Das mais de 200 mil pessoas que visitam o Mosteiro de Alcobaça todos os anos, poucas saberão da guerrilha digna de filme que acontece no interior de um dos principais monumentos do país quando as portas fecham ao público.
O padre local, Ricardo Cristóvão, responsável pelo culto religioso no mosteiro, queria muito que os paroquianos e os visitantes pudessem ver o sacrário que está dentro da Capela do Senhor dos Passos. Mas havia um problema. Uma porta de madeira maciça impedia esse desejo. Cansado de esperar pela luz verde da Direção-Geral do Património Cultural (DGPC), o padre decidiu resolver o assunto. Mandou abrir a porta de madeira e pôr uma porta de vidro no interior. A DGPC não gostou nada da atitude do padre, que acusa de ter mandado colocar a porta durante a noite.
E aqui começou uma guerra de cartas, ordens e desordens. De tal maneira, que o assunto teve honras de petição pública e chegou ao ministro da Cultura pelas mãos de deputados do PS. O Patriarcado de Lisboa teve de intervir. E há uma petição a exigir que a porta de vidro regresse.
A polémica da porta foi na verdade a gota de água na difícil convivência entre paróquia e o Estado em Alcobaça. Os problemas não se esgotam ali.
A porta de vidro
A história da porta de vidro remonta a 2014 (ainda antes da mudança de diretor do mosteiro), ano em que o padre Ricardo Cristóvão, pároco do Santíssimo Sacramento de Alcobaça, visitou a catedral de Santiago de Compostela, em Espanha, e viu aquilo que podia solucionar um dos grandes problemas do seu mosteiro: a polémica questão do acesso à capela do Senhor dos Passos, onde está guardado o sacrário, poderia ser resolvida com a instalação de uma porta de vidro.
Em qualquer templo católico, o sacrário é o lugar mais importante e que merece maior veneração, explica o sacerdote ao Observador. É onde estão guardadas, em permanência, as hóstias consagradas que, de acordo com a doutrina católica, são o corpo de Jesus Cristo, sendo por isso um lugar de oração e de silêncio. “Mas, no mosteiro, o sacrário não é acessível, porque está dentro de uma pequena capela“, detalha o padre Ricardo Cristóvão.
Trata-se da capela do Senhor dos Passos, por trás da zona da capela-mor, que está fechada ao público com uma pesada porta de madeira. Em muitas igrejas e mosteiros, o sacrário está recolhido no fundo da capela-mor ou em capelas protegidas com pequenas cercas, permitindo o acesso visual aos visitantes, mas impedindo que as pessoas se aproximem. Isto porque o sacrário é também um dos objetos mais vandalizados nas igrejas (havendo inclusivamente quem force as portas do sacrário para roubar hóstias e as usar em rituais).
“O tipo de turismo que temos atualmente nos nossos monumentos não nos oferece segurança suficiente para deixarmos aquela capela aberta sem vigilância. Por isso, em algumas horas do dia temos lá voluntários que asseguram a abertura da porta e a segurança do local. Mas em grande parte do dia a capela tem de estar fechada e os visitantes católicos não podem visitar o sacrário”, lamenta o sacerdote.
O dilema perdurava há anos, mas quando Ricardo Cristóvão viu aquela solução em Santiago de Compostela pensou que finalmente iria conseguir “devolver aos paroquianos de Alcobaça o acesso ao sacrário”, bem como permitir que os milhares de turistas que visitam o monumento pudessem ver a Capela do Senhor dos Passos. Jorge Pereira de Sampaio, na altura diretor do Mosteiro de Alcobaça nomeado pela DGPC, concordou com a ideia, mas lembra hoje que não era dele que dependia a decisão.
“Nós, enquanto diretores dos monumentos, não podemos dar autorização para uma obra. Tem de ser a direção-geral a autorizar. O que foi feito na altura foi que, quando um subdiretor da DGPC visitou o mosteiro, já no final do meu mandato, eu lhe apresentei uma série de sugestões, entre as quais a da instalação da porta de vidro. Deu-se-lhe conta disso, como se deu conta de outras coisas, e ele mostrou abertura, mas não houve efetivamente qualquer tipo de autorização por escrito para a obra”, recorda Jorge Pereira de Sampaio ao Observador.
Pouco depois, Pereira de Sampaio deixou o cargo de diretor, tendo sido substituído por Ana Pagará, e não acompanhou o resto do processo, afirmando desconhecer como se desenrolou a polémica. Contactada pelo Observador para esclarecer se tinha conhecimento destas conversações e para explicar como ficou o processo da porta na transição de direções, Ana Pagará disse não estar “autorizada a prestar declarações à imprensa” e remeteu todos os esclarecimentos para a DGPC.
