Em 2023, o modelo de acesso ao ensino superior permanecerá igual ao dos últimos três anos, todavia já foi anunciado pelo Ministério da Educação e pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e do Ensino Superior, que, a partir do próximo ano letivo, o modelo atual, presente desde a época pandémica, deixará de vigorar. Agora, os alunos que se candidatem às IES (Instituições do Ensino Superior), presenciarão um modelo que adota tanto medidas pré-pandemia, como medidas criadas no decorrer da mesma.
Se em maio do ano passado escrevia quanto à incerteza deste novo modelo de adesão ao ensino superior, no artigo “Exames Nacionais em Banho Maria”, hoje escrevo ciente dos moldes do mesmo. Este não se apresenta como uma réplica do vigente em 2019, antes da pandemia, mas também não se mostra igual ao dos últimos dois anos, houve sim uma junção de ambos.
Com isto, os alunos que estão, atualmente, no 10.º ano, para o próximo ano letivo serão já abrangidos pelas novas medidas implementadas. Assim, ao longo dos seus últimos dois anos de secundário (11º e 12º ano), os alunos estarão sujeitos à realização de três exames nacionais obrigatórios para se candidatarem ao ensino superior. Dos três, o exame nacional de português é obrigatório e universal a todos os alunos, enquanto as restantes duas provas são escolhidas, pelos alunos, dentro do leque de possibilidades.
Passado dois anos letivos, os exames voltam, assim, a ser necessários, para terminar o secundário. Tal alteração, levou os ministérios a decidirem que as provas deixariam de ter um peso de 30%, na nota final da disciplina, passando agora a ter um peso de 25%.
Outra das finalidades do novo modelo de acesso às IES é reforçar o peso dos exames nacionais. Exige-se, assim, às Universidades, um teto mínimo de peso dos exames de 45% e um teto máximo de 60 %, salvaguardando, assim, que as IES, que somente contavam com 40% de exames para ingresso, passem a valorizar mais estes. Ainda assim, as provas de ingresso exigidas no concurso nacional de acesso ao ensino superior passarão a ser, no mínimo, duas e, no máximo, três, deixando de haver a hipótese de alguns cursos terem apenas um exame para o seu ingresso.
Com algumas medidas já apresentadas, deduzo que os Ministérios criaram um modelo, não só porque era urgente a criação do mesmo, devido aos últimos dois anos letivos caracterizados pela instabilidade de os alunos não saberem qual o modelo que lhes seria aplicado, como pela emergência de atenuar as injustiças no ingresso às IES.
Como resposta às injustiças, os ministérios decidiram enfatizar o papel dos exames, procurando atenuar a influência que as notas das disciplinas sem exame faziam na média do final do secundário de alguns alunos – estas, por norma, rondavam os 18,19 e 20 valores, como a DGEEC anunciou. Habitualmente, as disciplinas que os alunos concluem com 18,19 e 20 valores são as disciplinas anuais e, por isso, além da acentuação do peso dos exames nacionais, os ministérios implementaram uma medida nunca antes vista, que estabelece mais, ou menos, peso nas disciplinas, dependendo da sua duração. Por outras palavras, se a disciplina for anual, terá menos peso na nota interna, que uma disciplina bienal ou trienal, para, mais uma vez, evitar as subidas generalizadas das médias, devido a uma disciplina.
A realidade é que nos últimos anos, quando os exames nacionais foram opcionais, as notas internas subiram. Relevante, mas antigo, seria recordar que, em 2014, quando os exames eram obrigatórios, um estudo elaborado pela CNE, Conselho Nacional da Educação, revelou que apenas 18% das escolas tinham resultados semelhantes entre os exames nacionais e as notas internas. Além disso, os alunos, por norma, desciam cerca de 4 valores nos exames, comparativamente à sua nota interna. Com a opcionalidade, este fenómeno inverteu-se: os alunos, não só mantiveram as notas internas, como as subiram. A inexistência dos exames nacionais, para equilibrar a “balança avaliativa”, contribuiu para que as médias de entrada nos cursos de ensino superior subissem, exponencialmente, e, agora, um aluno que queira entrar na faculdade depara-se com notas de último colocado sem precedentes.
Curioso é ainda analisar que, nos últimos dois anos letivos (2019/20 e 2020/21), quando a subida generalizada das classificações internas se acentuou, eram as instituições privadas que lideravam sempre as tabelas, com médias superiores a 1 ou 2 valores, do que as do ensino público.
Logo, numa análise meramente crítica e de causa, este novo modelo parece-me ser insuficiente, embora tenha os seus aspetos positivos. Favorecer os exames nacionais não carece de pontos negativos: As provas mantêm-se tradicionalistas, testando mais a memorização do que a perceção concreta dos temas avaliados; a capacidade socioeconómica de cada aluno revela claras desvantagens, seja pelo ingresso em instituições privadas, dotadas de melhores condições de ensino, seja pela maior possibilidade de recorrer a explicações pagas, nunca permitindo afirmar-se que existe igualdade no direito à educação e seu usufruto.
Em suma, acredito que tanto o modelo atual, como o antigo levam à conclusão de que o ensino não é igualitário e dificilmente o será. No modelo anterior, observava-se uma inflação propositada, como comprovado, das notas dos alunos de instituições privadas, procurando estas ver o seu prestígio e posição nos rankings nacionais elevados. No modelo atual, embora se consiga, razoavelmente, diminuir esta influência dentro de cada instituição, só o facto de estes estabelecimentos de ensino conseguirem oferecer um ensino mais rico, especializado e adequado a um pequeno grupo, em comparação com o ensino público, leva, automaticamente, a desigualdades, juntamente com a possibilidade de muitos recorrerem, ainda, a explicações pagas fora do ambiente escolar. Não sou critico da existência de instituições de ensino privadas, mas ambiciono sim ver o dia em que os diferentes graus de ensino público, até ao secundário, na sua generalidade, compitam, frente a frente, com o ensino privado.