Os bancos a operar em Portugal emprestaram em junho 587 milhões de euros em novas operações de crédito à habitação. É o valor mais elevado desde os 598 milhões de março de 2011, o mês que antecedeu o pedido de resgate à troika. O montante mensal em novos empréstimos, que eleva o total do ano para 2.700 milhões, mostra que o mercado imobiliário está a encontrar no crédito bancário um suporte para uma recuperação dos preços.
Segundo dados divulgados esta terça-feira pelo Banco de Portugal, o crédito à habitação teve em junho o melhor mês desde março de 2011. O total anual, isto é, dos seis meses até junho, ascende a 2.700 milhões de euros, um valor que contrasta com os 1.665 milhões emprestados nos primeiros seis meses de 2015.
Os valores continuam a ser frações do ritmo mensal a que se concedia crédito antes da crise, mas os números mostram uma recuperação clara face aos níveis de 2012-2014.
Porque estamos a ver mais crédito? Será que os bancos estão mais disponíveis para emprestar ou estarão as pessoas a procurar mais?
“Ambos”, disse em junho Miguel Poisson, diretor-geral da imobiliária ERA, em declarações por e-mail ao Observador. “Existe uma maior confiança na classe média para voltar a comprar habitação”, afirma o especialista. Algo que, para o economista-chefe do Montepio, Rui Bernardes Serra, é natural: “a dupla recessão que Portugal atravessou entre 2008 e 2013 teve impacto quer na procura, quer na oferta de crédito. Com o nível de taxas atualmente praticado e com a recuperação da economia a redução da taxa de desemprego e a subida da confiança dos consumidores, é normal que a procura por habitação própria suba”.
Os dois especialistas falaram numa melhoria das condições (pelo menos, melhoria percecionada) para a compra de habitação, que, assim, se torna uma maior alternativa ao arrendamento e a outras circunstâncias de vida que marcaram os anos piores da crise. Rui Bernardes Serra lembrou que “é um facto estilizado internacional que, durante as recessões, o número de pessoas por fogo tende a subir”.
Miguel Poisson, da ERA, acrescentou, porém, um outro fenómeno: a “segunda habitação volta a estar na mira de muitos portugueses que compram com recurso a crédito (depois de uma fase mais difícil nos anos 2011 a 2014, em que muitas habitações secundárias foram vendidas para fazer face às dificuldades do contexto de crise)”.
Essa compra de uma habitação suplementar pode ser para usufruto das famílias mas, por outro lado, pode ser um investimento, com recurso a crédito bancário. E é aqui que chegamos a uma outra explicação para a subida do crédito: muita da concessão de crédito que está a ser feita não é para famílias que compram primeira habitação, deixando o arrendamento, ou que trocam de casa por um imóvel maior, à medida que a família aumenta.
Muito do crédito que está a ser concedido está ligado ao investimento de quem tem poupanças e poucas alternativas rentáveis para as investir. Foi isso mesmo que indicou um gestor de conta de um banco a operar em Portugal: boa parte (é difícil quantificar exatamente que percentagem) dos créditos que estão a ser concedidos são a pessoas que têm uma grande fatia para dar de entrada inicial — metade do valor, por exemplo –, pedem o restante ao banco e adquirem a casa para investimento.
O diretor-geral da ERA confirmou que é isto que se passa, no terreno. “Como os depósitos a prazo geram juros inferiores a 1%, muitos portugueses (e também estrangeiros) têm investido no mercado imobiliário”.