O presidente francês François Hollande foi acusado de trair os “valores da esquerda e da República Francesa”, por querer avançar com uma medida que prevê a perda da cidadania francesa para os cidadãos com dupla nacionalidade condenados por terrorismo.

Segundo conta o jornal The Guardian, historiadores, políticos e alguns membros do Partido Socialista do país criticaram a ideia por promover “uma divisão fundamental do povo francês em duas categorias, contra o espírito da Constituição francesa”, resume Jacques Toubon, ex-ministro da Justiça e atual consultor constitucional para direitos civis.

Para Anne Hidalgo, presidente da Câmara de Paris, a medida não vai “contribuir em nada à luta contra o terrorismo”.

A ministra da Justiça, Christiane Taubira, disse esta semana a uma rádio argelina citada pelo Guardian que a medida “representa um problema fundamental em termos de direitos nacionais por local de nascimento”.

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Outro crítico da ideia é Pascal Cherki, membro do conselho Nacional do Partido Socialista francês. O político afirmou esta quinta-feira à rádio RMC que votará contra a proposta e que não entende “como um partido de esquerda pode criticar [os partidos de] a extrema-direita e apropriar-se de uma medida deles”. E remata: “Vou tentar levar esta defesa com toda convicção ao máximo de membros republicanos da esquerda e direita para que se oponham a esta lei que põe em causa o direito de solo no nosso país”.

Eva Joly, magistrada francesa membro do Partido Verde francês, concorda com Cherki. “É uma medida sem significado prático que não vai combater o terrorismo. É puramente simbólica e política. É revoltante. Vejo isso como uma maneira de dividir os franceses e sacrificar os nossos valores”, defendeu em citação do Guardian.

Mas a medida conta com o apoio popular. De acordo com uma sondagem realizada pelo instituto Elabe em novembro, 94% dos franceses apoia a perda da cidadania francesa para os cidadãos com dupla nacionalidade que forem condenados por terrorismo. A pergunta foi feita a mil pessoas através da Internet.

Outro defensor da ideia é o primeiro-ministro francês, Manuel Valls, que afirmou esta quarta-feira após uma reunião do Conselho de ministros que a “medida era uma ‘multa pesada’ que poderia ser legitimamente usada contra aqueles que traíram o estado ao pegar em armas contra companheiros cidadãos”.

Segundo as contas do jornal The Guardian, há cerca de 3,3 milhões de franceses com dupla nacionalidade a viver no país. A Constituição francesa atual prevê que apenas cidadãos naturalizados que adquiriram dupla nacionalidade dez anos antes de cometer um crime grave podem perder a dupla cidadania. A lei não inclui cidadãos com dupla nacionalidade nascidos em França.

A medida de Hollande será debatida no Parlamento francês em fevereiro de 2016 e faz parte de um conjunto de alterações que o primeiro-ministro quer fazer na Constituição do país com o objetivo de impedir novos ataques terroristas ao país.