O social-democrata Miguel Santos acusou o Governo socialista de ter feito cativações na ordem dos 79,1 milhões de euros na Saúde, uma discussão que se arrasta há meses e que conheceu novos desenvolvimentos depois de ter sido conhecida a Conta Geral do Estado.
O que está em causa
O Governo socialista tem repetido que não houve cortes na Saúde, lembrando que durante o ano de 2016 deu-se mesmo um aumento da despesa em relação ao ano de 2015 — o que é confirmado pelos números. No entanto, PSD e CDS continuam a acusar o Governo de António Costa de estar a conduzir “cortes encapotados” em vários setores, em particular na Saúde, através das cativações.
Esta quarta-feira, durante o debate sobre o Estado da Nação, o tema voltou a motivar duras trocas de acusações entre sociais-democratas e democratas-cristãos, de um lado, e socialistas, do outro. O deputado do PSD Miguel Santos foi um dos mais duros, confrontando Adalberto Campos Fernandes, ministro da Saúde, com os números da Conta Geral do Estado.
O senhor primeiro-ministro disse por duas ou três vezes que o não tinha havido cativações na Saúde e o senhor ministro repetiu-o. É normal. Passou o ano todo de 2016 e 2017 a dizer que não havia cativações. É ou não verdade que olhando para a Conta Geral do Estado estão lá 79,6 milhões de euros de cativações?”, questionou Miguel Santos.
Na resposta, Adalberto Campos Fernandes não desmentiu os números avançados pelo social-democrata e respondeu lembrando a herança do anterior Governo PSD/CDS.
As únicas cativações que na Saúde nós reconhecemos são as cativações de memória da oposição de direita, que se esqueceu muito rapidamente daquilo que fez no período de 2011 a 2015″, afirmou o ministro da Saúde.
Os factos
Em 2016, o Governo alcançou um resultado histórico: um défice de 2% do PIB, o mais baixo da história da democracia. Mas essa vitória teve um custo e a fatura detalhada foi conhecida nas últimas semanas: 942,7 milhões de euros em cativações, mais do dobro do prometido à Comissão Europeia e o valor mais alto desde, pelo menos, 2004, como explicava aqui o Observador.
Olhando para a Saúde, é possível perceber que o Governo foi obrigado a manter cativos cerca de 79,1 milhões de euros, um valor que Adalberto Campos Fernandes não rebateu. Estes dados estão explícitos na Conta Geral do Estado 2016.
Recorde-se que a lei não permite que o Serviço Nacional de Saúde (e o Ensino Superior) sejam alvos de cativações, mas há outras outras formas de conter despesa na Saúde. Uma delas foi conhecida em setembro, quando o Observador revelou um despacho do secretário de Estado, onde o responsável congelava o investimento e a impunha limitações na renovação do stock de medicamentos, para manter controlados os custos na Saúde.
Depois, há outro dado a ter em conta: o Governo pediu ao Parlamento autorização para gastar 10.047,7 milhões de euros com Saúde. No final, gastou menos 331,1 milhões de euros do que estavam previstos.
Tudo somado, é possível retirar três conclusões: a despesa com a Saúde aumentou face a 2015; mas não aumentou tal como estava prevista no Orçamento aprovado pelo PS, Bloco de Esquerda e PCP; e manteve cativos 79,1 milhões de euros.
Conclusão
A oposição tem razão quando diz que o Governo socialista fez cativações na área da Saúde. Os números da Conta Geral do Estado comprovam-no. O Governo tem dito que não há cativações na Saúde, referindo-se de forma mais lata ao Serviço Nacional de Saúde. Mas há outras despesas ligadas ao Ministério da Saúde e outras instituições que não fazem parte do SNS que foram alvo de cativações.
Na outra questão, também referida mas não completamente relacionada, o Governo pode ter poupado dinheiro face ao que previa gastar com Saúde, mas gastou mais 300 milhões de euros do que em 2015, o último ano do governo PSD/CDS-PP.