Existe a convicção generalizada de que as pessoas em férias são outras pessoas, e são melhores; que todos os seus defeitos se atenuam, e que todas as suas qualidades vêm à superfície. O conselho que os moralistas dão a este propósito é por isso o de não tentar tirar conclusões a partir daquilo que uma pessoa faz e diz quando está em férias. Como a côr da pele, as opiniões de muita gente mudam de aspecto nessa quadra; haverá razões para crer que mesmo as cordialidades aí professadas sejam como coisas que se dizem em sonhos, e que na manhã seguinte já não se conseguem reconhecer.
A ideia tem méritos mas é errada pelo menos a um respeito. Refiro-me à questão da bagagem. Em relação à bagagem existem dois tipos de pessoas: aqueles que levam consigo toda a bagagem possível, e se possível ainda tentam aumentar os limites que as leis da física e as organizações humanas estabelecem; e aqueles em quem tais limites não despertam qualquer tremor, porque levam sempre consigo o menos que podem, e para quem os seus esquecimentos são indiferentes ou quando muito um motivo de deprecação suave.
Os primeiros estão na situação do escritor que gosta de fazer listas das coisas da sua especialidade a levar para uma ilha deserta; e do faraó que se faz enterrar com aquilo que lhe é indispensável. Os segundos estão na posição daqueles a quem nada parece fazer grande falta. Os primeiros tentam manter um módico de ordem, mesmo no mundo diferente e incerto das suas férias; os segundos acham que o mundo não varia durante o ano inteiro, e que por isso o futuro não haverá de se distinguir muito do presente.
Nem sempre os primeiros levam consigo o mesmo tipo de coisas; mas são sempre coisas em número que deixa as outras pessoas maravilhadas e perplexas. As suas malas são industriosas como a de Mary Poppins; e inesgotáveis como as dos ilusionistas. Nos segundos, pelo contrário, espanta apenas aquilo que não levaram. Não é no fundo o conteúdo de uma mala que define a bagagem: é aquilo que lhe falta, e a indiferença dos seus proprietários em relação à possibilidade de não terem trazido consigo qualquer coisa de que possam vir a precisar.
A ideia de uma pessoa com poucas coisas na mala faz pensar; poderá haver quem ache que não precisa daquilo que precisa? Raramente se trata de santos ou ascetas; na maior parte dos casos são pessoas distraídas ou preguiçosas, sem inclinações metafísicas e com todos os apetites normais; mas são pessoas que sabem instintivamente e com uma certa tranquilidade que ao mudar de sítio, de férias ou não, é como se partissem desta para melhor; e que fazem as malas a pensar nisso.