A desnutrição é um estado resultante da falta de ingestão alimentar ou assimilação nutricional que leva a alterações da composição corporal e a uma diminuição das capacidades físicas e mentais, resultando num decréscimo da qualidade de vida e elevados custos para o Serviço Nacional de Saúde (SNS).
Trata-se de um estado patológico associado a uma menor capacidade de cicatrização de feridas, aumento do risco de infeções, menor funcionalidade muscular, o que contribui para um maior risco de quedas e fraturas ósseas e, por isso, maior risco de dependência funcional, aumento da necessidade de tratamentos, internamentos hospitalares, morbilidade e mortalidade.
Em Portugal, cerca de 1 em 3 idosos na comunidade estão desnutridos ou em risco de desnutrição, esta prevalência aumenta em meio hospitalar, estimando-se que 2 em 4 adultos internados se encontram nesta situação.
Assim, uma intervenção nutricional precoce e efetiva torna-se fundamental para uma adequada sinalização dos doentes em risco ou desnutridos, permitindo um acompanhamento nutricional individualizado, minimizando assim os efeitos nefastos da desnutrição.
Apesar de, nos últimos anos, terem sido dados alguns passos positivos para a implementação de medidas que auxiliassem no combate à desnutrição foi, em 2018, que o primeiro grande passo se concretizou, aquando da publicação do Despacho 6634/2018 do Ministério da Saúde que determinava a implementação da identificação do risco nutricional em todos os estabelecimentos hospitalares do SNS. Nos adultos, a ferramenta para identificação e avaliação do risco nutricional era a ‘Nutritional Risk Screening 2002’ e nas crianças a ‘STRONGkids’.
Se há 5 anos esta medida foi um avanço muito positivo que possibilitava uma intervenção atempada da desnutrição dos utentes em contexto hospitalar, foi igualmente percetível que dever-se-ia alargar a identificação sistemática do risco nutricional para todos os cuidados de saúde.
Neste sentido, dada a relevância desta temática, e porque a tendência dos números da desnutrição em Portugal devem atentar num verdadeiro olhar de preocupação, o Ministério da Saúde, publicou no passado mês de setembro, o Despacho n.º 9984/2023, revogando assim o anterior e que prevê a Implementação e reforço da identificação sistemática do risco nutricional em todos os níveis de cuidados do SNS, cuidados de saúde primários, cuidados hospitalares e cuidados continuados integrados, de modo a reduzir o risco de complicações associadas à desnutrição.
A implementação da identificação sistemática do risco nutricional em todos os níveis de cuidados de saúde, de forma integrada e sustentada, é fundamental, enquanto garantia do acesso e qualidade dos cuidados nutricionais prestados ao doente.
Este Despacho ganha uma relevância adicional, uma vez que se alinha com a nova organização projetada para o SNS, em Unidades Locais de Saúde, a qual facilitará a sua implementação.
Neste novo processo de combate à desnutrição, em todas as estruturas do SNS, o nutricionista assume um papel fundamental, uma vez que lhe compete, após a identificação do doente com risco nutricional, proceder à avaliação do seu estado nutricional, estabelecer o diagnóstico nutricional, e definir a sua intervenção nutricional e respetiva monitorização, em articulação com a equipa multidisciplinar responsável pelo doente.
A implementação este Despacho é, de facto, urgente no nosso país, mas deve ser conjugado com outras medidas que potenciem a melhoria efetiva dos resultados, nomeadamente através da educação e sensibilização da comunidade (doentes, familiares, cuidadores formais e informais) para os sinais de alerta da desnutrição e educação alimentar para a sua prevenção; formação e sensibilização de todos os profissionais de saúde envolvidos na prestação de cuidados para a problemática da desnutrição e as suas consequências; o reforço das equipas de saúde com nutricionistas, bem como a comparticipação pelo Estado Português dos suplementos nutricionais orais e da nutrição entérica e parentérica em contexto de ambulatório e domicílio.