Pedro Bacelar de Vasconcelos, constitucionalista e um dos principais dirigentes do novo PS de António Costa, defende o fim da eleição direta do Presidente da República.

“Advogo há muito a abolição da eleição direta do Presidente, por sufrágio universal, e a extinção das suas atribuições atuais para demitir o Governo e dissolver a Assembleia da República”, afirma, num artigo publicado esta sexta-feira no JN. Segundo este socialista que foi escolhido no último domingo para integrar o órgão mais restrito da direção de António Costa, o secretariado, o sistema semipresidencial está “notoriamente obsoleto e permanece mumificado” na Constituição.

É um sistema “que impõe aos titulares das funções executivas e à representação parlamentar a tutela paternal de um Presidente que não governa nem deve governar, que perturba o apuramento das responsabilidades políticas dos governantes e que promove a opacidade e a confusão de funções políticas de natureza contraditória ou inconciliável”, defende.

Segundo Bacelar Vasconcelos, “o aprofundamento da democracia e a reforma das instituições democráticas nada têm a esperar da intervenção messiânica de um qualquer Presidente”.

Ao Observador, o socialista explicou que defende um modelo mais próximo do alemão, em que o Presidente é eleito por uma maioria qualificada dos deputados. “Há várias hipóteses e também têm a sua legitimidade”, afirma.

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Ressalvando estar a falar a título pessoal e não enquanto dirigente máximo do PS, o constitucionalista resolveu escrever sobre este assunto devido à “contaminação” entre as eleições legislativas e presidenciais, que, a seu ver, já se verifica. “Há um cruzamento perverso sobre a escolha nas eleições presidenciais e o tipo de governação que se pretende”, explica, acrescentando que o atual sistema “favorece a infantilização dos dirigentes partidários”.

No texto de opinião no JN, diz mesmo que “as movimentações a que assistimos em torno da sucessão de Cavaco Silva, independentemente da sua pertinência ou legitimidade, não devem perturbar os processos de formação da vontade popular que, através das eleições para a Assembleia da República, determinarão a seu tempo quais são as opções políticas preferidas e a quem caberá realizar as mudanças desejadas”.

E lembra que o semipresidencialismo português “cumpriu no passado um papel útil, na transição do poder militar para o poder civil e da legitimidade revolucionária para a normalidade democrática”, mas que, com a eleição de Mário Soares, em 1986, “ficou concluído esse processo longo e atribulado”. Hoje em dia, evidencia “desfasamento com as novas realidades políticas, alimentando efeitos perversos no funcionamento do sistema político, suscitando ambiguidades, perturbando a identificação das responsabilidades políticas próprias de legisladores e governantes, promovendo, enfim, a desresponsabilização da representação democrática que mina o prestígio dos partidos e promove a desqualificação das respetivas lideranças”.