O interesse que as relações internacionais e a diplomacia têm para o público deve-se ao modo como os especialistas falam, que não se distingue da maneira mais habitual de falar das outras pessoas. Os especialistas sabem perfeitamente que não estão a falar de pessoas; mas só discutem os seus assuntos de países no modo como falam dos seus amigos, dos ex-cônjuges, e de quem lhes cose os botões. O seu maior ou menor talento vem da aptidão genérica para falar da vida dos outros com clareza e interesse, que aliás partilham com os romancistas e os espiões.
Não é um erro involuntário que possa ser remediado por uma educação melhor. Os especialistas em relações internacionais são muito bem educados, e educados da melhor maneira possível. A carreira diplomática é censurada por atrair pessoas interessadas na vida dos outros. Esse interesse nunca é porém frívolo. Parece impossível falar de relações internacionais sem considerar uma multidão de inimigos, vizinhos e estrangeiros que nunca estão por perto, e assim poder travar as guerras por outros meios. A principal disciplina requerida numa educação diplomática é aquela que também se ensinou desde sempre a espiões e romancistas: a bisbilhotice.
A proficiência na bisbilhotice requer temperamento, além de um gosto inato ou adquirido por segredos e perseguições; e sofreu poucas alterações ao longo dos tempos. O anterior Rei de França era conhecido entre terceiros como o França. Nesses tempos ‘Lá vem o França’ queria dizer ‘Lá vem a França.’ Hoje o trocadilho é olhado com indiferença nas chancelarias. Mas mesmo nessas alturas ninguém confundia as coisas, e sabia-se bem que o França tinha dois inquilinos no seu corpo. O modo de falar da França nunca mudou, e não se espera que venha a mudar tão cedo.
Não parece haver uma maneira de falar de países que não considere desejos, interesses e intenções; e que não lhes presuma dissimulação, motivos ou convicções firmes. Aquilo a que chamamos a cultura ou a história de um país são uma espécie de psicologia dessas convicções firmes, e são usadas todos os dias para explicar porque certos países são derrotados, vitoriosos, previsíveis ou inconstantes. Só porque acreditamos que os países podem acreditar em P é que, quando fazemos prognósticos em política externa, nos podemos perguntar se não acreditarão no fundo em Q.
Os matemáticos e os estrangeiros falam com os seus pares de maneira especial; e o público não percebe o que dizem quando falam entre si. Os diplomatas e especialistas em relações internacionais, pelo contrário, falam provavelmente entre si como falam em público, e fazem-no na maneira que todos nós aprendemos em pequenos quando aprendemos a falar da vida dos outros. Isto explica que seja fácil a qualquer membro do público interessado perceber os seus segredos, análises e previsões; e que as relações internacionais, como o adultério e a vigilância, despertem tanto interesse.