Motivado pela concordância do diretor anterior e pela aparente anuência do tal subdiretor da DGPC, o padre Ricardo Cristóvão decidiu pôr o projeto em prática e enviou uma carta à direção-geral a solicitar a instalação de uma porta de vidro. Os primeiros passos formais deram-se em março de 2015, quando o padre enviou uma carta ao diretor do Mosteiro de Alcobaça a informar que, “depois de escutados os anseios da população e daqueles que nos visitam”, lhe parecia “favorável” a instalação da porta, e a pedir uma apreciação por parte do responsável. Jorge Pereira de Sampaio, mesmo concordando com a instalação da porta, não deu a autorização necessária, uma vez que tal não dependia de si.
Também nesse mês, o padre Ricardo Cristóvão enviou aos serviços da DGPC uma proposta de orçamento realizada por uma empresa local, que já em outras ocasiões tinha instalado estruturas no mosteiro. A resposta, assinada por uma técnica superior da DGPC (e não por um responsável que pudesse autorizar a obra) e datada de 18 de março de 2015, foi simples: “Iremos dar seguimento ao assunto logo que seja possível”. Seria preciso esperar por uma resposta formal da direção-geral.
Contudo, “essa resposta nunca chegou”, diz o sacerdote. Por isso, a 30 de maio de 2016, a paróquia decidiu avançar unilateralmente com a colocação da estrutura de vidro na capela. “A porta foi instalada por opção nossa, sem recebermos autorização da DGPC“, reconhece Cristóvão, que acusa a atual diretora-geral da DGPC de não querer “dar continuidade ao compromisso assumido pela direção anterior”.
Nesse mesmo dia, Ricardo Cristóvão enviou um e-mail à diretora do Mosteiro de Alcobaça, que nesta altura já era Ana Pagará, a “informar que a partir deste dia 30 de maio, segunda-feira, estão criadas as condições de acesso aos fiéis para adoração e oração privadas na capela”. Graças a um grupo de voluntários que se disponibilizaram para o efeito, a capela estaria aberta entre as 10h e as 12h e entre as 15h e as 17h durante os dias de semana. “Nos restantes horários poderão os restantes visitantes dirigir-se a este local, sem contudo terem acesso ao seu interior, pela colocação de uma porta em vidro por empresa especializada em intervenções no património arquitectónico. Tudo conforme carta dirigida à direcção deste mosteiro há mais de um ano, e da qual nunca se recebeu resposta”, escreveu o padre.
A porta de vidro foi, aparentemente, bem recebida pela população, mas, naturalmente, não pela Direção-Geral do Património Cultural. Sem confirmar se foi ou não recebida uma carta relativamente ao assunto, fonte oficial da DGPC afirmou ao Observador que tinha “conhecimento da intenção da Paróquia de Alcobaça de colocar uma porta de vidro na Capela do Santíssimo”.
Contudo, a mesma fonte refere que “a DGPC nunca autorizou a colocação da porta de vidro em causa, por força da legislação aplicável”, que “obriga a que os estudos e projetos para as obras de modificação em bens classificados sejam elaborados por técnicos de qualificação legalmente reconhecida ou sob sua responsabilidade direta, bem como exige a autorização e acompanhamento do órgão competente [a DGPC] em qualquer intervenção ou obra no interior de monumentos”.
Mais: a direção-geral diz que “a porta foi colocada durante a noite, sem conhecimento prévio das autoridades competentes” e que não foi apresentado qualquer “estudo ou projeto para esse efeito”, pelo que não houve nem autorização nem acompanhamento técnico.
Por isso, a DGPC ordenou de imediato a retirada da porta de vidro do local. Em carta enviada ao padre Ricardo Cristóvão, a diretora-geral da DGPC, Paula Silva, destacou que “chegou ao conhecimento desta Direção que foi colocada uma porta em vidro no acesso à Capela do Santíssimo, apesar de lhe ter sido comunicado verbalmente, em 6 de novembro de 2015, pelo Senhor Subdiretor-Geral, Arq. João Carlos dos Santos, que essa pretensão não seria autorizar por comportar-se como um elemento dissonante num espaço nobre do imóvel do Estado“.
Neste ponto, paróquia e DGPC dividem-se: para o padre Ricardo Cristóvão, a porta não configura um elemento dissonante uma vez que existem em outras partes do monumento portas em vidro semelhantes, essas autorizadas pela DGPC. Questionada sobre a existência destas outras portas e divisórias de vidro e sobre porque é que aquela porta em vidro seria um elemento dissonante, a DGPC preferiu não comentar.
