A tão badalada semana de quatro dias, ou mesmo a Blue Friday, são vistas como iniciativas estratégicas revolucionárias, inovadoras e inteligentes.
Pelo menos por alguns.
Em Portugal o tema está longe de ser consensual. Existe no nosso país uma herança cultural entranhada que coloca em causa praticamente todos os princípios que contornam esta iniciativa – os portugueses são pouco produtivos; quem trabalha mais horas e sai tarde do escritório é o mais dedicado e trabalhador; se tens muito tempo livre é porque não estás a fazer o trabalho bem feito.
Independentemente das verdades e mitos, implementar a semana de quatro dias é um brave move! Não podemos ser politicamente corretos e fingir que as preocupações não existem. Elas são reais: menos um dia de trabalho pode gerar quebras de produtividade, de qualidade de serviço, de negócio e, por consequência, perdas para a empresa.
A questão de que não se fala é que adotar a semana de quatro dias dá trabalho. Implica mudanças, e são poucos os que gostam de mudar. Sair da zona de conforto. Fugir aos mecanismos que já existem há anos.
Implica otimizar as equipas e os processos de trabalho. Melhorar a organização, a comunicação, as ferramentas e a gestão como um todo. Testar, medir, avaliar, reajustar se for necessário. Obriga a trabalhar em equipa, a quebrar barreiras e a “vestir a camisola”. E tudo isto dá trabalho sim, mas é surpreendentemente mais fácil do que parece.
Iniciativas como a semana de quatro dias ou a Blue Friday colocam as pessoas em primeiro lugar, demonstram confiança nos colaboradores, promovem a motivação, premeiam, valorizam, envolvem, cuidam. As próprias pessoas sentem-se motivadas a ajudar. Otimizam o seu trabalho, as suas agendas, comunicam mais.
Provavelmente nem todos os negócios podem abdicar de um dia. Nós somos o melhor exemplo disso – a área da saúde é bastante exigente e sensível. Mas quando a vontade existe, tudo se ajusta. O que importa não é o conceito estanque dos quatro dias, são os princípios que estão por detrás.
A semana dos quatro dias de trabalho ou a Blue Friday não são soluções de “juntar água, e já está”. São oportunidades para as empresas otimizarem ainda mais os seus processos, equipas, mecanismos de trabalho e negócio. Para fazerem as coisas de forma diferente, mas melhor. Para crescerem, serem mais produtivas e atrativas.
Por outro lado, estas iniciativas não podem ser encaradas como uma moda à qual temos de aderir para sermos inovadores. É preciso acreditar nos princípios e valores que regem estes conceitos. Não basta comunicar para o exterior e embelezar a imagem da marca.
Uma semana de quatro dias de trabalho em que os colaboradores são obrigados a trabalhar o dobro das horas para compensar a “folga” não é um benefício – é publicidade enganosa! E os danos que isto pode provocar (estes sim) são grandes, não só em termos de produtividade, mas também de saúde mental e de confiança.
Mas as pessoas são mesmo mais produtivas? Na nossa experiência sim. Mais produtivas, mais motivadas, proativas, unidas – zero turnover, zero absentismo. Não será igual em todos? Provavelmente não, mas a rotina e a tradição instalada muitas vezes mascaram problemas que existem, mas que passam despercebidos.
A produtividade não é o único desafio atual. O mercado luta diariamente pela atração e retenção de talento, perde dinheiro com as baixas e com o aumento da taxa de absentismo, entre outros problemas. E qual o custo de tudo isto? Aqui não há perda de produtividade?
O desconhecido provoca medo, gera desconfiança e alimenta a crítica derrotista e o “não” imediato. Mas nada de valor se gera sem trabalho. Não há uma fórmula vencedora para a correta implementação de iniciativas deste género, mas o seu sucesso não está apenas nas mãos dos colaboradores, como muitos querem colocar.
O sucesso está nas mãos dos gestores, dos decisores, dos estrategas, dos que lideram pelo exemplo e que procuram na mudança uma forma de evoluírem, crescerem, serem mais eficientes e competitivos. O sucesso depende das pessoas, e esta é a regra que deve estar sempre no centro de qualquer iniciativa.