Estamos no meio de uma revolução. A cidade, tal como a conhecemos, poderá tornar-se em breve uma memória do passado. O nosso ambiente urbano está a passar por uma mudança profunda que abrange as condições existentes para os cidadãos, a operação das suas infra-estruturas e, potencialmente, o modo como as empresas conduzem os negócios. Esta revolução deve-se a mega-tendências, das quais gostaria de realçar algumas das mais relevantes. Do lado negativo, os crescentes níveis demográficos e de urbanização estão a exercer pressão nas infra-estruturas existentes na cidade. Desde 2014, mais de 50% da população global vive em cidades e espera-se que este número aumente para mais de 75%, no futuro. Devido a este rápido aumento populacional é expectável que a procura de automóveis duplique em 2050, passando dos mil milhões atuais para os 2 mil milhões. Em consequência disto temos um aumento do congestionamento de tráfego nas áreas urbanas que a população suburbana vivencia diariamente, que existe também nas estradas de Lisboa mas, felizmente, de um modo menos intenso ao que se vê, por exemplo, no recorde de 11 dias de engarrafamento da China! Isto não só retira qualidade de vida ou aumenta a poluição, como também leva a situações mais graves tais como as ambulâncias ficarem presas nos engarrafamentos, incapazes de chegar aos casos de urgência. Como resultado, há uma redução geral no bem-estar dos residentes das cidades.

Do lado positivo, graças à internet das coisas (IoT: Internet of Things em inglês) o mundo físico e o mundo digital estão a avançar em conjunto e a tornar possível as ‘cidades inteligentes’ que são cidades mais eficientes, mais agradáveis para viver e mais sustentáveis. As tecnologias para as cidades inteligentes têm vindo a aumentar e a revolucionar lentamente cada área da vida urbana. Reflitamos sobre três desses exemplos. Primeiro, os modelos de gestão de tráfego em tempo real e como os mesmos podem otimizar o fluxo do trânsito ou, no futuro, permitir encontrar locais de estacionamento disponíveis (facto chocante, 30% do trânsito das cidades é atribuído a automóveis que procuram um lugar de estacionamento). Segundo, em áreas urbanas de Singapura e em Pittsburgh já circulam nas estradas veículos elétricos autónomos. Estes veículos autónomos têm a possibilidade de reduzir o número de veículos nas cidades até 5 vezes, podendo inclusivamente ser usados como pequenas centrais contribuindo para uma gestão eficiente da rede elétrica. Esta tecnologia pode ser especialmente útil em cidades como Lisboa, cidade onde os fogos de origem elétrica acontecem frequentemente, muitas vezes causados por uma sobrecarga na rede. Por último, plataformas de financiamento coletivo (‘crowdfunding’) como a BoaBoa, recentemente lançada em parceria pela Câmara Municipal de Lisboa, conferem aos cidadãos a possibilidade de sugerir projetos municipais que melhorem as condições de vida dos cidadãos e, neste caso em particular, de quem vive em Lisboa. Estes serviços tornam as cidades mais equitativas, sustentáveis e democráticas.

Embora seja difícil prever como tudo isto vai evoluir – tendo como grande preocupação a segurança dos dados – será expectável que estas mudanças venham a ter um impacto nos negócios existentes e desafiem os negócios tradicionais a repensar os seus modelos de negócio. As empresas precisam cada vez mais de digitalizar as suas operações, transformar os seus negócios e, na verdade, substituir uma parte dos seus negócios físicos. Pensemos nos fornecedores de energia que lançam aplicações de contagem inteligente, nas seguradoras que utilizam tarifários centrados no consumidor resultado da análise de grandes volumes de dados ou, simplesmente, nos negócios locais que promovem os seus serviços em mercados online tais como o MyGon ou o Zomato em vez de utilizarem folhetos impressos. No “Smart City Innovation Lab”, recentemente fundado na Universidade Católica de Lisboa, estudam-se estas tendências, focando-se na área da energia, mobilidade e na indústria da saúde em-linha (‘e-health’), investigando de que forma as empresas podem digitalizar os seus modelos de negócio, como promover a adoção destas tecnologias inteligentes e consequente alteração comportamental dos seus utilizadores, bem como qual o grau de adaptação de políticas e mercados que será necessário para que tudo se torne realidade. A título de exemplo, o projeto me2 – cofinanciado pelo Fundo de Apoio à Inovação – procura conjugar os contadores inteligentes e os veículos elétricos numa plataforma, procurando-se promover um equilíbrio na rede elétrica recorrendo a elementos de gamificação e modelos de negócio inteligentes.

Qual é a nossa previsão para a cidade do futuro no decorrer da atual revolução? Não sabemos, mas esperamos que mude o ambiente urbano para melhor e crie bem-estar para todas as suas partes interessadas.

Nota: Um agradecimento especial a Ana Faria pelos comentários e sugestões verdadeiramente úteis.

Professor Auxiliar na Católica Lisbon School of Business & Economics

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