Anuncia-se pelas esquinas o regresso às aulas. Porquê exactamente ‘regresso’? À primeira vista porque já lá se esteve; à segunda porque é lá que se acaba. Ir para a escola e andar na escola tem um grau de inevitabilidade parecido com o da morte e dos impostos. É natural que muitas crianças achem que se parece com a morte; mas parece-se mais com os impostos. Como os impostos, a escola não tem de ser o que é; e é até concebível que não seja de todo.

Não significa isso que não seja importante aprender coisas com outras pessoas, ou por si só; e aprender coisas que normalmente só se aprendem na escola, e que é prático que se possam aprender lá: história, matemática ou música. A questão é saber se essas coisas se têm de aprender lá. A doutrina parece ser a de que a escola é necessária às crianças; o consenso, o de que não é suficiente; e se não for nem uma coisa nem outra?

A expressão ‘regresso às aulas’ imita a expressão ‘regresso a casa.’ Ouve-se de facto dizer que a escola é uma casa; mas será uma casa onde ninguém nasceu, ninguém passa a noite, e onde ninguém mora; uma casa onde o dia está dividido em pormenor mas é interrompido ao pôr-do-sol; onde quase nunca se pode dormir; um sítio que quando está ocupado está ocupado por pessoas que não se conhecem senão de lá; a escola é mais parecida com uma paragem de autocarro ou uma loja que com uma casa.

A melhor defesa da escola não é considerá-la o único sítio onde se podem aprender certas coisas. O que se ouve é por isso que a escola é um “instrumento de socialização da criança.” Não é claro o que quer dizer ‘socialização,’ e muito menos o que possa ser aqui um instrumento. Diz-se que a socialização é o contacto com outras crianças da mesma idade. Basta no entanto abrir a televisão para ter uma amostra daquilo que fazem as crianças da mesma idade quando estão juntas: e quase nada do que fazem na televisão se passa na escola.

Quando nos é explicado finalmente em que consiste a socialização, chega-se ao último reduto da defesa da escola, e ao mais desesperado: que a escola serve para ensinar não tanto história, matemática ou música, mas “valores.” Quais podem no entanto ser os valores de um sítio onde ninguém vive, de um sítio onde ninguém dorme, num sítio em que ninguém se conhece? A resposta é: só podem ser os valores de ninguém em especial – são os valores extraterritoriais das lojas e das paragens de autocarro. Quanto à matemática, à história e à música, há todas as razões para serem ensinadas; mas podem ser aprendidas em muitos lugares.

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