Na sequência da instalação da porta sem autorização, Paula Silva solicitou então “a remoção da intervenção efetuada, no prazo de 15 dias após a receção da presente comunicação”. O padre decidiu não acatar a ordem e enviou uma nova carta à diretora-geral, argumentando que a porta deveria ser mantida no monumento para facilitar o acesso dos visitantes ao sacrário. A partir dali, sucedeu-se uma troca de cartas entre paróquia e DGPC — e a porta continuou instalada durante nove meses. Até que, finalmente, a paróquia cedeu e retirou a porta de vidro do mosteiro.
A DGPC tem também uma visão diferente sobre outras situações denunciadas pelo padre de Alcobaça. Sobre o acesso a deficientes que Ricardo Cristóvão diz querer colocar na igreja do mosteiro, a direção-geral diz ao Observador que “todo o monumento, incluindo a igreja (e à exceção do dormitório dos monges), tem acessibilidade para pessoas com mobilidade reduzida”.
Já relativamente ao problema na canalização (o padre diz que as salas de catequese no mosteiro ficaram sem água durante um ano, à espera de uma autorização para a reparação da canalização, que acabou por ser financiada pela paróquia), a DGPC destaca que houve um problema no abastecimento de água que “implicou a realização de testes pelos serviços municipalizados durante vários meses” e que foi o pároco quem se “ofereceu para suportar os custos”, de forma a “acelerar o processo”.
PS de Leiria exigiu respostas do Governo
A polémica pode ter passado despercebida na generalidade do país, mas a verdade é que agitou (e continua a agitar) os ânimos na cidade de Alcobaça, onde não há quem não tenha tomado partido nesta contenda. A atuação do Estado não convence nem os deputados do próprio Partido Socialista. Por isso, no início deste ano, três deputados do PS eleitos pelo círculo de Leiria — José Miguel Medeiros, António Sales e Odete João — enviaram um pedido de esclarecimento ao ministro da Cultura.
No documento, os três deputados argumentam que a cidade de Alcobaça “conta uma história intrinsecamente relacionada com o seu Mosteiro”, que “reflete a progressão cultural e religiosa da cidade e influi diretamente na evolução da sua vida contemporânea”. Nesse sentido, argumentaram os parlamentares, a grande dimensão cultural do mosteiro, “que transcende largamente os usos estritamente religiosos”, tem “justificado a inquietude não só da paróquia de Alcobaça e, portanto, da sua comunidade religiosa, mas também da população alcobacense“.
Os deputados dizem, por isso, compreender o surgimento da petição pública “Mosteiro de Alcobaça: Para o respeito da Igreja pelo Estado“, na sequência da polémica da porta de vidro, que consideram ter “um impacto visual mínimo” e cumprir dois objetivos: “Abrir a igreja à comunidade, cumprindo as regras canónicas, assegurando o silêncio e o recolhimento, e proteger a Capela do Senhor dos Passos, impedindo a devassa de um espaço que, ‘quando desprotegido, tem sido alvo de atos de vandalismo, desrespeito e profanação'”.
Para os três deputados socialistas de Leiria, a atitude da DGPC representa um “aparente excesso de zelo no que respeita a uma intervenção de impacto mínimo“, sobretudo numa altura em que o Governo desenvolve “uma política de revitalização e reorientação dos usos do nosso património edificado, permitindo a sua utilização com objetivos empresariais compatíveis, como forma a rentabilizar estes ativos e garantir a sua preservação e manutenção, sendo esse até o caso do Mosteiro de Alcobaça, que irá receber uma instalação hoteleira de alto nível”.
“A situação está, de facto, a atingir proporções que exigem atenção e a tomada de medidas no sentido de repor a normalidade no relacionamento entre o Estado, através da Direção-Geral do Património Cultural, e a Igreja, nesta circunstância a paróquia de Alcobaça”, defendem os três parlamentares.
Nesse sentido, os deputados remeteram duas perguntas para o ministro da Cultura, Luís Filipe Castro Mendes: em primeiro lugar, questionam o governante se tem conhecimento “da enorme repercussão que a decisão (da DGPC e da Direção do Mosteiro) está a produzir na comunidade local, estando a ser percebida como uma afronta à paróquia e à população de Alcobaça”; e, em segundo lugar, quais as medidas que o Ministério da Cultura tenciona “adotar, no curto prazo, para repor o normal relacionamento com a paróquia e ultrapassar a atual situação”.
