“Este acidente foi causado pelas decisões erradas do árbitro.” Estas foram as palavras de Faruk Koka, presidente do Ankaragücü, após a agressão ao árbitro Halil Umut Meler, na sequência do jogo da sua equipa diante o Rizespor, na passada semana.

Permitam-me corrigir: “Este acidente” – que, convenhamos, é uma expressão demasiado leve para retratar o que se passou na Turquia – foi causado pela falta de noção e de respeito que hoje invade o futebol e não pelas decisões erradas de um árbitro.

A verdade é que rapidamente o caso (e bem) se alastrou por todo o mundo e foi incontornavelmente contestado. Mas tudo o que tenho visto faz-me pensar se não somos demasiados hipócritas? Convenhamos que o que aconteceu na Turquia podia ter acontecido em Portugal.

Basta olharmos para a realidade do futebol em Portugal, onde adeptos invadem academias, arremessam copos aos treinadores (porque não gostam de uma substituição) ou intimidam candidatos à presidência. Não falando aqui do que, semana após semana, os árbitros sofrem, não só por parte dos adeptos, como também dos próprios clubes.

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Isto porque não se trata apenas de atos pacóvios e até mesmo selvagens, mas também de uma ameaça clara a algo básico a que todos nós devemos ter direito: a nossa opinião e a nossa liberdade.

Não deixa de ser igualmente engraçado que isto tem sido algo transversal numa sociedade cada vez mais polarizada, onde ter uma opinião contrária é pecar… onde ser do Sporting é ser contra o Benfica (e vice-versa) e onde ser do Porto é destilar ódio por Lisboa.

O futebol acaba por ser “apenas” o expoente máximo de uma sociedade polarizada. Tolda pensamentos e desvanece noções cívicas básicas que, por tão básicas que são, muitas vezes esquecemos. Se outrora o futebol havia sido cura para muitos dos males da nossa sociedade, hoje talvez isso possa não passar de uma mera utopia.

Precisamos de agir, está na hora de sermos assertivos e, mais do que de uma mão pesada, precisamos que quem manda tenha paciência para educar uma população adulterada por aqueles que são os piores hábitos futebolísticos. E, aqui, palavras podem ser até bem mais eficientes que ações.

É preciso compreender que mais que a destruição da reputação de um grande clube de futebol, está a destruição do próprio futebol em Portugal. Momentos que mancham o panorama do desporto em Portugal e colocam em causa valores tão básicos da democracia.

A minha questão é só uma: até quando isto vai durar? Futebolisticamente falando, precisamos que os nossos melhores líderes apareçam, marquem presença e sejam uma voz ativa numa sociedade e num desporto onde urge uma rápida mudança na forma como age, comunica, e acima de tudo como pensa. Para tal, uma nota: o desporto só muda se as pessoas mudarem. Falo de um problema estrutural de uma sociedade que tarda em acordar para a realidade.

O que é que fizeram ao nosso futebol…