A consola em filigrana, a cadeira de latão anos 30 e a mesa Gaudí coberta por 300 triângulos coloridos chamam a atenção de quem passa no salão 5 B da Maison & Object, em Paris. Árabes, chineses e egípcios param para ver. Elogiam a mesa de centro Eiffel e o sofá azul petróleo, inspirado no famoso Chesterfield, que ocupa quase metade do stand j25 no parque de exposições de Paris-Nord Villepinte. Sentam-se, tocam nos materiais e fazem perguntas. “É a Bessa Design, uma empresa made in Portugal”, diz João Bessa, CEO da marca, fazendo as apresentações.
É a primeira vez que o designer português exibe os seus produtos na conceituada feira de decoração e mobiliário da capital francesa. Trouxe 21 peças de arte e design com folhas de ouro, filigrana e mármores, entre outros materiais, para mostrar a designers de interiores, arquitetos e clientes de todo o mundo. “Tudo é feito à mão e por artesãos portugueses”, explica o designer de 28 anos.
Depois de ter trabalhado com marcas reconhecidas internacionalmente como a Boca do Lobo, João decidiu criar a Bessa Design, uma marca inovadora mas que evocasse sentimentos nostálgicos através do design. “As minhas peças contam uma história. Inspiro-me em situações do passado, em objetos que são familiares e que nos marcaram”, explica o jovem de 28 anos.
A consola de filigrana que acabou de apresentar na Maison & Object no passado mês de janeiro é um desses exemplos. Com técnicas de produção artesanais, Bessa guiou-se pela joalharia nacional como os corações de Viana e os brincos da rainha para criar esta peça de mobiliário. “É uma arte com quase cinco mil anos de história, mas uma parte desta técnica é muito portuguesa”, afirma. Andou à procura de um fornecedor que tivesse interesse em fazer um protótipo. “Exige um trabalho muito paciente, imaginativo e destreza. Mas o processo é incrível. Adorei fazer esta peça”, diz. Descobriu o fornecedor na Póvoa de Lanhoso, perto de Braga, onde tudo é produzido de forma manual sem qualquer tipo de moldes ou replicações.
João começou a desenhar as primeiras peças da Bessa Design em 2015. Fez alguns contactos, apostou na divulgação da marca, mas cedo percebeu que era preciso ir mais longe. “As feiras internacionais eram fundamentais para a validação do meu trabalho”, recorda. Procurou a Associação Portuguesa das Indústrias de Mobiliário e Afins (APIMA) para o apoiar numa exposição além-fronteiras com outras marcas nacionais.
Além de abrir portas, o selo da APINA permitia um retorno de 50 por cento do investimento da marca. Na feira imm Cologne na Alemanha, em janeiro de 2016, expôs alguns dos seus primeiros produtos como a Liberty. A cadeira de latão que lembra as formas esculturais dos anos 30 é um dos itens que desperta mais interesse em revistas do setor. “É a aliança perfeita de um estilo do vintage com a modernidade”, descreve o designer ao Observador. A peça é feita de materiais nobres e luxuosos como o latão, devidamente tratado com antioxidante.
Na feira alemã, os compradores vinham do Reino Unido, Estados Unidos, Abu Dhabi, Dubai e Kuwait. No entanto, o designer sentiu que era preciso incluir mais produtos no catálogo da Bessa Design para ganhar credibilidade do mercado. Precisava de arriscar e de investir. E, desta vez, sozinho. “A minha marca é um conceito forte de arte e design e não funciona com outras”, concluiu o designer.
Consciente do seu estilo próprio, regressou ao Porto e durante três semanas passou a desenhar e produzir dia e noite. ”Tinha que dar consistência e coerência à marca”, diz o autor que pretende recuperar as técnicas de artesanato que se perderam com a industrialização.
Como trabalhava com encomendas menores, a produção foi um dos entraves que encontrou. Os fornecedores não conheciam a Bessa Design, muito menos tinham interesse em produzir poucos exemplares. “Era muito difícil trabalhar porque eram coleções pequenas. Ainda por cima, ser um designer jovem não ajuda”, confidencia. Durante meses, correu quilómetros e quilómetros entre Braga, Póvoa de Lanhoso, Rio Tinto e Paços de Ferreira para encontrar os fornecedores das melhores madeiras, mármores, vidros, latão e inox para as suas peças. “Chegava a fazer quase 100 quilómetro por dia, simplesmente para ir cumprimentá-los.”