A resposta do gabinete de Luís Filipe Castro Mendes foi taxativa: recordando que a instalação da porta aconteceu de forma ilegal, sem autorização da DGPC, e descrevendo cronologicamente todo o processo, o Ministério da Cultura insistiu “para a oportunidade e conveniência da celebração de Protocolo para melhor articulação e reforço do diálogo institucional“, sublinhando que foi enviado em dezembro de 2016 um projeto de protocolo ao Patriarcado de Lisboa “para apreciação e eventuais alterações”.
Ao Observador, o deputado socialista José Miguel Medeiros, um dos subscritores do pedido de esclarecimento, reconheceu que “o assunto está a ser tratado no patamar adequado” e considerou “esclarecidas as questões oportunamente levantadas”, garantindo ao mesmo tempo que irá continuar a acompanhar a situação junto do ministério.
Uma reunião com o bispo e um novo pedido de autorização para a porta
Entretanto, apostados em restabelecer as relações de cooperação, paróquia e DGPC estão a tentar recomeçar tudo do zero. Ao Observador, o gabinete da diretora-geral da DGPC, Paula Silva, sublinha que as duas instituições “têm participado conjuntamente na proteção do serviço religioso, através da interdição dos visitantes à igreja, não só durante o horário de culto, mas também cerca de meia-hora antes e meia-hora depois, horários que são assegurados pelos vigilantes da DGPC e por colaboradores da Igreja”.
O gabinete da responsável destaca também a reunião realizada em 27 de julho deste ano com o então bispo auxiliar de Lisboa, D. José Traquina, onde se analisaram “caminhos de convergência para uma situação que envolve uma igreja simultaneamente espaço de culto e espaço de fruição cultural, na medida em que integra um Monumento Nacional inscrito na lista do Património Mundial da Humanidade da UNESCO”.
“Não me parece que se possa falar de um conflito entre a paróquia de Alcobaça e a DGPC. Pode haver outras questões menores, mas a questão considerada grave pela DGPC foi a iniciativa da paróquia em colocar” a porta de vidro, diz ao Observador o antigo bispo auxiliar de Lisboa, D. José Traquina (que agora ocupa o lugar de bispo de Santarém). “Segundo a DGPC, a colocação da porta aconteceu sem a sua autorização, sem o seu parecer e sem o acompanhamento dos seus técnicos. Perante a exigência da DGPC, a paróquia promoveu a retirada da porta”, recorda o bispo.
Segundo D. José Traquina, na reunião as duas partes discutiram “as questões estéticas e as questões técnicas, e depois as autorizações necessárias com o devido acompanhamento”, ficando decidido nesse encontro que se iria “recomeçar o processo desde o início“. “Ou seja, a paróquia iria apresentar o requerimento necessário e esperaria pela resposta. A paróquia oficiou nesse sentido e não tenho conhecimento até ao presente que tenha havido resposta”, explica o bispo.
Essa carta, a que o Observador também teve acesso, foi enviada no dia 8 de agosto deste ano pelo padre Ricardo Cristóvão à diretora-geral da DGPC, Paula Silva, e seguiu com conhecimento para o ministro da Cultura, Luís Filipe Castro Mendes. Na missiva, o padre renova o pedido de autorização para a colocação da porta de vidro e garante que a paróquia se encarregará de todos os custos, contando com o acompanhamento dos técnicos da DGPC.
Ricardo Cristóvão diz ter poucas esperanças numa resposta a esta nova carta. “De maneira nenhuma. Mas vou esperar novamente seis meses antes de fazer o que quer que seja”, diz ao Observador. Por seu lado, a DGPC garante que o assunto não está esquecido. “Haverá em breve uma resposta à paróquia“, confirmou ao Observador fonte do gabinete da diretora-geral. Até lá, a capela está fechada e a porta de vidro guardada num armazém.
A carta anónima e o polémico concurso público
Na origem de todas estas polémicas estará o polémico concurso público que levou à mudança de diretor do monumento. Entre agosto de 2010 e março de 2015, Jorge Pereira de Sampaio foi o diretor do Mosteiro de Alcobaça. Já trabalhava no monumento antes, onde comissariou várias exposições, e até assumiu interinamente a direção do mosteiro quando a anterior diretora, Cecília Gil, se demitiu. A nomeação de Pereira de Sampaio, doutorado em História, representou o regresso de um alcobacense ao cargo.
Durante este período, as relações entre a direção do mosteiro e a paróquia foram pacíficas. A amizade entre Jorge Pereira de Sampaio e o padre Ricardo Cristóvão é conhecida e facilitava os processos. Foi, aliás, ainda durante o mandato de Jorge Pereira de Sampaio que a questão da porta começou. Nessa altura, ainda parecia ser consensual.
