Juntam-se três antigos ministros dos Negócios Estrangeiros de Portugal e a conclusão é a mesma: a União Europeia está em perigo e Portugal tem um papel central, “não periférico”, na resolução dos problemas europeus. O panorama pintado por Luís Amado, Paulo Portas e António Monteiro é “dramático” em relação ao futuro do projeto europeu e nenhum destes antigos chefes da diplomacia nacional se arrisca a traçar cenários para os próximos tempos. “Não temos recuo, não é possível desconstruir este processo de construção europeu e à nossa frente há opções dilemáticas“, afirmou Luís Amado.

“Vivemos um dos momentos piores e mais preocupantes na construção europeia. Tem défice de lideranças e nenhum Estado-membro consegue imaginar qual é o dia seguinte”, disse Paulo Portas, falando em conjunto com Luís Amado e António Monteiro nas Conferências de Lisboa que decorrem na Fundação Calouste Gulbenkian. Apesar de o tema ser o papel de Lisboa na globalização, as intervenções alertaram para os perigos urgentes na União Europeia e crise dos refugiados, referendo no Reino Unido e antagonismo face à Rússia marcaram a conversa entre os três antigos ministros dos Negócios Estrangeiros.

Há uma disfuncionalidade política na Europa e a disfunção do sistema de decisão na UE não é compatível com moeda comum, nem com Schengen“, afirmou Luís Amado, que integrou o Executivo socialista de José Sócrates. O antigo governante e ex-presidente do Conselho de Administração do Banif, disse que a política europeia “ficou na mão do ativismo político” e que o exercício da política “exige ponderação e recuo estratégico”. Mesmo a política monetária europeia se está a esgotar, acrescentou, já que mesmo os “coelhos da cartola” de Mario Draghi já não são suficientes para acalmar os mercados.

A todos os problemas políticos e geoestratégicos, Paulo Portas acrescentou ainda a questão do decréscimo da competitividade da Europa no Mundo. Para o antigo líder do CDS, há um problema na Europa em relação aos “direitos adquiridos” e que “qualquer situação rígida leva a défice de competitividade”. “Eu acho que começa a existir um problema cultural sério de como a Europa encara globalização”, disse Paulo Portas.

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Portugal: um país que pode gerar consenso dentro e fora da UE

O embaixador António Monteiro, antigo ministro dos Negócios Estrangeiros de Santana Lopes, considera que, apesar destas dificuldades, Portugal mantém uma posição chave no mundo e um capital de simpatia internacional. Isto é visível, segundo o embaixador, na candidatura de Guterres a secretário-geral da ONU: “É positiva para Portugal, porque estamos a ver como a grande maioria dos países nos olha como parceiro credível”. Portugal é ainda um país onde impera o “consenso”, já que não se vivem clivagens ideológicas relevantes. “Os fatores fundamentais da Política Externa Portuguesa são de consenso nacional”, considerou.

A tradição diplomática de Portugal foi também elogiada por Paulo Portas. “Portugal tem tradição diplomática muito boa, senão não seria possível projetar portugueses para tantos cargos e tantos serem candidatos a postos de relevância internacional“. O antigo vice-primeiro-ministro com a pasta da diplomacia económica referiu que Portugal conhece o Magrebe, tem “tradição de tolerância religiosa” e mantém relações privilegiadas com países como a China.

Já Luís Amado salientou que Portugal só pode ser considerado periférico numa “inserção restritiva apenas da União Europeia”. “Portugal tem que assumir protagonismo mais ativo na sua inserção neste sistema e dar contributo para o reequilíbrio do sistema internacional“, afirmou o antigo ministro socialista. Neste sentido, Luís Amado e outros organizadores das Conferências de Lisboa querem lançar o conceito do Clube de Lisboa, um fórum de discussão que pretende colocar a capital lusa no centro do debate sobre o futuro da globalização, promovendo estas conferências no calendário internacional que já incluiu encontros como os que acontecem em Davos.