Voltou a falar com a APINA e inscreveu-se na 100% Design, em Londres, umas das feiras importantes no mercado europeu e mundial, em setembro de 2016.
O Reino Unido continua a ser indiscutivelmente a melhor plataforma. Compra para o mercado interno e vende muito aos países árabes”, explica o designer. “Conheci um decorador de interiores londrino que me encomendou três sofás para um cliente em Singapura. Tudo por WhatsApp”, conta.
Para comemorar o primeiro aniversário da marca, Bessa criou uma peça exclusiva de edição limitada inspirada no design de Antoni Gaudí. “É um tributo ao artista”, explica João. A mesa é feita de 100 quilos de latão maciço e remete para a fachada arquitetónica da Casa Batló, em Barcelona.
O primeiro protótipo levou quase um ano a ser produzido, devido à complexidade da peça. Hoje são só três meses. “É a chamada peça de revista, que chama atenção”, descreve o autor. A mesa encontra-se coberta por 300 triângulos, sendo que cada um deles foi manualmente trabalhado com prata e folha de ouro e pintado artisticamente. Um trabalho exclusivo que se destaca das peças de móveis convencionais. Custa 18 mil euros.
Além destes itens exclusivos, o catálogo da Bessa Design conta ainda com uma linha de peças mais correntes, a começar nos 1.800€ por produto. É o caso das mesas Shy, feitas de folha de prata com um anel interno em madeira que tenta recriar o estilo Rococó.
Além de desenhar e produzir as peças, João escreve os press releases, envia as newsletters para os média, faz contactos com os comerciais e visita fornecedores. Tudo sozinho. “A marca está a crescer e precisa de toda a minha dedicação”, frisa. Em dezembro de 2016, a revista nova-iorquina Design Live Network elegeu a Bessa Design a melhor marca de mobiliário de 2016.Com um investimento anual de 100 mil euros, o lucro que tem vai para novos investimentos, pagar fornecedores e manter a marca ativa nas redes sociais.
Só no último ano, as peças da Bessa Design saíram em 80 publicações internacionais de design e arquitetura. Cá, não chegaram às 10. João acredita que há compradores portugueses mas que primeiro precisa de ser reconhecido lá fora. “É assim que funciona”, diz. Mesmo assim, não desiste.
“Tenho orgulho no meu país. Quero trabalhar sempre com Portugal. Vender para fora mas produzir tudo aqui e, se pudermos, com técnicas tradicionais portuguesas.”
Para 2017, o responsável quer ver a Bessa Design em voos mais altos. Em fevereiro abrirá o primeiro showroom da marca, no Porto, para dar resposta aos pedidos dos clientes. Irá ainda criar seis postos de trabalho para a área do marketing, comercial e design e apostar em novos mercados. “Os objetivos são puxados, ambiciosos, mas será o ano da consolidação da marca”, reforça, avançando que pretende encerrar 2017 com um lucro de 250 mil euros.
Depois de Paris, João Bessa voltou à sua rotina. Está em negociações para entrar com um parceiro no Salão Internacional do Móvel de Milão, em abril. Na agenda, há ainda a 100% Design em Londres, em setembro. “Paris, Milão e Londres são as três feiras obrigatórias”, afirma. No meio, tem previsto lançar mais 19 peças, inspiradas na cultura clássica com caras dos deuses gregos e um espelho grandma, inspirado em novelos de lã. “Quem não teve uma avó que sabia tricotar e andava com os novelos atrás?”, pergunta. Contas feitas, quer acabar o ano com uma coleção de 40 peças.
Até lá, há que gerir o portfólio de clientes russos, marroquinos, chineses e árabes e os novos contactos trazidos de Paris, incluindo um egípcio que chegou ao stand e quis levar tudo. “Peças, cortinas, tapete e até o papel de parede. Disse que queria uma divisão igual àquela em casa”, conta.
Nome: Bessa Design
Data: 2015
Pontos de venda: Através de contacto feito pelo site
Preços: De 1.800€ a 18.000€ (todas as peças podem ser personalizadas com cor, materiais, acabamentos e tamanhos)
100% português é uma rubrica dedicada a marcas nacionais que achamos que tem de conhecer.