As últimas eleições legislativas foram reveladoras da forma como se “desperdiçam” votos de eleitores, da forma desigual como os partidos elegem deputados e da necessidade que há de alterar a lei eleitoral.
Como é sabido, e ao contrário do que acontece nas eleições autárquicas, nas legislativas os eleitores votam sobretudo em partidos e menos em pessoas, para que, depois das contas feitas, cada partido tenha mais deputados na Assembleia da República. No caso de ser o partido que obteve a maioria de votos é convidado a constituir Governo.
No entanto, com o atual modelo de lei eleitoral, o que acontece é que um partido, para eleger um deputado, pode precisar de menos votos que outro, considerando a origem do voto. Atente-se no seguinte exemplo:
O CDS-PP obteve a nível nacional 89.113 votos, o que representa 1.60% do total dos votos e não conseguiu eleger nenhum deputado. Já o PAN com 1,58 %, que representa 88.127, elegeu um e o Livre, com 1,28 %, que representa 71.196 votos, também elegeu 1 deputado. Como se deverão sentir todos os eleitores do CDS-PP que não estão representados na Assembleia da República? Valeu a pena ir votar? Não será isto mais um desincentivo ao voto?
A perceção popular é cada vez mais a de que nem sequer vale a pena ir votar, pois há efetivamente votos que valem mais do que outros, é factual. Como se pode querer diminuir a taxa de abstenção se todos estes episódios apenas aumentam a vontade de qualquer um se abster.
Como poderíamos contornar esta situação, torná-la mais equitativa e não desperdiçar os votos?
Os votos seriam contados a nível nacional por partidos e depois distribuídos consoante o rácio definido por cada distrito, região autónoma, e estrangeiro. Em primeiro lugar definir quantos votos seriam necessários para eleger um deputado e depois definir o número de deputados que cada divisão administrativa tem direito mediante o número de votantes.
Considerando os dados das últimas legislativas em que votaram 5 737 289 (já contando os votos do estrangeiro) cidadãos para eleger 230 deputados, facilmente chegamos à conclusão que para eleger um deputado terão sido necessários 24 944 votos no partido a que esse deputado pertence. Como podemos analisar não foi o que aconteceu a alguns partidos que precisaram de mais do triplo dos votos para eleger um deputado.
Considerar o número dos que votam a cada eleição ao invés do número de inscritos seria primordial. Obviamente, dever-se-ia manter a equidade populacional dos diversos distritos e a relação direta com o número de deputados que poderia determinado distrito eleger.
Cada distrito deve ver-lhe atribuído um número de deputados que pode eleger considerando o número de habitantes, que poderia ser reduzido consoante a diferença dos que votam e dos que se abstêm.
Por exemplo, com a atual lei eleitoral o Distrito de Portalegre elegeu 2 deputados de um só partido que obteve 25.271 votos, fazendo com que os mais de 12 mil votantes no PSD e os mais de 6 mil do Chega possam não se sentir representados. Se os votos que sobram dos distritos mais populosos não fossem desperdiçados haveria maior diversidade representativa no parlamento e a população sentir-se-ia mais representada, atribuindo ao seu ato de votar um valor acrescentado.
Seria um incentivo e um apelo ao voto. Estará no momento a perguntar: para onde vão os votos que sobejam?
Pegando no exemplo do distrito de Portalegre, interessa explicar que os votos num determinado partido que não fossem suficientes para eleger nesse distrito seriam para ajudar a eleger um deputado desse mesmo partido noutro distrito onde tivesse a maior percentagem de votos relacionando com o que faltasse menos para atingir o número de votos (+/-25 mil votos) e onde houvesse lugares por distribuir.
Um exemplo de como ficariam os 4 maiores distritos, em termos populacionais.
Olhando para os resultados das últimas legislativas e aplicando esta hipótese de voto por partido e distribuição equitativa pelas divisões administrativas, vejamos:
Com a aplicação deste sistema o PS teria 90 deputados, o PSD teria 60, o Chega teria 15, a IL teria 10, O Bloco teria 9, o PCP também 9, o CDS teria 3, o PAN teria 3 e o Livre teria 2. Os portugueses sentir-se-iam mais representados no parlamento.
Imaginemos o caso do CDS que será porventura o mais flagrante em termos de desperdício de votos. Os três deputados a que tem direito pelo acumular de votos no partido poderiam ter sido eleitos nos distritos de Lisboa, Leiria e Viana do Castelo, por exemplo, pois atenderiam aos três critérios, número de habitantes, número de votos, percentagem de voto e lugares por ocupar.
Em súmula, os portugueses eleitores escolheriam o partido que queriam ver representado na Assembleia da República. Se não conseguissem eleger no seu distrito, por questões que lhes são alheias, saberiam que esse voto iria ajudar o partido e a sua representação parlamentar em defesa do seu programa eleitoral com a eleição de deputados, fosse do seu distrito ou de outros. Melhor que não ter nenhum, mesmo depois de ter votado.
Este exemplo, que carece de óbvia contra-argumentação, ajustes e debate, pode servir de, mais não seja, base para uma discussão séria e pública.
A par destas alterações considero importante que se torne obrigatório que cada partido, a par da apresentação do seu programa, indique o número e nome dos ministérios que pretende formar assim como os nomes dos ministros para cada um deles, que podiam ou não constar nas listas de deputados, mas seria uma forma clara de se apresentarem ao país.