Na tradição ocidental, o dia de hoje, sexta-feira 13, é de azar para os mais supersticiosos. O Azar, aqui especificamente entendido como má sorte, é incontrolável. Nem toda a prudência e cuidado podem evitar determinados resultados, como um acidente de automóvel que resulte de uma avaria mecânica, como o surgimento e a disseminação de um novo vírus. Vivemos numa sociedade de risco e aceitamo-lo, incorporando-o nas ações mais mundanas do nosso quotidiano. A nossa economia depende dessas ações, depende dos riscos que estamos dispostos a assumir diariamente.
A má sorte, superstições à parte, existe e é inevitável, mas não deverá ser debilitante. Assumimos o risco porque a sua fraqueza é a previsibilidade: é por essa razão que temos regras de trânsito, revisões obrigatórias e seguro automóvel, é por isso que investimos na medicina e na ciência, é ainda o que nos leva a crer que o Estado, quando confrontado com as maiores adversidades, saberá reagir.
Em Macau, região administrativa especial (RAE) da República Popular da China e território anteriormente governado por Portugal, a receita de jogo territorial (exploração de casinos) totalizou mais de 32 mil milhões de euros tanto em 2018 como em 2019. Atualmente, cerca de 85% da receita fiscal desta RAE resulta de impostos cobrados aos casinos. Sete em cada dez turistas que se deslocam a Macau para jogar são chineses.
Os casinos em Macau têm um funcionamento ininterrupto, 24H por dia, sete dias por semana e alguns nunca tinham fechado as portas (pré COVID-19) desde a sua abertura, assim beneficiando a economia local (veja-se a título exemplificativo os wealth partaking schemes e elevada percentagem de trabalhadores ligados diretamente aos casinos ou serviços associados).
Estes dados são curiosos se pensarmos que na China continental (i.e., na República Popular da China, excluindo as RAE) quer a exploração de jogo online, quer de jogo territorial são atividades ilegais, com a exceção dos jogos sociais geridos diretamente pelo governo chinês. A impossibilidade de disponibilizar jogo online estende-se a todo o território da China, e por essa razão Macau não pode licenciar a atividade.
Consequência do exposto nos três parágrafos imediatamente acima, foi com pesar que a industria de jogo macaeense e, arriscamos, a população dessa região em geral, acatou a ordem para durante duas semanas, iniciadas a 5 de Fevereiro, proceder ao encerramento total de todos os casinos do território como medida de contenção do novo COVID-19. É possível que, por cada dia de encerramento as concessionárias tenham perdido receitas na ordem dos 100 milhões de euros e, como é fácil de perceber, o problema não terminou com a reabertura dos casinos. Macau sabe que a quebra de receitas associadas à indústria do jogo está para perdurar até que sejam atenuados os efeitos do novo vírus um pouco por todo o mundo.
Posto isto, e numa perspetiva de gestão de risco, nomeadamente para a economia macaeense tão dependente do jogo, será este o momento de a China reconsiderar a sua posição face ao jogo online, permitindo o licenciamento da atividade?
Apesar de o jogo online ser um negócio diferente do jogo territorial e, portanto, um jogador que se desloque a um casino para jogar roleta francesa poderá não estar disposto a jogar esse mesmo jogo num computador e vice-versa, a mera possibilidade de aceder a jogo online teria deixado uma porta aberta aos consumidores do jogo de Macau, maioritariamente chineses como já apontado, para continuar a jogar. Hipoteticamente falando, esta medida poderia contribuir para diminuir a quebra de receitas que continuam a registar os casinos macaeenses.
Acresce à posição do governo chinês nesta matéria a probabilidade de os operadores dos casinos em Macau praticarem lobby contra o licenciamento do jogo online, temendo a perda de receitas do negócio territorial, mas não tem de ser assim e Portugal é um exemplo. Todos os grupos empresariais a que pertencem as concessionárias portuguesas exploram jogo na vertente territorial e online, atraindo outras faixas etárias e tipos de jogadores ao seu negócio.
O azar é inevitável e, a benefício da previsibilidade, o governo chinês deveria ponderar licenciar o jogo online.
Fica a ideia nesta sexta-feira 13.