Tudo mudaria com o final do mandato e com o lançamento do concurso público para escolher o novo diretor do mosteiro — a que Pereira de Sampaio também se candidatou. Várias pessoas ligadas ao monumento dizem hoje não encontrar razões para a saída do anterior responsável e para a sua substituição por uma técnica oriunda de outra zona do país. Mas, sobre o concurso, pouco se fala hoje na cidade — pelo menos de forma assumida.
O lançamento do concurso foi publicado em Diário da República em 14 de novembro de 2014, altura em que faltavam ainda alguns meses para o fim do mandato de Jorge Pereira de Sampaio. A nomeação saiu cinco meses depois, tendo sido publicada em Diário da República em 9 de abril de 2015. Foi escolhida Ana Pagará, até então técnica superior da Câmara Municipal de Mafra, especialista em arte e arquitetura cisterciense (da Ordem de Cister, ordem religiosa que ocupou o Mosteiro de Alcobaça).
Porém, cerca de dois meses antes do fim do concurso e da publicação dos resultados, chegou à Câmara Municipal de Alcobaça e ao Mosteiro de Alcobaça uma carta anónima a, alegadamente, denunciar que já estaria escolhida a vencedora do concurso. Segundo a carta, seria escolhida para nova diretora do mosteiro uma amiga do então diretor-geral da DGPC.
O caso teve muita repercussão na imprensa regional, sobretudo depois de o jornal digital Tinta Fresca ter divulgado que Ana Pagará era a nova diretora do Mosteiro de Alcobaça e que o nome já tinha chegado à autarquia através da tal carta anónima. Na mesma semana, o jornal Região de Cister denunciava a “polémica em concurso público para diretor do Mosteiro“.
O presidente da câmara de Alcobaça, Paulo Inácio (PSD), confirmou a existência da carta, mas diz que não lhe deu importância por considerar que “as alegações da mesma” não tinham “relevância”. Na reunião de câmara após a publicação das notícias na imprensa regional, o assunto foi amplamente discutido e dividiu os membros do executivo, com os vereadores da oposição a exigirem que o presidente da câmara enviasse a carta para o Ministério Público a recusar a nomeação.
Segundo a ata da reunião de câmara do dia 9 de março de 2015 (ainda um mês antes de serem publicados os resultados do concurso e a nomeação da nova diretora), a que o Observador teve acesso, o presidente da câmara “negou que a postura assumida relativamente à carta anónima configure falta de transparência, sendo que, após analisar as alegações da mesma concluiu não ser de dar relevância à mesma”. Sublinhando que “a carta em questão apenas surgiu há doze dias”, Paulo Inácio destacou que “caso considerasse relevante o teor da carta, teria agido em conformidade”.
A oposição, contudo, não concordou com esta análise do autarca. “Se existe tal carta e na mesma estão patentes denúncias, deve a mesma ser remetida para o Ministério Público, nem que seja por se tratar da entidade competente para tratar dessas matérias em termos de investigação”, exigiu o vereador Carlos Bonifácio (CDS). Já Eugénia Rodrigues (PS), questionou o executivo sobre a existência ou não da carta e “manifestou a sua indignação pelo que considerou falta de transparência da parte da maioria no executivo camarário”, como se lê na ata.
Executivo e oposição concordaram apenas num ponto: nos elogios a Jorge Pereira de Sampaio. “Sempre que um alcobacense geriu o Mosteiro, este ‘andou para a frente’, pelo que seria bom estarmos atentos e preocupados com esta situação” relativa à substituição “por uma técnica vinda de fora do nosso concelho”, disse José Canha, do PS. O presidente da câmara, Paulo Inácio, do PSD, destacou que Pereira de Sampaio fez “um bom trabalho institucional” e “é um alcobacense com quem a autarquia mantém boas relações institucionais”. E Carlos Bonifácio, do CDS, sugeriu ainda a elaboração de uma carta de recomendação “demonstrando o bom trabalho realizado” pelo anterior diretor do mosteiro.
Contactada pelo Observador, a Câmara Municipal de Alcobaça recusou qualquer comentário sobre a carta anónima. Também a Direção-Geral do Património Cultural recusou comentar o assunto, respondendo a todas as questões do Observador exceto às relativas ao concurso público. Tanto a atual diretora do mosteiro, Ana Pagará, como o anterior diretor, Jorge Pereira de Sampaio, não quiseram comentar o assunto.