento e modernização do sector.
O modelo escolhido, procurou optimizar o valor para o Estado e a separação dos riscos, optando-se pela criação de dois veículos distintos para cada novo projecto hospitalar. Um primeiro veículo que suporta o projecto de arquitectura, construção propriamente dito e de manutenção de instalações, através de um contrato de 30 anos. O segundo veículo assume o formato de um contrato de gestão e de exploração do estabelecimento hospitalar, por sucessivos prazos de 10 anos, permitindo por esta via das renovações corrigir o desempenho do operador seleccionado, se for o caso.
No final, as propostas obrigam-se em conjunto com os dois veículos distintos para cada novo projecto hospitalar, pressionando desta forma os operadores a apresentar uma proposta globalmente mais competitiva, a partir da tensão que se estabelece entre as construtoras do edifício e operadores privados de cuidados de saúde.
Desta dinâmica resultou a construção de 4 excelentes unidades, com um tempo de construção em média inferior a 3 anos e sem qualquer risco de derrapagem financeira para o Estado, como aconteceu nos últimos concursos lançados antes do modelo PPP. Em 3 dos casos, como hospitais de substituição de antigas unidades, o operador privado foi também responsável pela transição dos serviços do estabelecimento antigo e pela integração da larga maioria dos profissionais existentes.
A avaliação responde à pergunta que lhe deu origem?
A avaliação apresentada beneficiaria com a informação concreta sobre alguns aspectos que permitissem uma leitura objectiva de alguns parâmetros tornando a sua interpretação mais acessível ao cidadão comum. O enquadramento do estudo poderia ter mostrado que os Hospitais em PPP têm um peso muito limitado na despesa pública de saúde, representando apenas 4,89 % do Programa de Saúde em 2014 e cerca de 5,64% do total de Aquisição de Bens e Serviços por parte do SNS. A avaliação ganharia com a comparação da produção efectiva de cada hospital em PPP e o custo médio padrão dos doentes tratados, beneficiando os hospitais do seu “cluster” de referência. Poderia mostrar ainda o peso relativo das PPP’s no parque hospitalar e os preços comparativos acordados com as PPP e restantes hospitais.
Poderia ainda identificar e valorizar os riscos que são transferidos do Estado para o operador privado, comparativamente ao operador público, designadamente quanto aos resultados de exploração de cada hospital e de cada exercício.
Nada disto põe em causa a metodologia sofisticada seguida nesta avaliação, que exige uma análise e reflexão aprofundada. Seria importante, por essa mesma razão, que os dados que lhe dão origem fossem disponibilizados publicamente, para que as universidades e os investigadores de economia da saúde pudessem discutir e beneficiar do seu conhecimento.
Em muitos aspectos as PPP’s em saúde têm sido um agente de dinamização e modernização do conhecimento português. O impulso criado na engenharia e na arquitectura hospitalar, assim como no domínio dos sistemas de informação e das práticas de gestão, constituem bons exemplos. A densificação das metodologias contratuais e a elaboração de benckmarking mais aprofundados tem sido uma das vantagens inegáveis dos projectos PPP, embora seja necessário um esforço suplementar para que os restantes hospitais da rede pública harmonizem os seus sistemas de reporting, viabilizando uma comparação regular e mais fina dos indicadores.
Os operadores privados que actuam no mercado da saúde criaram escala e conhecimento que lhes permite hoje, melhor que antes, competir no mercado internacional. Esse resultado também é importante para o País, dado o valor económico do “cluster” da saúde, que em termos de exportação representa actualmente um volume superior que dois dos mais emblemáticos e tradicioanis exportadores nacionais, a cortiça e o vinho do Porto.
Aprecia-se o esforço da ERS para responder à questão essencial se as PPP’s em saúde são melhores ou piores para o cidadão e para o País que os restantes modelos contratuais existentes nos hospitais. A conclusão parece óbvia e fundamentada: os hospitais em PPP são globalmente uma boa solução para o País, para os utentes do SNS e para o cidadão e contribuinte português.
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