Prestes a completar 21 anos desde o início da sua operação comercial, o Metro do Porto revolucionou a mobilidade na cidade do Porto, mas também dos seus concelhos limítrofes. No entanto, volvidos tantos anos, assistimos à substituição de vários projetos de expansão do Metro do Porto por carreiras de autocarros elétricos com células de combustível de hidrogénio.
Por que estamos a substituir o Metro do Porto por autocarros?
Queremos um Metro do Porto? Ou queremos um Autocarro do Porto?
Num momento em que se avizinha a conclusão da Linha H e da extensão a Vila D’Este, e se encontra para breve o início das obras da Linha Rubi, devemo-nos perguntar porque é que se encontra em curso uma substituição de várias linhas que inicialmente estavam projetadas para o Metro do Porto por linhas que serão exploradas com autocarros elétricos/movidos a hidrogénio e que são, “para inglês ver”, apelidadas de “MetroBus”.
Tal é o caso da Linha da Boavista, inicialmente projetada em 2005 como uma linha do Metro do Porto entre Matosinhos Sul e a Casa da Música e que se encontra a ser construída como uma carreira de autocarro entre a Anémona e a Rotunda da Boavista, com uma antena para a Praça do Império.
Por outro lado, a Linha Verde, que há 20 anos, na 1.ª fase do Metro do Porto, se encontrava projetada como uma Linha do Metro do Porto entre a Trofa e o Estádio do Dragão, foi apenas construída até ao ISMAI. Só agora, em 2023, foi lançado um concurso internacional para o anteprojeto de uma mera extensão de duas paragens entre o ISMAI e o Muro, com o remanescente trajeto até à Trofa feito através de autocarros.
Em último lugar, a 2.ª Linha da Maia II, a linha vertebral do concelho da Maia, projetada há mais de duas décadas e com uma extensão de cerca de 13 quilómetros, arrisca-se a ser igualmente explorada por autocarros, também sob a égide do “MetroBus”.
Mas o que é, afinal, o “MetroBus/BRT”? Trata-se de um sistema de transporte de massas com recurso a autocarros e que se distingue duma mera linha de autocarros ao possuir (i) vias dedicadas em todo o seu percurso com total prioridade em cruzamentos face aos demais veículos, (ii) bilhética e validação dos bilhetes feita nas paragens/estações e (iii) material circulante de elevada capacidade.
Apesar de o “MetroBus/BRT” poder ser descrito, assim, como um “Metro Ligeiro sobre pneus”, este apresenta várias desvantagens face ao Metro Ligeiro, em particular o caso do Metro do Porto:
Capacidade de transporte muito mais baixa que o Metro do Porto
Em primeiro lugar, o Metro do Porto consegue transportar muito mais pessoas que o projetado material circulante do “MetroBus/BRT”.
Na sua atual configuração, as composições Eurotram conseguem transportar cerca de 450 passageiros em modo acoplado, valor que se eleva para 496 passageiros no caso das composições Flexity Swift (os tram-train que são utilizados na exploração da Linha da Póvoa e da Maia) e 488 passageiros no caso das composições CRRC Tram, que têm a sua entrada em operação para muito breve.
Os autocarros do “MetroBus/BRT” para a Avenida da Boavista, que irão ser fornecidos pela Domingos da Silva Teixeira, S.A./Caetanobus, têm uma mera capacidade de 133 passageiros. Estes 133 passageiros de capacidade representam apenas 30% da capacidade dos Eurotram e cerca de um quarto da capacidade dos Tram-Train e dos futuros CR Tram do Metro do Porto.
Quando qualquer portuense verifica que o trânsito na cidade está caótico, quando o próprio Presidente da Câmara Municipal do Porto Rui Moreira se refere à Via de Cintura Interna como uma “trombose” e quando o Metro do Porto se encontra sobrelotado em hora de ponta, causa estupefação que estejamos a gastar mais de 60 milhões de euros num autocarro com 4 vezes menos capacidade que o Metro do Porto e com menos capacidade que os autocarros articulados da STCP.
Custo operacional por passageiro e por quilómetro muito mais elevado que o Metro do Porto
Conforme já amplamente estudado, um “Metrobus/BRT” tem um custo operacional por passageiro e por quilómetro muito mais elevado que um Metro Ligeiro como é o Metro do Porto.
Isto verifica-se pois (i) o “MetroBus/BRT” tem 4 vezes menor capacidade que um Metro Ligeiro, porque (ii) a injeção de energia via catenária é mais eficiente do que carregamento de baterias/células de combustível de hidrogénio, (iii) os autocarros, como qualquer veículo sobre rodas, está sujeito a uma resistência ao rolamento muito superior face a um veículo sobre carris como é o caso de um Metro Ligeiro, implicando custos de manutenção muito superiores no caso dos autocarros e (iv) os autocarros e as suas baterias têm uma vida útil significativamente inferior ao material circulante ferroviário, obrigando a custos de obsolescência/substituição superiores.
O MetroBus na Avenida da Boavista estará totalmente desarticulado do Metro do Porto
O “MetroBus/BRT” da Avenida da Boavista, aquando da sua entrada em operação, estará completamente desarticulado do Metro do Porto numa verdadeira “ilha de mobilidade”, tendo em conta que em nenhum dos seus términos estará conectado a qualquer linha do Metro do Porto.
Neste sentido, a paragem do “MetroBus/BRT” da Rotunda da Boavista distará 400m da estação de Metro do Porto da Casa da Música e não será ligada por qualquer túnel pedonal (ao contrário do inicialmente projetado em 2005 para implementar o Metro do Porto na Avenida da Boavista com o Metro do Porto). Por outro lado, o término da Anémona distará sensivelmente um quilómetro da estação de Matosinhos Sul, quando a Linha da Boavista do Metro do Porto projetada em 2005 previa um interface nesta estação de Metro da Linha Azul.
Com base no exposto, os portuenses, os trofenses e os maiatos vão ser alvo de um downgrade massivo nas soluções de mobilidade que estavam apontadas para estes municípios nem há duas décadas atrás.
O Metro do Porto caminha a passos largos para ser um Autocarro do Porto.
Um Autocarro do Porto sobrelotado, com poucas frequências, ineficiente energeticamente e do ponto de vista ambiental. Um Autocarro do Porto que é 90% autocarro, 10% metro e 0% solução para uma cidade em expansão e que enfrenta os maiores desafios da sua história num quadro de crise habitacional e de crise climática.
E um país desenvolvido não é um país onde todos temos automóveis.
É um país onde todos, ricos e pobres, decidem utilizar o Transporte Público.
O “MetroBus/BRT” é uma solução de serviços mínimos.
Como é que podemos revolucionar a mobilidade no Porto e colocar todos, sem exceção, a utilizar o Transporte Público com soluções de “serviços mínimos”?