Mário Soares com um cravo vermelho que faz as vezes de chapéu de chuva. Angela Merkel vestida com as cores da Europa e a águia da bandeira alemã no braço (ou será um abutre?), o Papa Francisco com o equipamento de guarda-redes do clube argentino San Lorenzo de Almagro, Eusébio prestes a chutar o mundo e Obama com umas orelhas tão grandes que parecem asas. Estes são os cinco “Figurões” que a Fábrica Bordallo Pinheiro acaba de lançar em cerâmica, numa nova coleção que “retrata as grandes personagens nacionais e internacionais do nosso tempo, num divertido equilíbrio entre sátira e admiração”.

As palavras são de Lázaro Sousa, presidente do concelho de gerência da Fábrica Bordallo Pinheiro, que apresentou a novidade no salão nobre da Assembleia da República, em Lisboa. António, cartoonista português responsável pelo desenho das peças, acrescenta: “Apresentar figurões numa casa de figurões é bom.” Como quem diz: esta louça não racha com humor, foi cozida com ele nos fornos das Caldas da Rainha.

“A palavra figurões aqui tem um cariz positivo, não negativo”, continua o diretor do World Press Cartoon. “Eu gosto das pessoas que desenhei. Talvez no caso de Angela Merkel… bom [risos]. Um caricaturista também tem de ser todo o terreno. E não se pode fazer uma coleção de cinzentões. Eu de cinzentões tenho medo, no desenho e na vida real.”

Mário Soares (2) - Cópia

Mário Soares é apresentado com o maior símbolo do 25 de abril.

Vendidas a partir de hoje na rede de lojas Vista Alegre e online, com preços que variam entre os 175 e os 240 euros, as peças da coleção Os Figurões — traduzida para “The Big Shots”, em inglês –, são acompanhadas por textos de João Quadros e Rui Zink, num casamento humorístico entre desenho, texto e cerâmica. A iniciativa, que deverá dar origem a outras séries de personalidades, pretende assim “dar vida nova e continuidade à genialidade de Rafael Bordallo Pinheiro na área da caricatura e sátira social”, diz Lázaro Sousa, acrescentando: “Realizar uma coleção de caricatura só é possível por vivermos num estado democrático e de pensamento livre. Seria impossível fazê-lo desta forma no tempo de Rafael Bordallo Pinheiro.”

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No tempo de Rafael Bordallo Pinheiro (1846-1905), que abriu a fábrica de faianças artísticas nas Caldas da Rainha em 1884, era o português a ganhar direito a figura de loiça, com o famoso Zé Povinho sempre de boca aberta (ou braço espetado) perante mais e mais impostos. “O Rafael Bordallo Pinheiro é o ídolo de todos os cartoonistas portugueses e dos poucos autores que se aproximou de um patamar de genialidade”, diz António, que aqui aproveitou dois cartoons que já tinha desenhado para o Expresso — o de Angela Merkel e o de Barack Obama — e pensou os restantes diretamente para cerâmica.

“A cerâmica acaba por ser uma síntese diferente do cartoon“, diz o caricaturista em declarações ao Observador. “A esmagadora maioria do desenho capta um momento específico, e por isso não serve, não tem a durabilidade que se pede a uma peça de cerâmica. Pensar para cerâmica é tentar fazer qualquer coisa que segure bem o personagem, sem ter em linha de conta qualquer acontecimento preciso, envolvente ou momentâneo.”

Pode ler os comentários do cartoonista a cada peça na fotogaleria.