No Agrupamento de Escolas de Benfica, em Lisboa, três turmas do sexto ano e uma do nono ainda estão à espera das aulas de compensação a matemática. Tal como neste agrupamento, outros 12 diretores escolares continuam a aguardar autorização por escrito do Ministério da Educação e Ciência para avançarem com as horas extra de compensação aos alunos que estiveram semanas sem professor, no caso das disciplinas sujeitas a exame no final do ano letivo.
“Muito antes de fazer os pedidos de compensação fui tentando colmatar as falhas a matemática com horas de apoio, dadas no âmbito por exemplo do projeto MATAP, mas que são dadas por professores de outras turmas. Eu não vejo isso como aulas de compensação. Para mim, aulas de recuperação são dadas pelos professores da turma em causa. Fez sexta-feira oito dias que me disseram que o meu pedido de autorização de horas extraordinárias estava despachado, mas ainda não me foram atribuídas horas, pelo que eu não posso arriscar sem ter uma resposta por escrito”, explicou ao Observador Manuel Esperança, diretor do Agrupamento de Escolas de Benfica, onde estavam em falta 35 docentes no início do ano.
“Gostava muito de começar o segundo período já com estas aulas de compensação a decorrer e assim também descansar mais os pais”, acrescentou o diretor Manuel Esperança, que em mais de 20 anos de direção escolar nunca assistiu a um arranque de ano assim.
Até quarta-feira da semana passada, 89 diretores de escolas tinham proposto ao Ministério da Educação planos de compensação com recurso a um total de 282 horas do crédito de cada instituição e solicitação de um crédito adicional de 732,5 horas ao Governo, adiantou fonte oficial do Ministério de Nuno Crato ao Observador. Ao todo, os planos propostos pelos diretores somam 1.014,5 horas de compensação aos alunos que estiveram sem professor no início deste ano letivo, por causa dos erros nas listagens da Bolsa de Contratação de Escola (BCE). A mesma fonte confirma que 13 continuam à espera de autorização e que “são pedidos ainda em análise que só ainda não foram despachados, mas serão”.
As aulas de compensação foram uma das soluções encontradas pelos diretores de escolas para remediar o problema criado pelos atrasos nas colocações e que deixaram milhares de alunos, nas poucas mais de 300 escolas com contrato de autonomia ou em territórios de intervenção prioritária (TEIP), sem professor durante semanas, no início do ano.
Pais e professores acham que dificilmente alunos ficarão em situação de igualdade
“Foi um período indesejável. A forma como se iniciou este ano letivo não abona a favor de ninguém e terá sempre um impacto prejudicial nos resultados dos alunos”, resumiu ao Observador Jorge Ascensão, presidente da Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap), que percebe o esforço das escolas para “tentar remendar” o problema, com as aulas de compensação, mas que acredita que “os alunos não vão estar em igualdade de circunstâncias” no final deste ano letivo, nem nos seguintes. “Isto pode ser uma solução em termos de resultados [nos exames] mas de aprendizagem não”, defendeu.
“A grande maioria das escolas encaixou as aulas de compensação nos intervalos dos horários, retirando espaço de estudo. Além disso não nos parece que haja consistência na aprendizagem. Desde logo quando as escolas dizem que apostam sobretudo nos anos e nas disciplinas com exame”, referiu Jorge Ascensão.
Também o docente César Paulo, presidente da Associação Nacional dos Professores Contratados, é da opinião que “por muito que se tente recuperar não há dúvida que vai haver uma grande desigualdade”. “Vamos chegar ao próximo ano e os alunos vão ter falta de pré-requisitos nas disciplinas em que não tiveram aulas de compensação”, antecipa.
A professora de Matemática e Ciências Maria João Cavalheiro, de 41 anos, foi uma das que, por causa dos erros na BCE, chegou já tarde à escola, em Portimão. Começou a dar aulas a duas turmas do sexto ano a 10 de outubro e tiveram logo início nessa altura as aulas de compensação de matemática. São mais dois tempos de 45 minutos por semana a acrescer aos seis que têm normalmente. “Boa vontade têm eles, mas com as dificuldades que têm é complicado”, declarou Maria João, defendendo o adiamento dos exames do 4º e do 6º anos, para depois do término das aulas. Uma medida que o ministro da Educação tem vindo a afastar.
No Agrupamento de Escolas Costa Matos, em Vila Nova de Gaia, três turmas do sexto ano estão a ter mais uma aula de português por semana, o que se irá prolongar até ao final do ano letivo. “O feedback tem sido positivo porque é só uma aula por semana. Os pais aceitaram e os alunos também”, resumiu o diretor Filinto Lima, também vice-presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos de Escolas Públicas. Determinado pela busca da equidade, o diretor refere que “só na altura dos exames saberemos se conseguimos ou não” alcançar essa igualdade entre os alunos.
Manuel Esperança, diretor do Agrupamento de Escolas de Benfica, frisou que também no seu agrupamento estão a trabalhar para que “os estragos não se façam sentir muito”, embora admita que “estas seis semanas em que não houve aulas vão fazer falta”.
Nas disciplinas não sujeitas a exame não há regra estabelecida
E se, no imediato, perante a dimensão do problema, os diretores de escolas se concentraram nas disciplinas que estão sujeitas a exame no final do ano letivo, procurando arrancar com as aulas de compensação semanais, a verdade é que não esquecem as restantes disciplinas.
“Cada escola e conselho pedagógico vão ter de debruçar-se sobre esta situação. Não queremos que esses alunos sejam prejudicados nas aprendizagens. Estamos a estudar qual a melhor solução, sendo que não acho possível dar aulas de compensação a todas as disciplinas”, referiu Filinto Lima, sem apontar ainda uma medida.
Já Manuel Esperança avança com uma das estratégias a utilizar: demorar menos tempo a dar certas matérias “que não sejam assim tão fundamentais nos anos seguintes”, por exemplo.
Sandrina Azoia leciona uma das disciplinas que não está sujeita a exame: francês. Só foi colocada numa escola da Amadora no final de outubro e dá aulas a quatro turmas, de 7º e 10º anos. Como não está a dar aulas de compensação e só conseguiu fazer um teste este período, a docente revela que não quer prejudicar ninguém e por isso “àqueles alunos que estão no limbo, vou-lhes dar positiva, sendo que já os avisei que no segundo período vou ser mais rígida”.
Sem regras estabelecidas em relação a estas disciplinas, pais e professores sublinham os problemas que podem vir a ser criados ao nível da aprendizagem das matérias, com reflexos nos anos seguintes. Já os diretores de escolas tentam minimizar as preocupações e lembram que tudo está a ser feito para que os alunos cheguem em pé de igualdade ao final do ano. Certo é que o primeiro período deste ano letivo termina com os alunos em etapas de aprendizagem diferentes.