Numa guerra, seja ela mundial ou não, as igrejas que não foram destruídas mantêm-se abertas, não havendo memória de proibição de actividades de culto religioso, que impliquem a concentração de duas ou mais pessoas.
Numa guerra, seja ou não mundial, não há memória de recolher obrigatório praticamente absoluto, por tempo indeterminado.
Numa guerra, seja ela convencional ou não, não há memória da inexistência de vencedores.
Com contornos nunca antes imagináveis, de uma forma nunca antes programável nem previsível, num planeta onde tudo parecia ser controlável e manipulável, o ser humano está agora confinado à sua casa, com limitações produtivas que poderão causar dano irreparável à humanidade, até aqui habituada a ser dona e senhora do universo.
Com execepção de alguma construção civil, da grande distribuição, dos transportes de mercadorias, da indústria farmacêutica, das telecomunicações e da energia, tudo o resto vai ficando, cada vez mais, devagar, devagarinho, parado. Por tempo indeterminado.
E para tentar reparar, o Estado lembrou-se de injectar.
Como se tentará demonstrar, ao invés de injetar, em vez de adiar, importará, pelo contrário, perdoar e amnistia. Seria mais rápido, mas eficiente e eficaz e, acima de tudo, muito mais saudável.
Se não, vejamos:
Não adianta dar oxigénio e alguém que já morreu.
Como facilmente se alcançará, de nada adiantará injetar, sem antes tentar ressuscitar.
Injectar capital na economia, com os bancos pelo meio, em processos morosos e altamente burocráticos, com requisitos inatingíveis e sabe-se lá mais bem o quê, de nada ajudará se, muito antes disso, não libertarmos os agentes económicos empresas e as famílias, dos encargos regulares e periódicos decorrentes das obrigações de pagamento de taxas, taxinhas, impostos e demais contribuições asfixiantes.
Quando esse dinheiro chegar às empresas e às famílias, nada mais haverá a fazer para as ressuscitar.
Imaginemos um doente politraumatizado que sangra convulsivamente, com hemorragias internas e externas. Antes de nos preocuparmos com os horários das refeições que o doente irá ter em casa, com o conteúdo dos alimentos que tomará depois do internamento (onde se alimenta apenas de soro), com o exercício físico, com as horas de descanso, com o bem estar, emprego, habitação, educação, férias etc, importará tamponar de forma definitiva, toda aquela sangria.
Imaginemos agora um moribundo, internado, além do mais, com graves problemas respiratórios. Antes da educação, da alimentação, da educação, da habitação e bem estar do doente, importará dar-lhe o oxigénio que lhe garante a sobrevivência.
Da mesma forma, de que valerá o Estado mandar entregar dinheiro às famílias e às empresas, sem antes (e acima de tudo, como condição básica e primária de sobrevivência – como se de oxigénio se tratasse) as libertar (ainda que temporariamente) do pagamento dos impostos ?
Sabendo nós que a máquina cobradora de impostos (que raramente têm intervenção humana) inicia e prossegue os procedimentos automáticos de cobrança, no dia imediatamente seguinte ao termo do prazo de pagamento – perseguindo até criminalmente quem não os pagar, de que valerão as injeções na economia, a mais numa fase em que as empresas e as famílias já estão moribundas, em avançado estado de insolvência?
De que vale um bom emprego, uma boa casa ou um carro a uma pessoa que carece, antes de mais e acima de tudo, como condição de sobrevivência, que lhe estaquem o sangue ou lhe dêem oxigénio ?
As ajudas financeiras que o Estado está a prometer às famílias e às empresas, pelo menos da forma como serão administradas, não produzirão qualquer efeito, por serem desajustadas ao estado actual da economia.
Se não vejamos:
Na data de vencimento dos impostos (ainda que usemos a prometida moratória de três meses, para pagamento sem juros) as famílias e as empresas não terão qualquer capacidade de realizar os respectivos pagamento tempestivamente.
Isto porque, ou nada ganharam ou, quando muito, se sobrou algum valor, aquilo que ganharam se destina a manter a estrutura aberta, pagando rendas e prestações, salários (sem salário os trabalhadores não comem, perdendo capacidade produtiva), pagamento de fornecedores de bens e serviços (sem pagamento, agora a pronto, não fornecem bens nem serviços).
