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D. Teresa (1078?1080?-1130)

Se D. Afonso Henriques foi o pai da Pátria, D. Teresa foi a “avó” de Portugal. Durante séculos, a filha de Afonso VI, rei de Leão e Castela e imperador da Hispânia, foi vítima de uma “lenda negra” destinada a diminuir a sua importância histórica. Talvez porque, sendo mulher, desempenhou um papel activo na política do seu tempo.

Depois de enviuvar, D. Teresa continuou a desenvolver o projecto do seu marido D. Henrique visando o alargamento e a autonomia do condado Portucalense, no âmbito da Reconquista Cristã da Península Ibérica. A derrota na batalha de S. Mamede significou o fim do seu poder pessoal e da aliança táctica com os nobres galegos – mas o seu filho D. Afonso Henriques cumpriu o objectivo estratégico: a independência de Portugal.

Rainha Santa Isabel (1269?1271?-1336)

O milagre das rosas foi um “remake” do praticado pela sua homónima tia-avó da Hungria – mas, para lá de ter sido canonizada pelo Papa Urbano VIII em 1625, a Rainha Santa deixou um legado político e social assente nas ideias de paz e caridade.

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A influência conciliadora de D. Isabel de Aragão foi decisiva para a assinatura do Tratado de Alcanizes, em 1297, que fixou as fronteiras entre Portugal e Castela. Voltou a dar provas de habilidade diplomática quando, em conjunto com o marido, D. Dinis, arbitrou o conflito entre Castela e Aragão, em 1304. Foi ainda intermediária na guerra civil que opôs D. Dinis ao filho de ambos, o futuro rei D. Afonso IV, entre 1322 e 1324.

D. Isabel usou boa parte da fortuna pessoal para praticar obras de caridade: foi do seu celeiro que saiu a farinha destinada a alimentar os pobres durante a grande fome que assolou Coimbra em 1293 (provável origem da versão portuguesa do milagre das rosas). Também pagava os dotes de raparigas pobres e a educação dos filhos de fidalgos sem posses. Fundou vários hospitais e conventos.

Inês de Castro (1325-1355)

A história de Pedro e Inês inspirou poetas que a transformaram num dos grandes mitos portugueses: o amor proibido que acabou de forma trágica, com um assassínio por ordem real, à frente dos filhos; a vingança cruel do amante enlouquecido pela dor; o beija-mão macabro ao cadáver daquela que “depois de morta foi rainha”.

Por trás da lenda, a realidade. A «união de facto» entre o príncipe herdeiro (viúvo) e a antiga aia da sua mulher tornou-se uma questão de Estado porque ameaçava arrastar Portugal para uma guerra com Castela, devido ao envolvimento da família Castro nos conflitos dinásticos locais e à sua crescente influência na corte portuguesa. Inês foi julgada, condenada e executada. Mas entre os factos e os versos de Camões, a História não hesitou…

Deuladeu Martins (século XIV)

Fazer das fraquezas forças e animar a resistência de uma comunidade contra um inimigo poderoso é a lição da lenda de Deuladeu Martins, heroína imortalizada no brasão de Monção.

Segundo a tradição, Deuladeu era mulher do capitão-mor daquela vila minhota durante as guerras entre D. Fernando e Henrique II de Castela, na segunda metade do século XIV. Na ausência do marido, chamado ao serviço do rei, ela não hesitou em assumir o comando dos defensores quando um exército castelhano vindo da Galiza pôs cerco a Monção. Mas a bravura de que deu provas parecia insuficiente para fazer frente à fome que, com o prolongamento do cerco, ameaçava os sitiados. Foi então que Deuladeu mandou cozer a última farinha que restava, atirando os pães do alto das muralhas, para enganar o inimigo. Os castelhanos acreditaram que Monção vivia na fartura e acabaram por levantar o cerco.

O tema do pão atirado pelos habitantes de uma cidade cercada para enganar os atacantes remonta ao poeta latino Ovídio, que relata nos “Fastos” como os romanos cercados pelos gauleses usaram essa astúcia, levando os sitiantes a retirar, convencidos de que nunca conseguiriam conquistar Roma pela fome. Ao longo dos séculos, a mesma lenda foi adaptada a diferentes cenários.

D. Filipa de Lencastre (1360-1415)

Neta de Eduardo III de Inglaterra, D. Filipa de Lencastre recebeu uma educação esmerada, beneficiando do facto de a mãe ter sido uma das primeiras damas inglesas a saber escrever. O pai, John of Gaunt, duque de Lancaster, foi não só um temido chefe militar na Guerra dos Cem Anos e político influente na corte, mas também um protector das artes. O escritor Chaucer e o cronista Froissart eram frequentadores dos seus palácios.

Inês de Castro inspirou poetas; D. Isabel de Aragão foi decisiva para a assinatura do Tratado de Alcanizes; e D. Teresa deu continuidade ao alargamento do condado Portucalense

Quando Filipa se casou, aos 27 anos, com D. João I, trouxe para Portugal os “perfeitos costumes” (como lhes chamou Fernão Lopes), que presidiram à educação dos filhos no sentido do dever e da excelência. D. Duarte foi rei e escritor; D. Henrique impulsionou os Descobrimentos; D. Pedro viajou pela Europa, escreveu e governou como regente; D. Fernando, o “Infante Santo”, fez o último sacrifício no cativeiro marroquino. Os filhos de D. Filipa passaram à história como a “ínclita geração”.

