O título da notícia, no original em inglês, era “Portugal is Europe’s next looming economic disaster” (Portugal é o próximo desastre económico que se perfila na Europa).
Passou-me no início desta semana pelos olhos nas redes sociais e o meu primeiro pensamento foi que se tratava de uma notícia velha de 2010, altura em que o país tinha entrado desgraçadamente no radar dos mercados e dos media internacionais, e que tinha sido agora “repescada” por alguém com falta de atenção ou má intenção.
Abri o link e verifiquei que a peça do “Business Insider” era, afinal, da véspera. O texto sustenta a premonição numa análise recente do banco HSBC e nas notícias — a que é citada é do espanhol El País — que dão conta da necessidade de uma forte capitalização da Caixa Geral de Depósitos, que pode chegar aos quatro mil milhões de euros, podendo inverter a tendência de descida da dívida pública em percentagem do PIB.
Dois dias depois, Mário Centeno deu uma curta entrevista à CNBC, onde foi questionado sobre a situação orçamental e económica do país e também sobre a operação da Caixa (foi nesta entrevista, aliás, que o ministro das Finanças se referiu às “reformas estruturais feitas nos últimos anos”, apelando a que se tenha paciência para que produzam efeitos, o que mostra esta coisa fantástica: as políticas que o governo diaboliza internamente e se dedica a reverter uma a uma são apresentadas lá fora como exemplo de que as coisas até estão a correr bem).
Gostava de me enganar mas esta renovada atenção dos media financeiros internacionais por Portugal não augura nada de bom.
Não é que eles digam ou descubram alguma coisa que não seja noticiada e debatida diariamente no país. Mas se na preenchida agenda editorial destes media globais começa a haver espaço para falar de Portugal não é certamente por bons motivos. Não é um bom sinal que estejam a esmiuçar os dados do crescimento económico ou a fazer projecções para a dívida pública num cenário de recapitalização da banca.
A confiança é um activo de grande volatilidade que demora muito tempo a construir mas pode perder-se num fósforo. E quando se está a falar dos mercados financeiros, as percepções que se criam não são apenas baseadas em factos objectivos e comprováveis. Assistimos a isso no início de 2010, quando se instalou a dúvida sobre a vontade e capacidade de o país tomar as medidas necessárias para trazer a dívida para níveis sustentáveis. As taxas de juro começaram a subir até se tornarem incomportáveis, não nos tendo restado outra alternativa senão o pedido do resgate. Era isso ou o colapso financeiro do país.
As medidas entretanto tomadas pelo Banco Central Europeu aliviaram a pressão sobre as dívidas dos países que tinham perdido a confiança dos investidores. Mas engana-se quem pensar que este guarda-chuva da instituição é o salvo-conduto para tudo e mais alguma coisa e que os juros não podem voltar a subir. Isso pode voltar a acontecer, bastando, para tal, que se instale a dúvida sobre a real determinação dos decisores políticos em prosseguir a redução do peso do endividamento do Estado, depois da subida a galope entre meados da década passada e 2013.
Este ano ainda temos que amortizar mais de 18 mil milhões de euros de empréstimos que contraímos nos últimos anos. E em 2017 são mais 12 mil milhões. Ora, estes pagamentos são feitos com o recurso a novos empréstimos. E se as taxas de juro sobem, vamos pagar mais. Aliás, isso já está a acontecer nos últimos meses. A média da taxa de juro que pagámos no ano passado pelos novos empréstimos foi de 2,4%. Mas nos primeiros cinco meses deste ano o juro médio que suportámos já foi de 2,9%. Será uma subida episódica que vai ser revertida nos próximos meses? Ou trata-se do início de uma inversão de tendência que resulta do regresso da desconfiança? Não sabemos. Mas não será bom se voltarmos a cair nas bocas do mundo, renovando a curiosidade habitualmente dedicada a tudo o que corre mal.
É bom que para a imprensa internacional Portugal se mantenha apenas como um sítio a visitar obrigatoriamente, que está na moda para as startups, onde vai realizar-se daqui a cinco meses a Web Summit, e o país que viu nascer Cristiano Ronaldo. Com as nuvens cinzentas que já temos sobre nós é bom que não reparem na economia. Fazer tudo para não dar nas vistas devia ser, nesta fase, uma prioridade da governação.