Compelidas a pagar impostos (antes de pagarem aos trabalhadores e aos fornecedores), sob pena de prisão ou cobrança coerciva (com penhoras que irão travar a capacidade produtiva), as empresas, gora asfixiadas, deixarão de ter capacidade para pagar salários aos trabalhadores e as dívidas aos fornecedores.
Se os trabalhadores não produzem (por falta, atraso ou redução de salário, por ser ter optado pelo pagamento de impostos antes do pagamento dos salários), as empresas não fabricam, não faturam, não vendem, nem cobram.
Se os fornecedores não fornecem (por falta de capacidade de pagamento a pronto, por ser ter optado pelo pagamento de impostos antes do pagamento dos produtos e serviços indispensáveis a manter a máquina a funcionar), a empresa deixará de conseguir produzir, nada terá para vender, caso em que deixará de ser competitiva, perdendo clientes o que, irá gerar o seu encerramento por falta de actividade e capacidade para suportar rendas, empréstimos bancários, salários, etc
Se a empresa não aguentar (por ter pago os impostos antes de pagar aos trabalhadores e aos fornecedores para evitar prisões e penhoras), fecha, o que gera despedimentos, com custos sociais económicos elevadíssimos.
Se a empresa fechar, deixará de pagar impostos.
Mais do que nunca, importará agora inverter o modelo de funcionamento do sistema tributário, através de perdão ou brutal redução fiscal – dos impostos que se venceram durante período de quarentena obrigatória, sob pena de morte da economia com consequências ainda mais desastrosas.
O Estado não pode ignorar que, na data de vencimento das próximas prestações tributárias, nada haverá para pagar, por nada ter sido produzido, por não ter sido gerada qualquer riqueza susceptível de tributação.
Com perdão fiscal imediato, as empresas conseguirão pagar aos trabalhadores, fornecedores e bancos.
Pagando aos trabalhadores, estes produzirão, o que irá gerar riqueza.
Pagando aos fornecedores de bens ou serviços, estes continuarão a fornecer, o que permitirá manter a máquina produtiva viva, porque activa, gerando riqueza.
Só essa riqueza final, a que começar a ser gerada depois da recuperação económica é que poderá ser tributada.
Se o Estado quiser continua a ser o primeiro a receber, nada irá receber e ainda terá que sustentar as graves consequências económicas e sociais decorrentes da paragem da máquina produtiva.
Com aumento da criminalidade, da fome e da miséria.
Numa economia que irá recomeçar de novo, do zero (ainda que esteja muito abaixo desse nível), o Estado terá que dar o exemplo, dando o primeiro passo, colocando-se, não no inicio, mas no fim do processo produtivo, cobrando apenas aquilo que se irá a produzir depois da catástrofe que atravessamos.
Com excepção dos sectores de actividade acima descritos (os únicos que se mantém vivos, como nunca), todos os outros (que pararam por imposição legal) deverão beneficiar, antes que seja tarde, de uma brutal compensação (também legal) traduzida num choque fiscal que os isente de pagamentos de IVA, IRC e IRS.
O adiamento (do pagamento dos impostos) não passará de um enganador anestésico paleativo temporário que, apenas adiará a resolução de um problema (um empurrar com a barriga), sem o solucionar.
Urge não deixar que a máquina produtiva pare definitivamente, o que apenas se alcançará com o perdão imediato, sem mais demora, de cobrança das próximas prestações de IVA, IRS e IRC.
No mesmo sentido, o alívio das famílias apenas se alcançará com a suspensão imediata das retenções na fonte e dos pagamentos por conta (em IRS) associada à isenção total de IVA nos bens de primeira necessidade (aqueles que são actualmente tributados à taxa mínima de 6%).
Só assim sobrará alguma liquidez (ainda que mínima), que servirá de combustível e oxigénio, tão indispensáveis à sobrevivência de uma economia moribunda.
Reposta a legalidade democrática (ainda sem fim à vista), importará também amnistiar os médios e pequenos delitos, de modo a devolver aos Tribunais a tranquilidade de que irão necessitar, para conseguirem recuperar o trabalho atrasado, contribuindo, desta forma, para um crescimento económico sustentado e saudável.
Antes que seja tarde, urge perdoar e amnistiar.