D. Leonor (1458-1525)

Fundadora das Misericórdias, a maior rede de assistência social do país, há mais de cinco séculos, a rainha D. Leonor ficou, apesar disso, marcada por uma “feíssima falta de caridade”, como lhe chamou o historiador Anselmo Braamcamp Freire: deixou o marido, D. João II, morrer sozinho.

D. Leonor vivia há muito destroçada pela morte do irmão, apunhalado pelo próprio rei, e do filho, da queda de um cavalo. Sofreu ainda a mágoa de ver o marido tentar, com insistência (embora sem êxito), legitimar um bastardo.

Viúva aos 37 anos, a irmã do novo rei D. Manuel I tornou-se uma das pessoas mais ricas de Portugal. Passou os 30 anos seguintes a fundar obras de assistência aos pobres e doentes: hospitais, albergarias, conventos e igrejas. Além das Misericórdias.

D. Filipa de Vilhena (?-1651)

Filha do conselheiro de Estado D. Jerónimo Coutinho e viúva de D. Luís de Ataíde, conde de Atouguia, D. Filipa de Vilhena passou à história como o exemplo de mãe capaz de fazer o sacrifício maior: mandar os filhos morrer se for preciso pela liberdade da pátria.

Informada da conspiração marcada para 1 de Dezembro de 1640, D. Filipa incitou os seus dois filhos, D. Jerónimo de Ataíde e D. Francisco Coutinho, a participarem na revolta contra o domínio espanhol. Ela própria lhes entregou as armas e exortou-os a lutarem pela restauração da independência de Portugal.

Marquesa de Alorna (1750-1839)

Poetisa e escritora, figura maior da cultura portuguesa, Leonor de Almeida Portugal de Lencastre e Távora foi testemunha de alguns dos acontecimentos mais trágicos da nossa história, como o terramoto de 1755, o processo dos Távora ou as invasões francesas.

Recusou vergar-se ao despotismo do Marquês de Pombal, à tirania de Pina Manique, à autoridade do pai, à vontade do marido e aos caprichos dos amantes. Conspirou pela liberdade, foi exilada e conheceu durante as suas viagens alguns dos protagonistas da Europa das Luzes e do romantismo, que ajudou a introduzir em Portugal.

D. Carlota Joaquina (1775-1830)

Uma das mulheres mais odiadas da História de Portugal, a rainha D. Carlota Joaquina pagou cara a ousadia de ter desempenhado um papel activo na política, num mundo dominado por homens. Com uma agravante: esteve sempre do “lado errado da história”, isto é, do lado dos vencidos. E como a história é contada pelos vencedores, estes não lhe perdoaram, pintando-a com as cores negras que chegaram até hoje. Feia de meter medo, ninfomaníaca, adúltera, ignorante, fanática… a diabolização foi total.

D. Leonor fundou as Misericórdias; D. Filipa de Vilhena incitou os filhos à revolta contra Espanha; a Marquesa de Alorna conspirou pela liberdade

Na verdade, o seu grande pecado foi a ambição. Quis conquistar o poder — e perdeu. Na “Conspiração dos Fidalgos” em 1805, contra o marido; na tentativa de se tornar rainha das colónias espanholas do Rio da Prata, quando o pai (Carlos IV de Espanha) e o irmão (Fernando VII) estavam presos por Napoleão, entre 1808 e 1814; por fim, ao apostar no filho mais novo, D. Miguel, e na causa absolutista contra os liberais.

Carolina Beatriz Ângelo (1877-1911)

Pioneira do feminismo sufragista, foi a primeira mulher a praticar cirurgia e a exercer o direito de voto em Portugal. Em 1902, Carolina Beatriz Ângelo foi a primeira médica portuguesa a operar no Hospital de S. José, em Lisboa, sob a orientação de Miguel Bombarda. Membro da Maçonaria e da Liga Republicana das Mulheres Portuguesas costurou, juntamente com Adelaide Cabete, a bandeira da República hasteada em 5 de Outubro de 1910.

Com base na sua situação de viúva e mãe — chefe de família, portanto –, requereu a inscrição como eleitora para a Assembleia Constituinte, em Maio de 1911. O requerimento começou por ser recusado, mas Carolina Ângelo recorreu e ganhou, tornando-se a primeira mulher portuguesa a votar. Morreu poucos meses depois, com apenas 33 anos.

Para evitar a repetição do atrevimento, Afonso Costa fez publicar um novo Código Eleitoral que clarificava o que o novo regime entendia por “cidadãos eleitores”, acrescentando a expressão “do sexo masculino”.

João Ferreira é doutorando em História e Teoria das Ideias na FCSH/Universidade Nova de Lisboa. Autor de “Histórias Rocambolescas da História de Portugal”, “Histórias Bizarras de um Mundo Absurdo” e “500 Frases que Mudaram a Nossa História”.