Vinte anos depois de a mediática visita de Diana de Gales ao Huambo ter colocado a desminagem em Angola como objetivo internacional, as organizações não-governamentais que trabalham no país enfrentam uma crise de financiamento que ameaça o processo.

É o caso da britânica Halo Trust, que tem hoje no terreno, entre as províncias do Huambo e do Cuando Cubango, 13 equipas, de sapadores, inspeção e destruição de armas, munições e engenhos explosivos, envolvendo cerca de 220 trabalhadores.

Valdemar Fernandes, chefe de operações da Halo Trust em Angola, recorda que em 2008 aquela ONG contava com 80 equipas e mais de 1.200 trabalhadores no terreno, pelo que o cenário atual, de falta de financiamento, coloca em causa a meta de concluir a desminagem do país até 2025.

“Vai-se atrasar mais para reduzirmos o nível de contaminação de minas no país. A desminagem é um processo lento, demorando e também oneroso, mas que no final os resultados são de louvar. Quando libertamos um campo para a população trabalhar é simplesmente fantástico”, explica o angolano, de 43 anos.

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A 15 de janeiro de 1997, quando Diana de Gales esteve no Huambo, a Halo Trust trabalhava já na desminagem do bairro de Santo António, na zona urbana da cidade, que foi então visitado pela princesa britânica, imagens que colocaram o assunto na agenda internacional.

Ali, recorda Valdemar Fernandes, registavam-se acidentes “quase diariamente”, por ser um campo “fortemente minado”.

“Hoje o bairro é uma área livre, está sendo habitado, com muitas construções. Valeu a pena”, atira, embora apreensivo com o futuro do trabalho daquela ONG, que hoje sobrevive apenas com o financiamento do Governo dos Estados Unidos da América — com a embaixada em Luanda a divulgar que manterá esse apoio — e da Suíça.

É que só em 2015, Angola perdeu 80% do apoio financeiro internacional às operações de desminagem, equivalente a 24,5 milhões de euros, segundo o último Relatório Minas Antipessoais, apesar de continuar entre os países de “contaminação generalizada”, ou seja com mais de 100 quilómetros quadrados do total do território.

Feliciano Tenete, 41 anos, deixou em 2007 as armas e foi para os campos minados ao serviço da Halo Trust. Entrou para as forças leais ao Governo, durante o conflito civil, em 1988, e agora diz que “defende” a população de outra forma, no Huambo. “Não tenho medo, temos material de proteção”, afirma o antigo soldado, recordando que agora o “tempo é de paz”.

Desde 1994, só a Halo Trust desminou em províncias do centro e sul de Angola 815 campos, numa área equivalente a 23 quilómetros quadrados, além de 5.595 quilómetros de estradas, tendo destruído, até final de 2016, um total de 93.536 minas e 163.496 engenhos explosivos não detonados, colocados ao longo do período de quase 30 anos de guerra civil no país.

Números oficiais do Governo angolano, que a par destas organizações também assegura operações de desminagem, indicam que o país ainda necessita de uma contribuição de mais de 275,2 milhões de dólares (quase 250 milhões de euros) para desminar o país até 2025, atualmente ainda com 1.435 áreas minadas.

Áreas de cultivo por desenvolver, comunidades sem acesso água potável ou caminhos que ninguém arrisca percorrer é ainda o cenário que várias províncias angolanas enfrentam atualmente, apesar do fim da guerra civil angolana em 2002.

Presente no Huambo para a cerimónia oficial que hoje assinala os 20 anos da visita de Diana de Gales, a responsável pelas operações em Angola da MAG (Mines Advisory Group), organização que tem a cabo a desminagem das províncias do Moxico, Luanda Norte e Lunda Sul, afirma que a “principal preocupação” atual é o financiamento.

Jeanette Dijkstra afirma que ainda é possível atingir o objetivo desminagem de Angola até 2025, mas só a MAG necessita de garantir 100 milhões de dólares de financiamento nos próximos oito anos, quando tem atualmente um orçamento anual que não passa os 2,5 milhões de dólares.

Por esse motivo, apesar de a organização estar pronta para avançar, ainda não avançou para a desminagem dos campos da Lunda Norte e Lunda Sul.

“Continuamos [em Angola] a ter um problema, mas já fizemos mais de metade do trabalho, não desistam [comunidade internacional] de nós agora. Precisamos de mais oito anos e [a desminagem] pode ser feita”, garante Jeanette Dijkstra.